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Os riscos e precauções na escolha do plano de compra de ações (stock options plan) e a legislação trabalhista

Deve-se tomar cuidado com o valor e a quantidade de ações que serão disponibilizadas a cada empregado.

terça-feira, 14 de agosto de 2018

Atualizado em 25 de setembro de 2019 18:38

A necessidade em convergir os interesses e objetivos das empresas e de seus colaboradores exigiu destas que encontrassem meios de os incentivar. Dentre estes, temos o Plano de Opção de Ações ou Stock Options Plan, modelo importado dos Estados Unidos e que agora recorrente no Brasil, ainda mais com o surgimento de start-up's.

Este modelo premia os funcionários que permanecem na empresa, dando a eles a oportunidade de comprar ações da companhia por um valor reduzido, utilizando para isso parte de seu salário. Ou seja, de forma superficial e exemplificada, o funcionário a partir de um período, e preenchendo alguns requisitos previamente determinados, tem a possibilidade de abrir mão de receber 10% de seu salário, para assim receber esse valor em ações.

Esse plano é dado como opcional ao empregado, e deve ter caráter mercantil para que não se confunda com a remuneração e tais valores não sejam incorporados ao salário, nem incidam as demais obrigações trabalhistas.

Para sua formalização, deve ser realizada uma diretriz geral do plano de compra de ações pelos empregados, o qual deve, no estatuto social da empresa, prever a emissão de ações vinculadas a este propósito além de estar devidamente aprovado em assembleia e registrado na CVM.

Nesse plano, devem constar o tempo de carência para exercer o direito de compra, o valor pelo qual as ações serão vendidas, e as demais especificações, sendo necessário, ainda, que a companhia tenha capital autorizado para que as ações sejam distribuídas.

Deve-se tomar cuidado com o valor e a quantidade de ações que serão disponibilizadas a cada empregado. Isso porque para que permaneça o caráter mercantil, o valor das ações deve ser próximo do valor de mercado, ou seja, ainda que seja menor para estimular o empregado a adquiri-las, não pode ser irrisório.

Ademais, o empregado deve ter risco, isto é, a companhia não pode fazer com que o valor das ações seja uma simples substituição do salário, nem se responsabilizar futuramente por eventuais perdas decorrentes da desvalorização.

Tanto empregados quanto empregadores devem estar atentos aos riscos que são inerentes deste contrato. Quanto aos empregados, estes ao abrirem mão de parte do salário para adquirirem ações, passam a sofrer o risco que qualquer investidor tem, as ações podem ser valorizadas, assim como depreciadas de acordo com a economia, situação da empresa e outros fatores.

É neste sentido que as empresas tentam influenciar seus empregados, pois uma vez adquirindo as ações passam a ser também acionistas. Ou seja, seu esforço não refletirá apenas no crescimento da empresa, mas também na valorização de suas próprias ações, ficando claro assim, que quanto mais leal à empresa for, tanto na produção quanto no tempo que permanecer, maior será o retorno.

Ocorre que nem sempre as ações serão lucrativas ou darão um retorno rápido, fazendo com que o colaborador tenha de ter conhecimento do negócio e esteja preparado para abrir mão de uma renda que seria certa por um risco. Nestes casos se o empregado não tiver uma vida financeira organizada e não entender que não deve confiar o pagamento de contas no sucesso dessas ações, pode acabar por contrair dívidas impagáveis com o salário agora "reduzido" e ainda se surpreender com o fracasso do investimento nas ações da companhia.

Já quanto ao empregador, este deve estar atento e muito bem assessorado ao formalizar tais planos, pois deve tomar o cuidado de exercer tais opções aos seus colabores de forma mercantil. Isso pois a caracterização desse plano como remuneração e a integração deste com o salário provavelmente, uma hora ou outra, passará ao crivo do judiciário. Sendo assim, não se trata apenas de uma escolha ou organização financeira, mas principalmente de tomar certos cuidados, que não tornem maior ainda a insegurança jurídica sobre a natureza jurídica do plano.

A natureza jurídica a qual o plano se aplica deve estar evidenciada de forma expressa nos contratos, isto pois, se houver qualquer indício de remuneração, os valores da liquidação das ações passam a incorporar o salário, aumentando proporcionalmente os reflexos trabalhistas já pagos.

O caráter mercantil deste modelo, mesmo que proveniente de um contrato de trabalho já é de entendimento pacificado no Superior Tribunal do Trabalho, porém há outras precauções a serem tomadas pela empresa.

O plano deve prever a forma e o tempo com o qual o colaborador se habilita a poder optar por comprar ou não as ações, deve vincular tal possibilidade ao cargo, ao período aquisitivo, período esse em que o colaborador deve permanecer na empresa para que possa optar ou não pela compra das ações, e/ou salário, obstando assim, eventuais pedidos de pagamento de diferenças com base na isonomia ou equiparações de direitos.

Deve, também, prever e definir o período de carência para que o colaborador exerça o direito da opção de compra das ações, ou seja, adquirido o direito, até quando ele poderá optar por comprar as ações no valor previamente determinado pelo plano.

Quando da definição do período de carência, o empregador deve atentar-se ainda ao momento da dispensa, seja por justa causa ou não. A opção da compra de ações é um direito que o colaborador passa a ter com o cumprimento de requisitos previstos no plano, e a partir deste momento ele pode optar por adquiri-las ou não, não sendo prejudicado caso seja dispensado sem justa causa neste período.

