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Os efeitos do coronavírus nas relações empresariais

A paralisação temporária de empresas certamente contribuirá para a contenção do coronavírus. Por outro lado, causará reflexos econômicos e jurídicos e abalará toda a sociedade.

quinta-feira, 2 de abril de 2020

Atualizado às 12:05

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Coronavírus: Economia e Direito

Mesmo em tempos de cólera, Economia e Direito andam de mãos dadas e integram um só corpo.

Esse corpo, unificado, é simples de ser notado quando direcionamos nosso olhar aos detalhes.

O coronavírus, com origem na China, tem se propagado em ritmo veloz no Brasil. Os registros de casos se intensificam, especialmente aqui no Estado de São Paulo. Em caráter paralelo, dia a dia se nota o aumento de normas jurídicas para regular nossos interesses enquanto coletividade. 

Coronavírus: efeitos econômicos e normas jurídicas

O Ministério da Saúde recomenda o isolamento e a quarentena, como forma de minimizar assim a livre circulação e consequentemente achatar a curva progressiva de contágio pelo coronavírus.

O Governo Federal e sua equipe econômica anunciaram um pacote de medidas destinadas à minimização dos danos causados pelo coronavírus. Por exemplo: suspensão por 90 dias do pagamento do Simples Nacional e do depósito do FGTS; redirecionamento de parte do DPVAT para o combate ao coronavírus; desoneração da carga tributária relativa ao IPI - Imposto sobre Produtos Industrializados, nacionais e importados que guardem relação com o enfrentamento do coronavírus.

Além disso, o Senado votou em sessão inédita, já que realizada virtualmente, o Projeto de Decreto 88/20, para declarar a calamidade pública, estado esse que perdurará até 31 de dezembro de 2020 e valida ao Governo Federal extrapolar os gastos inicialmente previstos no orçamento deste ano para direcionar recursos mais incisivos ao controle do avanço do coronavírus e à preservação das empresas.

Ademais, Jair Messias Bolsonaro está em vias de editar Medida Provisória que proporcionará flexibilização da jornada de trabalho e também redução da verba salarial em até 50%, garantindo-se o pagamento de um salário mínimo, caso aprovada pelo Congresso Nacional.

O Governo do Estado de São Paulo determinou a suspensão de aulas e também abriu linha emergencial de crédito de R$ 500.000,00 (quinhentos milhões de reais) às empresas, para que possam preservar o veio empreendedor e assim se manterem como fonte geradora de empregos e, via reflexa, de sustento de inúmeras famílias.

Os Municípios de São Paulo, Campinas, Ribeirão Preto e Franca decretaram situação de emergência e determinaram a diversos estabelecimentos que fechem as portas por enquanto.

Contudo, não visualizamos até agora nenhuma conduta efetiva por parte do Governo Federal e tampouco dos governos estaduais e municipais no sentido de ferir, cortar a própria carne e sangrar junto com a iniciativa privada.

As medidas econômicas propostas até agora são só paliativas e não trazem soluções efetivas para a crise econômica que alcançará a todos e todas nós.

A iniciativa privada é a grande responsável de proporcionar a circulação e a distribuição de riquezas e é pelas mãos da iniciativa privada que o Poder Público, aqui considerado pela autora os cargos e funções políticos e também os demais de alta remuneração), tem sua garantia e permanece intocável. Mesmo em detrimento da baixa remuneração de professores, de assistentes sociais, de profissionais da saúde, que são os grandes referenciais na construção de um país e nas transformações efetivas.

O fato é que a iniciativa privada está em isolamento e em quarentena e não poderá produzir renda nos próximos tempos. Nesse contexto, o diferimento no pagamento de tributos não é a solução!

O Poder Público precisa ser exemplo e ferir a própria carne e sangrar, junto com a iniciativa privada.

Com isso, todas as medidas até agora adotadas serão inócuas para impedir a quebra de empresas, o aumento exponencial do desemprego e a precariedade com que inúmeras famílias terão de viver.

Nesse cenário, é imperioso que o Poder Público ande de mãos dadas com a iniciativa privada e implemente medidas econômicas vocacionadas a ferir também a própria carne. Caso contrário, os efeitos danosos humanitários e econômicos do coronavírus serão ainda mais expressivos e será mais lenta ainda a retomada do nosso fôlego.

Paralisação temporária de empresas, descumprimento de contratos

A paralisação temporária de empresas certamente contribuirá para a contenção do coronavírus. Por outro lado, causará reflexos econômicos e jurídicos e abalará toda a sociedade.

O setor industrial, pela forte dependência econômica da China, já está colhendo os frutos danosos do coronavírus, tendo em vista a ausência de algumas peças e itens necessários para a fabricação de seus produtos e manutenção de suas operações, especialmente nos prazos previamente negociados.

O setor de serviços, de igual modo, também está vivendo na pele os abalos causados pelo coronavírus, pois está limitado à atuação virtual, estando em alguns casos impossibilitado de solucionar questões que demandam a presença física e até mesmo se vendo de mãos atadas para criar novas relações, já que é imperioso o isolamento e a quarentena e, por isso, o livre trânsito geográfico está restrito e houve o fechamento de algumas fronteiras.

É cristalino, então, que, em virtude do coronavírus, os recursos estão se tornando mais escassos e, por isso, há maior quantidade de normas jurídicas para tutelar as relações.

O fato é que, nas relações interempresariais, o descumprimento contratual e os seus efeitos não poderão ser invocados por uma das partes em desfavor da outra, pois o coronavírus tem causa alheia e externa à vontade de ambas. Os prejuízos terão de ser partilhados entre as partes, em proporções de razoabilidade e equanimidade. Certamente o Poder Judiciário será em breve acionado para tutelar essas questões e os reflexos que delas derivarem.

Economia e Direito: dia a dia na lida com a escassez

Tudo isso evidencia o que Francesco Carnelutti, jurista italiano, dizia: quanto mais Economia mais Direito. Desejamos a lei da abundância, o que é natural exatamente pela infinitude de desejos humanos. De qualquer forma, precisamos saber lidar com a lei da escassez, sobretudo a de recursos financeiros no momento para estancar a evolução do coronavírus e todos os reflexos e efeitos negativos por ela causados. A lei da escassez pode ser silenciosa, mas tem poder soberano, absoluto e inflexível sobre todos nós.

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*Letícia Duarte Hernandez, é advogada do escritório Hernandez e Ferreira Advogados Associados.

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