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A responsabilidade pelo pagamento dos tributos da importação no dropshipping

O dropshipping tem caído nas "graças" dos consumidores por possibilitar a compra de produtos estrangeiros; nessa dinâmica, é importante saber quem deve se obrigar ao pagamento dos tributos de importação.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Atualizado em 8 de dezembro de 2020 07:47

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Entende-se dropshipping como uma alternativa, dentro do e-commerce, para a venda de mercadorias. Nesse modelo de negócios, um vendedor on-line, por meio de uma plataforma virtual, anuncia mercadorias que não possui em seus estoques, mas sim no estoque de terceiros, que, após a venda ao consumidor, se encarregam do envio e da entrega ao destinatário final. Em resumo, é o comércio sem estoque próprio.

O SEBRAE, através do seu Relatório de Inteligência, elaborado em janeiro desse ano, conceitua dropshipping como:

[...] uma modalidade de comércio formado por empresas que vendem online sem manter estoques próprios. Os itens ficam armazenados em fornecedores parceiros, que são responsáveis pelo envio direto dos produtos aos consumidores. Por exemplo, o vendedor anuncia uma camiseta na loja virtual de dropshipping que gerencia e um consumidor realiza a compra do produto. A partir dessa etapa, em que o pedido é gerado, o fornecedor recebe a solicitação para processar e despachar o item.

A margem de lucro desse modo de venda provém da diferença entre o preço anunciado pelo vendedor e o custo junto ao fornecedor/fabricante parceiro.

Por se constituir um modelo de negócios relativamente novo e atrelado ao mundo virtual, o dropshipping não é considerado por muitos como uma prática legal. Essa visão se dá apenas por aqueles que possuem um olhar anacrônico do mercado e não conseguem conceber como o dropship pode ser viabilizado.

Ademais, no âmbito do direito privado nacional não há vedação expressa à prática, de modo que vale a máxima de que ao particular é permitido fazer tudo aquilo que a lei não veda expressamente, conforme ensinado por Bulos (2010).

A ilegalidade do dropshipping pode advir não de sua existência, mas dos desdobramentos de sua operacionalização, principalmente se os tributos devidos por conta da atividade não forem regularmente recolhidos pelo contribuinte.

Quando o dropshipping oferece mercadorias provenientes do exterior, se enquadra na categoria de "negócio de importação", devendo se submeter aos procedimentos e regramentos da importação.

A importação, segundo a Receita Federal do Brasil (2014), "[...] compreende a entrada temporária ou definitiva em território nacional de bens ou serviços originários ou procedentes de outros países, a título oneroso ou gratuito."

Para saber quais impostos incidirão na operação, é importante definir que tipo de bem se está importando. Exemplificativamente, os impostos incidentes sobre a importação, em síntese, são o II (Imposto de Importação), e, a depender da mercadoria, IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), PIS (Programa de Integração Social), COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), ICMS (Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Serviços) e ISSQN (Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza).

Considerando que o dropshipping é um modelo de negócios cujo objeto é intermediar a importação e venda de produtos majoritariamente internacionais a consumidores brasileiros, em relação à importação da mercadoria, a responsabilidade tributária é do consumidor, que deve recolher os tributos incidentes nessa operação.

Em outras palavras, pode-se dizer que a relação jurídica na importação, sob a ótica tributária é entabulada entre o consumidor brasileiro e o vendedor estrangeiro, figurando o dropshipping apenas como facilitadora dessa negociação.

Assim sendo, pela natureza do dropshipping, a importação realizada é tida como se fosse uma importação própria, sendo afastada qualquer responsabilidade tributária principal do vendedor dropship.

Em relação à atividade preponderantemente realizada pela dropshipping, que é a prestação de serviços de intermediação para a venda de mercadorias importadas, destaque-se a ocorrência do fato gerador para o ISSQN (Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza). Embora essa atividade não esteja regulamentada, não havendo, portanto, lei própria a defini-la, pode ser utilizada por analogia a própria lei regente do ISS (LC 116/03), combinada com a regulamentação municipal para prever e tributar esse tipo de serviço. A alíquota incidente dependerá de cada município.

Em relação ao comércio promovido pelo dropshipping, com a consequente circulação de mercadorias, ocorrido está o fato gerador do ICMS (Imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços). Tal imposto é o que mais traz confusão e medo aos shippings.

Em que pese a responsabilidade tributária relativa ao pagamento do ICMS-importação pelos adquirentes de bens oriundos do exterior ter sido ratificada pela Súmula n. 660 do STF1, paira controvérsia sobre a responsabilidade principal pelo pagamento do referido tributo: deveria ser ele antecipado pelo intermediário (no caso, o dropshipping), sendo incluído na base de cálculo do IRPJ, PIS, COFINS e Contribuições Previdenciárias posteriormente ou deveria ser pago pelo consumidor, levando-se em conta a relação de intermediação da dropshipping?