Exemplificando, tem-se recente decisão proferida pela 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho no Recurso de Revista 363-05.2011.5.04.0021, publicado em 2/6/17,o qual entendendo válido o plano, considerou inválida a cláusula que retira o direito da compra de ações em caso de demissão sem justa causa frente a arbitrariedade da empresa, a qual poderia neste caso impossibilitar qualquer colaborador de exercer tal direito ao simplesmente dispensá-lo ou ainda tornar a sua habilitação ao plano uma causa implícita de demissão.

LEI N.º 13.015/2014. STOCK OPTION PLAN. AQUISIÇÃO FUTURA DE AÇÕES. DISPENSA SEM JUSTA CAUSA NO CURSO DO PERÍODO DE CARÊNCIA. CLÁUSULA DE EXTINÇÃO AUTOMÁTICA DO DIREITO DE COMPRA. CONDIÇÃO MERAMENTE POTESTATIVA. DIREITO À INDENIZAÇÃO SUBSTITUTIVA. 1. O Plano de Opção de Compra Facilitada de Ações (Stock Option Plan), instituído pela reclamada, prevê a outorga de ações aos empregados, que poderão exercer a prerrogativa após um período de carência, mediante o pagamento de um preço prefixado. 2. Na hipótese dos autos, o Plano instituído pela demandada prevê que, no caso de dispensa sem justa causa durante o período de carência, a opção de compra será automaticamente extinta. Ao se definir um período de carência para fazer jus o obreiro à opção de compra das ações, definiu a empresa a necessidade de manutenção do contrato de emprego como condição para se realizar a referida opção. 3. Não há qualquer controvérsia quanto à validade do período de carência estabelecido no plano para que se exerça a opção de compra das ações, requisito inerente aos Planos de Compra de Ações (Stock Option Plan). Tem-se, no entanto, por inadmissível a condição que retira dos obreiros o direito à opção de compra no caso de dispensa sem justa causa durante o período de carência, porquanto permite que a reclamada, ao dispensar o empregado, valendo-se de tal condição, obste a regular fruição do direito pelo obreiro. As circunstâncias reveladas nos presentes autos denotam, de modo indiscutível, que a referida cláusula permite que a empresa, de modo unilateral, impeça o empregado de usufruir o direito, constituindo-se em condição meramente potestativa, porquanto dependente apenas do arbítrio do empregador. 4. Assim, no caso de dispensa do obreiro no curso do período de carência, deve-se considerar preenchido o requisito temporal definido no Plano, nos termos do artigo 129 do Código Civil. 5. Recurso de Revista conhecido e não provido.

Sendo assim, as empresas não devem atentar-se apenas a formalização do plano, mas também à sua gestão, uma vez que pode tornar mais custoso para a empresa ao invés de incentivar seus colaboradores a permanecerem na empresa ou a se esforçarem por ela.

Além do Plano de Compra de Ações, há empresas que acabam por gratificar seus colaboradores com um certo número de ações de acordo com o tempo que este permaneça na empresa, porém algo arriscado devido ao caráter salarial que possa ser imputado, sendo considerado assim, como remuneração.

Isso pois, apenas com o cumprimento de um período aquisitivo as ações seriam entregues de forma gratuita, eliminando a característica mercantil, e consequentemente podendo ser integrada a remuneração e aos demais benefícios trabalhistas impostos pela legislação.

Na lei anterior as gratificações não previstas, mas ajustadas entre empregado e empregador, integravam o salário e, por via de consequência, geravam ônus relativos a FGTS, INSS, e demais benefícios.

Porém com a reforma trazida recentemente pela lei 13.467/17, contudo, o artigo 457, §1º da CLT em sua nova redação, passou a prever que "integram o salário a importância fixa estipulada, as gratificações legais e as comissões pagas pelo empregador", retirando do conceito de salário as gratificações ajustadas entre as partes, bem como outras verbas antes previstas como salariais.

Com isso, a interpretação do legislador passa a ser de que as gratificações acordadas entre as partes não integram o salário, não existindo, portanto, reflexos trabalhistas sobre elas, o que possibilita, em tese, que os empregadores passem a prever novas verbas para estimular seus trabalhadores a permanecer na empresa ou a ela se dedicarem, sem que elas não possam nunca ser retiradas ou que passem a ostentar natureza salarial, gerando os custos incidentes sobre a folha.

Para dar maior segurança de que este valor não seja integrado ao salário, é recomendável que o empregado adquira as opções de forma onerosa, ainda que em condições vantajosas (stock options).

Porém, ainda não se pode falar em ausência total de risco, pois por certo, mesmo sendo um instituto implantado no país há anos, ainda haverá grandes discussões nos tribunais acerca de todos os temas trazidos pela reforma trabalhista.

A desvinculação de verbas adicionais pagas pelos empregadores é o objetivo da lei no que tange ao tema remuneração, e provavelmente a tendência é de que não haja incorporação de verbas ao salário, que não as expressamente previstas (gratificações legais, salário propriamente dito e comissões). Porém, a insegurança jurídica que permeia todas as instituições e graus do Judiciário, não permite um posicionamento certo, restando às empresas um plano de opção de compras extremamente detalhado e uma gestão eficiente.

Tratando-se de matéria trabalhista nova e de sua aplicação pela Justiça do Trabalho, ter certeza de algo seria precipitado, mas deve-se reconhecer que, atendidos os critérios acima expostos, a tendência é de afastamento do caráter remuneratório nessas questões.

Na prática, o mais importante nestes casos é deixar claro no instrumento que regular a questão, que se trata de verba que não integra o salário, vinculando, se possível, a aquisição das ações ao cumprimento de requisito temporal e ao cargo, não ser gratuita e mediante o aceite do colaborador.

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*Bruno Juarez Prazeres é advogado na Marilac Advocacia.

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