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A ilegalidade da cobrança de multa por perda de ticket de estacionamento

A cobrança de multa por perda de ticket de estacionamento é considerada prática abusiva, conforme o art. 39, V do Código de Defesa do Consumidor.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Atualizado às 17:44

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

É sabido que o crescimento paulatino dos estacionamentos como espaços aptos a guardar a frota de veículos das grandes cidades evidencia o desequilíbrio entre o crescimento da aquisição de automóveis e motocicletas e o planejamento urbano, que não é melhorado pelo Poder Público.

Observa-se também que os estacionamentos privados se mostram como uma alternativa ao espaço público efetivamente disponibilizado aos condutores, que já se mostra insuficiente.

Nesse sentido, entende-se como estacionamento uma área individualizada e destinada ao parqueamento de veículos automotores. O Código de Trânsito Brasileiro (CTB)1, por meio de seu anexo I, que traz conceitos e definições aplicáveis a essa legislação, entende o estacionamento como sendo a "imobilização de veículos por tempo superior ao necessário para embarque ou desembarque de passageiros".

Sob a ótica contratual, ao adentrar no estacionamento privado, o condutor celebra um contrato com a administradora do local. Destarte, o primeiro se compromete a pagar o preço exigido para o depósito e guarda de seu veículo e o segundo se compromete a consentir que o veículo seja depositado em seu espaço, responsabilizando-se por sua incolumidade.

A configuração dos Shopping Centers, estes como complexos varejistas cujo objetivo é atrair o maior número de consumidores possível, traz em si o estacionamento como um "plus" aos frequentadores, cativando-os com essa comodidade.

Tal qual já comentado, o ato de parar veículo automotor em estacionamento evidencia a celebração de um contrato de depósito oneroso, e, por meio dele, o Shopping se obriga a "guardar" o veículo do condutor até que este retorne e o pegue de volta. Tal disposição se encontra em consonância com o insculpido no art. 628 do Código Civil de 20022, cujo texto respalda esta modalidade de depósito.

O ticket do estacionamento - documento que atesta a relação entabulada entre o Shopping e o condutor - se constitui como requisito que valida esse contrato de depósito, porquanto possa "provar" a efetiva entrega do bem ao depositário.

Dada a importância do ticket, cabe ao depositante a guarda desse comprovante, para que possa atribuir ao depositário a responsabilidade por quaisquer danos ocorridos ao veículo automotor de sua posse ou propriedade.

Para além das abusividades cometidas pelos administradores de estacionamentos, destaca-se a cobrança de multa ao condutor que eventualmente perde o ticket que lhe foi ofertado.

O art. 39, V do Código de Defesa do Consumidor alicerça o direito do condutor em não ser penalizado pela perda de seu ticket, à medida em que tal conduta por parte do proprietário do estacionamento se constitui exigência de vantagem manifestamente excessiva em face do consumidor.

Assim sendo, tal prática é considerada abusiva, haja vista ser do fornecedor a responsabilidade pelo estacionamento, não devendo o consumidor ser cobrado pela perda do documento ou até mesmo ser constrangido com sua retenção no local.

No estado do Rio de Janeiro, o Tribunal de Justiça (TJRJ) se manifestou acerca do assunto, ao opinar pela abusividade dessa conduta.

Ademais, especificamente no município do Rio de Janeiro, o prefeito em exercício à época, editou uma lei (6.468/2019) dispondo sobre a perda ou extravio de cartão de ticket de estacionamento em estabelecimentos comerciais. Por meio dessa disposição legal, restou definido que 'fica expressamente proibida a cobrança de qualquer tipo de multa ou a aplicação de penalidades motivadas pela perda ou extravio do cartão de ticket estacionamento, desde que o proprietário do veículo automotor apresente a CNH - Carteira Nacional de Habilitação e Documentação do veículo."

Por fim, impende consignar que, em caso de perda do ticket ou cartão de estacionamento, caberá apenas a cobrança pelo tempo efetivamente utilizado pelo condutor. Para isso, é importante que as administradoras possuam registros de entrada e saída dos veículos do estacionamento.

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1 Lei 9.503/1997.
2 Art. 628. O contrato de depósito é gratuito, exceto se houver convenção em contrário, se resultante de atividade negocial ou se o depositário o praticar por profissão.
Parágrafo único. Se o depósito for oneroso e a retribuição do depositário não constar de lei, nem resultar de ajuste, será determinada pelos usos do lugar, e, na falta destes, por arbitramento.

 
Juliana Alves Neves

Juliana Alves Neves

Pós graduada em Direito Tributário pela Universidade Cândido Mendes. Pós graduanda em Direito Processual Civil e Direito Empresarial pela Universidade Cândido Mendes. Atuação profissional no varejo de Shoppings Centers e demandas de Direito Tributário.

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