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A responsabilidade jurídica do servidor público no recebimento de materiais e serviços na administração pública

A Administração tem o dever de oferecer aos seus fiscais de contratos a capacitação e o treinamento adequados e necessários ao exercício da função.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

Atualizado às 08:55

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

O recebimento de materiais e serviços na administração pública é o ato administrativo pelo qual o ente público realiza a conferência quantitativa e qualitativa das mercadorias ou dos serviços entregues pelo fornecedores vencedores do procedimento licitatório.

 É onde se verificam se as condições e especificações estabelecidas no contrato estão sendo efetivamente cumpridos, caso os materiais ou serviços se apresentem de forma condizente com às especificações e condições da compra, a administrção deve  de pronto recurar ou estabelecer prazo para regularização por parte do fornecedor.

O artigo 63 §2º inc III da lei 4.320/64, estabelce o recebimento de material ou serviço  como uma das fases da despesa, qual seja: a liquidação; sendo essa dependende do aval de quem recebe o material ou serviço para realização do pagamento.

Em sintese, executado o contrato, vem o momento em que o objeto contratado é recebido pela Administração, a qual poderá rejeitar ou aceita-lo, o recebimento é realizado por uma comissão ou servidor desgnado pela autoridade competente conforme previsão do art. 67 da lei 8.666/93, o qual determina que deverá ser nomeado um representante da Administração Pública, para o recebimento do objeto contrato. Devendo expressamente constar no contrato, as atribuições do servidor nomeado, bem como os deveres e responsabilidades o qual esse subordina.

O servidor responsável pelo recebimento do objeto deve  observância ao deveres inerentes ao exercício da função pública, com fiel cumprimento dos princípios constitucionais e sempre primando pela finalidade pública.

Nesse sentido a realização do recebimento do objeto, pelo agente público responsável, deve ser mediante termo que comprove a adequação do objeto aos termos contratuais, essa confirmação deve ser certificada no documento fiscal, por meio de despacho ou carimbo em que conste o nome, matrícula e a assinatura do servidor responsável pelo recebimento.

A lei de Licitações e Contratos, lei 8.666/93, em seu art. 73 regulamenta a forma, provisória ou definitiva, que o objeto contratado deve recebido, deixando claro que a simples tradição do objeto não importa em aceitação pela Administração, sendo que essa deve tomar todas as cautelas para evitar o recebimento de objetos defeituosos ou em desacordo com o estabelecido.

Resumidamente a Lei distingue, o recebimento provisório, o qual é efetuado em caráter experimental para verificar a perfeição do objeto recebido, e o recebimento permanente, esse sendo realizado sempre que não se faça necessario a necessidade de se comprovar a qualidade, resistência ou operatividade do bem.

Importante frisar que o recebimento provisório ou definitivo não elimina o dever do fornecedor responder pela integridade da coisa, mesmo que o vício revele-se posteriormente, sendo que em em situação de inexecução total ou parcial do contrato à Administração tem a prerrogativa para aplicação das sanções de natureza administrativa explicitadas no art. 87 da lei de Licitações e Contratos.

No entanto caso seja constato uma omissão na fiscalização do recebimento do objeto por parte do servidor publico desgnado, a  resposabilização vai além do plano administrativo disciplinar, podendo esse responder civilmente e criminalmente.

Em se tratando de acompanhamento e fiscalização de contratos administrativos, onde se insere o servidor público, a lei 8.666/93, em seu artigo 82, faz previsão expressa sobre a possibilidade de responsabilizações, administrativa, civil e criminal desses agentes.

Salienta-se que as instâncias administrativa, criminal e civil são independentes entre si. Isso significa que determinada infração legal pode produzir responsabilização apenas na esfera administrativa, ou, ainda, cumular-se com outras responsabilizações civis e/ou penais.

No âmbito da responsabilização administrativa, busca-se repreender o mau comportamento funcional do agente no desempenho das suas atribuições, essa responsabilização tem cunho disciplinar e visa, mediante a aplicação de sanções exaradas pela própria Administração Pública elencados nos estatutos dos servidores públicos, os quais prevêm as penalidades advertencia, suspensão ou demissão.

A responsabilidade criminal ou penal do agente não se limita aos crimes previstos na Seção III do Capítulo IV da lei 8.666/93, mas também aos crimes próprios do servidor público, tipificados no Código Penal brasileiro.

Neste sentido, observa-se ser muito comum um crime praticado contra a lei de Licitações também ensejar a capitulação de outros crimes previstos no Código Penal, tais como: peculato; concussão; corrupção passiva, ou prevaricação.

Destaca-se que em caso de absolvição criminal, por negativa da autoria ou do fato, a eventual responsabilidade administrativa e civil será afastada. Ou seja, esse resultado no âmbito penal impede a responsabilização administrativa e civil do agente.

No tocante a responsabilização civil  essa decorrerá de eventual dano ao erário. Ou seja, poderá o agente público ser instado a indenizar o Estado por prejuízos por ele causados, por dolo ou culpa, esta última abarcando as hipóteses de imperícia, imprudência e negligência.

Importante mencionar que as ações de reparação ao erário são imprescritíveis, ou seja, poderão ser propostas a qualquer momento, sem limite temporal, isso decorre de previsão expressa no § 5º do artigo 37 da Constituição Federal.

Além das responsabilizações no âmbito administrativo, penal e civil, o agente público ainda está sujeito às penalidades impostaspela Lei de Improbidade Administrativa (lei 8.429/92).

A lei, em seus artigos 9º, 10 e 11, tipifica os atos de improbidade administrativa em três grupos específicos, quais sejam: os que importam em enriquecimento ilícito; os que causam prejuízos ao erário; e, os que atentam contra os princípios da Administração Pública.

Assim, caso o servidor público designado incorra em alguma das condutas elencadas nos dispositivos legais mencionados, esse poderá responder judicialmente a uma Ação Civil Pública por ato de  improbidade administrativa.

Por fim, conclui-se que despesa pública se realiza mediante o procedimento administrativo compreendido pelos atos de empenho, liquidação e pagamento, também chamados de fases da despesa, sempre observando a supremacia do interesse público sobre o particular e a indisponibilidade dos interesses públicos, pois o agente público não é o dono dos bens, direitos, interesses e serviços públicos, é apenas um mero gestor da coisa pública.

Por fim conclui-se que a atuação como fiscal de contratos administrativos exige do servidor designado capacitação, treinamento e conhecimento técnico suficientes para que esse exerça da melhor maneira possível a função. Afinal a boa fiscalização somente acontecerá se o agente público estiver amplo conhecimento e devidamente preparado para a função.

Assim, a Administração tem o dever de oferecer aos seus fiscais de contratos a capacitação e o treinamento adequados e necessários ao exercício da função, visando sempre alcançar o objetivo principal pretendido pelo artigo 67 da lei 8.666/93, que é o de assegurar o fiel cumprimento dos contratos firmados pela Administração, evitando, em última análise, prejuízos à sociedade e a consequente resposabilização dos agentes.

Ricardo Buratto

Ricardo Buratto

Advogado. Especialista em Direito Público e Gestão e Controle no Setor Público pela UNOESC. Professor de cursos de Especialização na UNOESC. Sócio da Baratieri Advogados Associados.

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