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A nova lei de recuperações judiciais: Credibilidade e eficiência

Com a nova lei espera-se superar os problemas de transparência e eficiência da lei anterior que causavam descrédito ao instituto e afastavam investidores.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

Atualizado às 09:42

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

É justamente nas situações de crises econômicas que as atenções se voltam ao sistema legal de insolvências para seu aperfeiçoamento. Um sistema legal de insolvências moderno e eficaz é fundamental para resolver o excesso de ativos problemáticos na economia, destravando os mercados de crédito e de capitais e fazendo a roda econômica-produtiva novamente girar. E foi isso que ocorreu no Brasil com a promulgação da lei 14.112/20.

Juntamente com a celeridade nos processos judiciais, a recente legislação trouxe inovações com foco na maior transparência às situações de insolvência e no oferecimento de novas opções às reestruturações de empresas em crise.

Conferindo efetiva transparência combate-se o maior entrave ao crédito e ao investimento nas recuperações judiciais: a baixa credibilidade. Ofertando novas opções para a reestruturação de devedores assegura-se eficácia ao eliminar o cruel dilema imposto aos credores: aceitar planos de recuperação prejudiciais ou pouco receber na falência.

Citando alguns pontos que asseguram maior transparência temos a fiscalização das tratativas entre devedores e credores pelo administrador judicial evitando-se a exclusão dos pequenos e médios credores, negociações sigilosas com poucos credores e a concessão de vantagens paralelas.

Nesta linha tem-se também a obrigação de o administrador judicial em fiscalizar a conformidade e a veracidade das informações financeiras prestadas pelos devedores. Sem haver alguma forma de fiscalização nestas informações não é possível aos credores ou a potenciais investidores analisarem devidamente o caso sob a ótica de viabilidade e de compliance.

Por outra banda, doravante é obrigatório ao devedor descrever e comprovar a situação de insolvência explicando os motivos e a evolução da falta de liquidez que lhe obrigou a requerer a recuperação judicial. Com esta medida combate-se o uso fraudulento das recuperações judiciais para acobertar ilegalidades tais como desfalques financeiros como reais causas de crise ou a redução de passivos para mero benefício dos sócios dos devedores.

No que tange à eficiência, a nova legislação oferta opções outras aos planos de recuperação dos devedores ou ainda a sua rejeição que levava a empresa à falência. Pelo novo sistema os credores podem simplesmente rejeitar o plano de recuperação do devedor e aprovarem o seu próprio plano, evitando que a empresa vá à falência. Tal possibilidade muda radicalmente o equilíbrio de forças nas recuperações judiciais, dando de fato poder aos maiores prejudicados: os credores.

Dentro das novas opções disponíveis de reestruturação está notadamente a conversão de dívida em participação societária. Por este instrumento os credores podem rejeitar o plano de recuperação do devedor, aprovar o seu próprio plano prevendo a destituição da diretoria e aceitando o capital social da empresa em pagamento, já com a sua equipe de gestão a postos.

Esta estratégia certamente será igualmente válida para compra de empresas via aquisição de dívida por investidores ou por empresas concorrentes, forçando os devedores a elaborarem planos de recuperação com qualidade e a tratarem a todos os credores com igual deferência.    

Quanto ao maior problema da "antiga" recuperação judicial - a ineficiência da falência - o legislador previu severa punição ao administrador judicial que não vender os bens em 180 dias e ainda permitiu que sejam contratados profissionais especializados para auxiliá-lo na venda. Estas medidas vieram em conjunto com outras que vão acelerar a venda de bens de falências, criando um novo mercado e assegurando uma recuperabilidade minimamente satisfatória quando a liquidação de ativos é a única opção viável aos credores.

Outrossim, o novo sistema implica em mudanças radicais tanto no equilíbrio de forças quanto nas habilidades técnicas necessárias para operá-lo, o que pode causar desconfiança e desconforto em um primeiro momento. Mas esta nova legislação é um avanço imprescindível para superarmos as dificuldades econômicas que se aproximam e, por fim, termos um sistema de insolvências com credibilidade e eficiência. Seja bem-vinda e em boa hora chega a nova Lei de Recuperações Judiciais.  

Paulo Carnaúba

Paulo Carnaúba

Advogado com cursos e pós-graduação em administração e finanças, professor de reestruturações corporativas do Insper, fundador da Comissão de Estudos em Falência e Recuperação Judicial da OAB-Campinas

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