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Editado o decreto 10.422, de 13 de julho de 2020. E agora?

Entre as medidas estabelecidas com o novo ato normativo (decreto 10.422) está a prorrogação do prazo para a adoção da redução proporcional de jornada e de salário e para suspensão temporária do contrato de trabalho, que agora conta com o máximo de 120 dias.

sexta-feira, 17 de julho de 2020

Atualizado às 08:43

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Os efeitos e consequências da pandemia do novo coronavírus que assola a sociedade continuam a forçar a atuação legislativa e judiciária, com o objetivo de enfrentar e, pelo menos, apaziguar os prejuízos que estão sendo suportados por todos, especialmente, por empregadores e empregados, numa atuação constante e intensa da Justiça do Trabalho, que nunca antes havia sido tão acionada como o é agora.

Nesse diapasão, em 13 de julho de 2020 foi editado o decreto 10.422, que regulamenta a lei 14.020, de 6 de julho de 2020, que instituiu o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, notadamente, a redução proporcional de jornada e de salário e a suspensão temporária do contrato de trabalho.

Entre as medidas estabelecidas com o novo ato normativo (decreto 10.422) está a prorrogação do prazo para a adoção da redução proporcional de jornada e de salário e para suspensão temporária do contrato de trabalho, que agora conta com o máximo de 120 dias, conforme disposições abaixo:

Art. 2º O prazo máximo para celebrar acordo de redução proporcional da jornada de trabalho e de salário de que trata o caput do art. 7º da lei 14.020, de 2020, fica acrescido de trinta dias, de modo a completar o total de cento e vinte dias.

Art. 3º O prazo máximo para celebrar acordo de suspensão temporária do contrato de trabalho de que trata o caput do art. 8º da lei 14.020, de 2020, fica acrescido de sessenta dias, de modo a completar o total de cento e vinte dias.

Desta forma, à redução proporcional de jornada e de salário foram acrescidos 30 dias, totalizando 120 dias de eficácia. Por outro lado, para a suspensão temporária do contrato de trabalho foram adicionados 60 dias, o que possibilita o cômputo de também 120 dias, no que diz respeito à interrupção do labor e de contraprestação.

Mas, ao se deparar com a novel publicação, dentre outros questionamentos, dois nos parecem ser mais propensos a permear os pensamentos do empregador: (I) A previsão de 120 dias "apaga" os 90 dias anteriormente adotados? (II) E quanto à aplicação retroativa da redução proporcional de jornada e de salário e de suspensão temporária do contrato de trabalho, é juridicamente possível sua adoção, considerando o lapso temporal entre a publicação da lei 14.020 e a edição do decreto 10.422?

Quanto aos 90 dias anteriormente cumpridos, seja de redução, de suspensão ou de ambas medidas, eles não se "apagam" como consequência da edição do novo decreto. Em verdade, esse período é somado à nova previsão legal, o que possibilita o seu cômputo para o atingimento máximo do prazo das medidas, que é agora de 120 dias. Ou seja, a soma das duas possibilidades, redução proporcional da jornada de trabalho e de salário e suspensão temporária do contrato de trabalho, não pode superar 120 dias, sendo esse o prazo máximo de aplicação das hipóteses, juntas ou separadamente.

Ou seja, para as empresas que já atingiram o prazo máximo antigo, de 90 dias, pode-se aplicar mais 30 dias. O que foi estabelecido antes desse decreto serve de cômputo para o novo prazo máximo, de 120 dias.

Por outro lado, quanto ao terceiro questionamento, temos a situação dos empregadores que se viram num momento de "limbo jurídico", entre o lapso temporal decorrido entre a publicação da lei 14.020 e a edição do decreto 10.422.

Na semana que se passou entre uma e outra norma poderiam os empregados ser atingidos, retroativamente, pelos efeitos da redução proporcional de jornada e de salário e/ou pela suspensão temporária do contrato de trabalho? Bem, nesse caso, entendemos que não. Isso porque pensar e agir de forma diversa significa ir de encontro ao previsto (ou, nesse caso, ao não previsto) pela lei. Não há na redação do novo Decreto a exposição de possibilidade de retroação dessas medidas.

