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O persistente dilema sobre a (in)aplicabilidade da norma contida no art. 791-A da CLT às ações ajuizadas anteriormente à vigência da lei 13.467/17

Surgiram discussões correlatas a questões de direito intertemporal, na medida em que a referida legislação não regulamentou a aplicabilidade ou não das novas regras às demandas ajuizadas anteriormente à sua vigência.

quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Atualizado em 23 de setembro de 2019 18:15

Com o advento da lei 13.467/17, relativa à reforma trabalhista, passou a ser prevista na norma celetista a possibilidade de condenação das partes ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais. Diante disso, surgiram discussões correlatas a questões de direito intertemporal, na medida em que a referida legislação não regulamentou a aplicabilidade ou não das novas regras às demandas ajuizadas anteriormente à sua vigência.

Nesse sentido, em decorrência das arguições de inconstitucionalidade, dentre as quais as do art. 791-A da CLT, que versa sobre o tema ora em debate, bem como da nova redação dada ao seu art. 790-B, que define a parte encarregada do pagamento dos honorários periciais e inclui o encargo ao sucumbente no objeto da perícia, mesmo que beneficiário da justiça gratuita, travaram-se inúmeros debates em todos os âmbitos do Direito Processual do Trabalho.

Em virtude da insegurança jurídica gerada pelas diversas lacunas legislativas existentes e a pendência da apreciação da respectiva ADln 5766, pelo Supremo Tribunal Federal, o Pleno do Tribunal Superior do Trabalho se reuniu extraordinariamente e editou, por meio da Resolução 221, de 21/6/18, a instrução normativa 41/18, restando definido em seu artigo 6º que os honorários advocatícios sucumbenciais devem ser arbitrados apenas nas ações ajuizadas após 11 de novembro de 2017, isto é, data em que passou a vigorar a mencionada lei.

Da mesma forma, determinou-se no artigo 5º que as novas disposições acerca dos honorários periciais não são aplicáveis aos processos iniciados anteriormente à vigência da reforma trabalhista. Contudo, pelo fato de não consistir em norma de observância obrigatória, a instrução normativa da Corte Superior não tem sido utilizada pela totalidade dos magistrados como razão de decidir.

Consequentemente, subsistem diversas dúvidas em relação à aplicabilidade da norma no tempo, de modo que incumbe às partes litigantes buscar, geralmente pela via recursal, a respeitabilidade dos critérios intertemporais aplicados no ordenamento jurídico pátrio, sendo válido destacar alguns dilemas enfrentados quando da sua análise pelos operadores do Direito.

Ocorre primeiramente que, de acordo com o princípio "tempus regit actum", a legislação aplicável é aquela vigente no momento da prática do ato. Portanto, considerando-se que os honorários advocatícios e periciais consistem em aspectos a respeito dos quais o magistrado se pronuncia apenas por meio da sentença, deve-se aplicar a lei vigente à época de sua prolação e não da propositura da demanda.

Ademais, os honorários sucumbenciais decorrem de regra processual com efeitos materiais de natureza híbrida, eis que originam uma relação jurídica de direito material, decorrente da própria demanda entre o sucumbente e o advogado da parte adversa. E, no ordenamento jurídico pátrio, a vigência imediata da lei ao processo em curso constitui um princípio da aplicação de leis processuais, não possuindo as partes direito adquirido a regime jurídico processual. Nesse sentido, inclusive, dispõem os artigos 14 e 1.046 do CPC e 912 da CLT.

Diante disso, ao entrar em vigor, a nova lei é aplicável aos processos em curso, respeitando-se os atos processuais já praticados na vigência da legislação anterior. Isso porque, por serem de observância obrigatória, as regras processuais se aplicam imediatamente às demandas sub judice, razões pelas quais as disposições da lei 13.467/17 são aplicáveis àquelas ajuizadas antes da sua vigência.

Assim, pelos motivos já explanados, referida aplicabilidade não violaria direito adquirido, coisa julgada ou ato jurídico perfeito, na medida em que o direito inerente à verba em análise surge apenas quando proferida a decisão, ato este que define a responsabilidade pelo custo do processo, apontando-se igualmente qual das partes sucumbiu no objeto da perícia.

Portanto, a sentença é o marco definidor da regra processual aplicável em relação tanto aos honorários periciais quanto aos advocatícios sucumbenciais, sendo que, em relação a esta verba, tal entendimento foi adotado pelo próprio Superior Tribunal de Justiça1 quando se debatia, no âmbito cível, acerca do marco temporal para a aplicação do CPC/15.

