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A desnecessidade da suspensão do processo executivo em razão do incidente de desconsideração da personalidade jurídica

A suspensão do processo originário em razão do incidente, uma interpretação do art 134, 3°, CPC.

segunda-feira, 1 de março de 2021

Atualizado às 15:16

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Segundo o que se depreende do art. 134, parágrafo 3° do CPC, a instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica tem o condão de suspender o processo executivo. 

Tal pedido, quando formulado em razão do incidente, acaba por diversas vezes sendo interpretado pelo executado ou pelo Juízo como um ato suspensivo ao processo executivo, criando-se óbices e indeferimentos sobre os pedidos de movimentação processual realizados no curso da suspensão.

O contexto do processo incidental visa a extensão da responsabilidade aos sócios, e/ou a responsabilização de determinadas outras pessoas jurídicas como no caso da desconsideração da personalidade jurídica inversa. O que se pleiteia, em suma, não é uma exclusão, ou o sobrestamento total de um feito sobre o outro, mas tão somente uma extensão da responsabilidade pela dívida executada.

Nesse sentido, entendimento do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. SUSPENSÃO DO PROCESSO PRINCIPAL. ART. 134, §3º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. SUSPENSÃO QUE NÃO SURTE EFEITOS EM RELAÇÃO AO DEVEDOR PRINCIPAL, O QUAL PERMANECE RESPONDENDO PELA DÍVIDA EXECUTADA, INDEPENDENTEMENTE DA PROCEDÊNCIA OU NÃO DO INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E PROVIDO. (TJPR - 14ª C.Cível - 0018797-76.2018.8.16.0000 - Maringá - Rel.: Juíza Fabiane Pieruccini - J. 07.11.2018) - destaquei.

A interpretação correta que se deve fazer do referido artigo (não de forma isolada), é de que a suspensão do processo executivo em razão do incidente, prejudicaria a realização de atos processuais em face dos devedores originários, visto que haveria óbice ao determinar-se a obrigatoriedade do julgamento do mérito incidental, a fim de que se decida pelo prosseguimento ou não do processo de execução em desfavor do devedor principal.

Nesse sentido, também o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo:

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA - Decisão agravada que acolheu o pedido de instauração do incidente e determinou a suspensão da execução em relação à Empresa executada, com fundamento no artigo 134, §3º, do CPC - Impossibilidade - A melhor interpretação que se faz do referido dispositivo legal é de que a suspensão, em casos tais, deve atingir apenas os atos processuais relativos à pessoa física ou jurídica citada no incidente - Decisão reformada, para permitir o prosseguimento do feito em relação aos devedores originais, ficando suspensos apenas os atos processuais referentes à empresa EFFICAX INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA. - Recurso provido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2255962-63.2018.8.26.0000; Relator (a): Mario de Oliveira; Órgão Julgador: 38ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional III - Jabaquara - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 31/1/2019; Data de Registro: 31/1/2019) - destaquei.

A omissão do legislador quanto à possibilidade da realização dos atos processuais em face do devedor originário, fez "chover" recursos no Judiciário, principalmente quando ao pedido de nulidade dos atos processuais requeridos e deferidos sem o deslinde do processo incidental.

Há quem sustente que, só haveria possibilidade de desarquivamento e continuidade do processo executivo, nos moldes no art. 921, parágrafo 3° do CPC, no qual o exequente, deve trazer aos autos provas sobre a mudança do cenário econômico do executado; indicar bens à penhora, ou nos moldes do art. 923, caput do CPC, no caso de providências urgentes.

Entretanto, em que pese ao rol de aplicação do art. 921 e seguintes do CPC, no que refere às causas de suspensão processual, denota-se que o art. 134, parágrafo 3° do CPC, seria uma exceção à regra, principalmente no que refere-se ao art. 923 do CPC. 

Não seria adequado, condicionar a movimentação processual somente com base em novas provas ou no surgimento de medidas urgentes, tais condições são meramente um meio, a fim de alcançar a finalidade processual, no qual há de se esperar o uso a razoabilidade do magistrado em razão da cooperação jurisdicional, para deferir novas buscas e arresto, fundado na própria garantia do processo executório.

O imbróglio na cooperação judicial, especialmente com o sistema BacenJud, é a cessação dos efeitos e a resposta limitada das instituições bancárias, visto que, em suma, as instituições são desobrigadas a bloquear valores creditados após o envio da resposta. A busca pela reiteração principalmente quando o exequente consegue realizar a constrição de uma pequena parte do valor, ou quando simplesmente se decide reiterar o pedido sem qualquer novo fundamento, é contar com a razoabilidade do magistrado frente às limitações sistêmicas, e principalmente haver bom senso quanto ao lapso temporal entre os pedidos.    

Com efeito, a penhora de dinheiro está amplamente consagrada no art. 854 do Código de Processo Civil, na qual, a requerimento do exequente, o juiz sem dar prévia ciência ao ato determinará às instituições financeiras, por meio de sistema eletrônico gerido pela autoridade, que torne indisponíveis os ativos financeiros do executado. A penhora de dinheiro é medida preferencial, e não excepcional, além de estar amparada nos princípios da efetividade, da prestação jurisdicional e da duração razoável do processo.

Nesse sentido, a busca pela reiteração do procedimento não pode ser vista como uma transferência dos ônus e das diligências que são de responsabilidade do exequente, mas sim, a busca pela tutela executiva e satisfação do direito do credor, com fundamento no art. 797 do CPC, ainda que inexista novas provas para embasar um novo pedido.

Assim, mostra-se razoável o deferimento da penhora online, haja vista a possibilidade de alteração da condição financeira da parte executada, considerando-se a existência de tempo razoável desde a última busca, mesmo que esta tenha resultado frustrada. Não se mostra imprescindível, a existência de elementos novos, visto que o poder judiciário deve primar pela prática de atos necessários para a pronta solução dos conflitos e , portanto, o deferimento dos pedidos do exequente durante a suspensão processual, é além de interesse próprio, interesse da Justiça.

Por fim, uma execução efetiva é aquela que satisfaz o direito do credor, visto que este necessita da tutela jurisdicional para proporcionar pronta e integral satisfação, existindo o poder-dever de interpretar as normas relativas e extrair destas um significado que assegure maior proteção e efetividade ao direito à tutela executiva.

 

Thais Godoi

Thais Godoi

Advogada do escritório TSG Advocacia. Pós-Graduanda em Processo Civil pela PUC/PR.

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