Então, como fica o salário daquele empregado que trabalhou em jornada reduzida durante o referido "limbo jurídico"? Entendemos que deve ser pago integralmente pelo empregador que, em tendo ocorrido esta situação, suportará o ônus unilateralmente, sem amparo governamental, justamente por consequência da carência de previsão da retroatividade.

Todavia, o ato do Poder Executivo não se limitou a regulamentar a prorrogação de aplicabilidade das medidas de manutenção do emprego e da renda, ele foi além. Inovou.

Com o decreto 10.422 a suspensão temporária do contrato de trabalho passa a ser aplicável de maneira fracionada, em períodos sucessivos ou intercalados, desde que iguais ou superiores a 10 dias e que não exceda o prazo máximo de 120 dias. Poderíamos dizer que essa nova abordagem se deve ao fato de já estarmos no ápice da crise pandêmica, pelo que a tendência agora (assim esperamos) é que as coisas retomem a normalidade, o que justifica a pactuação em "conta-gotas" da suspensão, que traz uma visão beneficamente tripla: o empregado passa menos tempo com o seu contrato de trabalho suspenso, ao passo que o empregador tem a possibilidade de reaver num menor espaço de tempo a sua força colaborativa, ao mesmo tempo em que o Governo Federal desonera- se do pagamento do benefício emergencial.

Face ao exposto, um adendo precisa ser feito. Sendo pactuada a redução de jornada ou suspensão do contrato, haverá garantia provisória do emprego durante o período acordado, bem como após o restabelecimento do contrato de trabalho, pelo mesmo período que durou a suspensão ou a redução. Se houver rescisão contratual sem justa causa, o empregador terá de indenizar o empregado na proporção do salário percebido pelo trabalhador durante o período de garantia provisória.

Ocorre que, como diz o ditado popular: nem tudo na vida são flores. Dispõe o artigo 7º, do decreto 10.422:

Art. 7º A concessão e o pagamento do benefício emergencial de preservação do emprego e da renda e do benefício emergencial mensal de que tratam, respectivamente, os art. 5º e art. 18 da Lei nº 14.020, de 2020, observadas as prorrogações de prazo previstas neste Decreto, ficam condicionados às disponibilidades orçamentárias. - destaques acrescidos.

A concessão e o pagamento do benefício emergencial, a priori, incumbido ao Governo Federal poderá resvalar no empregador. Expliquemos.

A redação do destacado artigo 7º dispõe que, o pagamento do benefício emergencial ficará condicionado às disponibilidades orçamentárias do Governo. Ora, ficaria o empregado exposto a tal prejuízo? Ao considerarmos o trabalhador a parte hipossuficiente da relação de trabalho, a resposta nos parece ser bem lógica: não.

Por outro lado, não sendo tal obrigação cumprida pelo Governo Federal, resta apenas o empregador nesta relação tríplice, que poderá ter de arcar com o pagamento dos salários no período de redução ou suspensão, haja vista que estamos falando de verba alimentar, ressalvado, ainda, o seu direito de regresso em face da União.

Logo, diante de tal paradoxo, é de bom tom que as empresas analisem cirurgicamente a indispensabilidade da prorrogação das medidas, com fulcro a atingir o prazo máximo de 120 dias, pois, o excesso dos 90 dias iniciais poderá recair sobre os empregadores.

Então, o que fazer diante dessa possibilidade? Bem, poder-se-ia sugerir a adoção da redução proporcional de jornada e de salário em detrimento da suspensão temporária do contrato de trabalho, haja vista ser a primeira alternativa menos onerosa para o Governo e, por reflexo, menos custosa também para o empregador, se futuramente a empresa tiver que arcar com esse "prejuízo".

De mais a mais, em harmonia com o atual cenário em que vivemos, as possibilidades legislativas e jurídicas também se mostram inovadoras e, em certa medida, assustadoras, dada a incerteza e mutabilidade do momento no qual estamos.

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*Anna Cláudia Pereira Queiroz é advogada Trabalhista do escritório MoselloLima Advocacia. Especialista em Direito Público e Privado, pela UniFTC Vitória da Conquista. Mestra em Linguística, pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB. Especialista em Direito Público: Constitucional, Administrativo e Tributário, pela Universidade Estácio de Sá.

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