Da mesma forma, é possível afirmar que a condenação do trabalhador ao pagamento de honorários sucumbenciais ao patrono da parte adversa não representaria uma decisão surpresa, pois há previsão em lei processual, impedindo-se a alegação de desconhecimento a respeito, tampouco em relação à imediatidade de sua aplicação, eis que consiste igualmente em regra legal.

Portanto, caso o obreiro obtenha em juízo créditos capazes de suportar aludida despesa processual, revela-se justificável e plausível a sua condenação ao respectivo pagamento. E o mesmo entendimento se estenderia aos honorários periciais, pois nesse caso não haveria justificativas plausíveis para onerar os cofres públicos, sob pena de implicar até mesmo um enriquecimento sem causa do reclamante. Inclusive, válido destacar que alguns Tribunais Regionais pátrios, a exemplo dos das 2ª e 9ª regiões, assim já se posicionavam antes mesmo do advento da reforma trabalhista2.

Em contrapartida, vale destacar que, sob outro ponto de vista, o arbitramento de honorários advocatícios sucumbenciais em demandas ajuizadas antes da vigência da reforma trabalhista representaria aos litigantes uma decisão surpresa, violando-se o disposto no art. 10 do CPC, sobretudo se estas não forem intimadas para se manifestarem acerca da aplicabilidade da respectiva norma. Assim, o argumento é de que as partes e seus procuradores devem conhecer previamente as regras processuais aplicáveis à época da propositura da ação.

Portanto, ainda sobre tal aspecto, necessário se atentar ao fato de que os pedidos formulados pelos trabalhadores em âmbito judicial foram embasados na lei vigente à data do ajuizamento da demanda, ocasião em que são aferidos seus custos e riscos, de modo que o regramento legislativo em questão influenciou consideravelmente na análise da viabilidade processual.

Nesse sentido, se os obreiros tivessem sido informados pelos seus patronos acerca da possibilidade de arcar com o pagamento da verba em questão, não necessariamente teriam assumido o risco da propositura da demanda. Isso porque, mesmo que estivessem confiantes quanto a procedência dos pedidos formulados, a aplicação do princípio da sucumbência os levaria à prudência de considerar a possível ocorrência de imprevistos no curso do processo, a exemplo do não comparecimento das testemunhas ao ato instrutório, comprometendo, sobremaneira, o êxito probatório.

Desse modo, se o magistrado decidir que a nova regra não se aplica aos processos sub judice, sua decisão estará sendo proferida em observância a diversos princípios fundamentais, tais como os da proteção, causalidade, razoabilidade e, sobretudo, da estabilidade e segurança jurídica.

Ademais, semelhante argumento poderia ser apresentado pela própria parte demandada, no sentido de que, se soubesse que poderia ser condenada a pagar honorários advocatícios sucumbenciais, teria optado pela via conciliatória e entabulado um acordo com o trabalhador. E, por isso, o raciocínio seria de que o valor que outrora desmotivou a composição entre as partes, destinar-se-ia, até mesmo em maior expressividade, ao pagamento da aludida verba.

Assim, percebe-se que a ausência de uniformidade de entendimento acerca dos temas ora abordados e a consequente insegurança jurídica instalada no âmbito do Direito e Processo do Trabalho não reflete apenas nas escolhas dos trabalhadores que pretendem acionar o Poder Judiciário visando a salvaguardar seus direitos, mas também das partes demandadas, sobretudo no que diz respeito ao fluxo de caixa e análise da viabilidade ou não da via conciliatória.

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1 STJ - REsp: 1665111 AL 2017/0074636-7, Relator: Ministro Mauro Campbell Marques, Data de Publicação: DJ 19/09/2017

2 TRT-2 - RO 0001998-52.2014.5.02.0027, Relatora: Des. Elisabeth Mostardo, 12ª Turma, DEJT 02/09/2016; TRT-9 - RO 00678-2015-242-09-00-6, Relator: Benedito Xavier da Silva, 7ª Turma, DEJT em 07/04/2017; TRT-9-30693-2014-005-09-00-1-ACO-17005-2017 - 7ª. Turma. Relator: Altino Pedrozo dos Santos, DEJT em 26-05-2017.

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*Ana Luíza Vicentine de Matos é advogada

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