O STF, consagrando o entendimento calcificado pela Súmula anteriormente mencionada, entende que a responsabilidade pelo pagamento do ICMS-importação é do destinatário final da mercadoria, ou seja, o consumidor, conforme abaixo ementado:

EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. DIREITO TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS - ICMS. IMPORTAÇÃO. ART. 155, §2º, IX, "A", DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ART. 11, I, "D" E "E", DA LEI COMPLEMENTAR 87/96. ASPECTO PESSOAL DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA. DESTINATÁRIO LEGAL DA MERCADORIA. DOMICÍLIO. ESTABELECIMENTO. TRANSFERÊNCIA DE DOMÍNIO. IMPORTAÇÃO POR CONTA PRÓPRIA. IMPORTAÇÃO POR CONTA E ORDEM DE TERCEIRO. IMPORTAÇÃO POR CONTA PRÓPRIA, SOB ENCOMENDA. 1. Fixação da seguinte tese jurídica ao Tema 520 da sistemática da repercussão geral: "O sujeito ativo da obrigação tributária de ICMS incidente sobre mercadoria importada é o Estado-membro no qual está domiciliado ou estabelecido o destinatário legal da operação que deu causa à circulação da mercadoria, com a transferência de domínio." 2. A jurisprudência desta Corte entende ser o sujeito ativo do ICMS-importação o Estado-membro no qual estiver localizado o destinatário final da operação, logo é irrelevante o desembaraço aduaneiro ocorrer na espacialidade de outro ente federativo. Precedentes. 3. Em relação ao significante "destinatário final", para efeitos tributários, a disponibilidade jurídica precede a econômica, isto é, o sujeito passivo do fato gerador é o destinatário legal da operação da qual resulta a transferência de propriedade da mercadoria. Nesse sentido, a forma não prevalece sobre o conteúdo, sendo o sujeito tributário quem dá causa à ocorrência da circulação de mercadoria, caracterizada pela transferência do domínio. Ademais, não ocorre a prevalência de eventuais pactos particulares entre as partes envolvidas na importação, quando da definição dos polos da relação tributária. 4. Pela tese fixada, são os destinatários legais das operações, em cada hipótese de importação, as seguintes pessoas jurídicas: a) na importação por conta própria, a destinatária econômica coincide com a jurídica, uma vez que a importadora utiliza a mercadoria em sua cadeia produtiva; b) na importação por conta e ordem de terceiro, a destinatária jurídica é quem dá causa efetiva à operação de importação, ou seja, a parte contratante de prestação de serviço consistente na realização de despacho aduaneiro de mercadoria, em nome próprio, por parte da importadora contratada; c) na importação por conta própria, sob encomenda, a destinatária jurídica é a sociedade. [GRIFO NOSSO]

Impende sublinhar, contudo, que o dropshipping não se encontra totalmente isento da imposição da carga tributária relativa ao pagamento do ICMS-importação; levando-se em conta que o dropship é um intermediário, e, portanto, um prestador de serviços, por força do contido no art. 134 do Código Tributário Nacional, acaso o consumidor não recolha o referido imposto e fique inadimplente, a responsabilidade tributária poderá vir a ser repassada ao intermediário.

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1- Súmula n. 660, STF: "Não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto."BRASIL. Constituição (1988). 22ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

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BRASIL. Código Tributário Nacional (1966). 22ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário com Agravo n. 665134/MG. Recorrente: FMC Química do Brasil LTDA. Recorrida: Estado de Minas Gerais. Relatora: Ministro Edson Fachin. Brasília, 27 de abril de 2020. Disponível aqui. Acesso em 11 de novembro de 2020.

BUENO, Sinara.  O que é importação? Faxcomex, 2020. Disponível aqui. Acesso em 11 de novembro de 2020.

BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

CASTRO, Diego. Dropshipping é ilegal? Aspectos jurídicos e legais da modalidade. Diego Castro Advogado, 2020. Disponível aqui. Acesso em 11 de novembro de 2020.

FERREIRA, Caio. Drop Shipping é legal no Brasil? Saiba tudo sobre a regularização. Empreenda Ecommerce, 2018. Disponível aqui. Acesso em 11 de novembro de 2020.

MESSA, Ana Flávia. Direito Tributário e financeiro. 7ª Ed. São Paulo: Editora Rideel, 2016.

PADILHA, Rodrigo. Direito Constitucional. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

RECEITA FEDERAL DO BRASIL. Importação. Receita Federal do Brasil, 2014. Disponível aqui. Acesso em 11 de novembro de 2020.

SEBRAE. Negócios na crise. Dropshipping: e-commerce sem estoque próprio. SEBRAE, 2020. Disponível aqui. Acesso em 11 de novembro de 2020.

VARGAS, Karoline. E-commerce - aspectos legais acerca do dropshipping. Brasil Fernandes Advogados, 2019. Disponível aqui. Acesso em 11 de novembro de 2020.

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*Juliana Alves Neves é graduada em Direito pela Universidade Veiga de Almeida. Pós graduada em Direito Tributário pela Universidade Cândido Mendes. Pós graduanda em Direito Processual Civil e Direito Empresarial pela Universidade Cândido Mendes. Atuação profissional no varejo de Shoppings Centers e demandas de Direito Tributário.

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