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A situação do crime de homicídio na lei de crimes hediondos

O estudo dos crimes hediondos, embora sempre em alta traz questões que em princípio parecem simples, mas requerem uma atenção mais profunda para absorção dos pormenores que o legislador elencou na lei.

terça-feira, 16 de março de 2021

Atualizado às 10:20

 (Imagem: Arte Migalhas.)

(Imagem: Arte Migalhas.)

O crime de homicídio dada a gravidade do bem jurídico protegido e a relevância para o ordenamento jurídico, foi incluído no rol da lei 8.072/90, a chamada lei de crimes hediondos, a fim de que a reprimenda penal, punisse ainda mais severamente àqueles infratores.

Inicialmente, referido crime não constava do texto original da lei, que sofreu uma mudança significativa em 1994, com a alteração trazida pela lei 8.930/94, a chamada lei Glória Perez, cujo nome derivou de um triste episódio envolvendo a filha da atriz, Daniela Perez, morta pelo também ator Guilherme de Pádua.

A repercussão do crime foi bastante grave e a própria Gloria Perez colheu assinaturas para criar um projeto de lei, na mesma época em que um outro projeto já tramitava perante o Congresso Nacional que efetivamente veio a se consolidar na alteração ora em comento1.

Após isso, passou-se a dar tratamento diferenciado ao crime de homicídio, dificultando a progressão de regimes, concessão de benefícios e a aplicação da pena como um todo.

Resta saber, no entanto, quais hipóteses do crime previsto no art. 121 do CP estão abarcadas pela legislação extravagante.

A primeira observação que se faz é que o legislador penal especial não trouxe o homicídio simples para o rol do art. 1º da lei 8.072/90, de modo que apenas será hediondo o homicídio simples quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente.

Muito embora a lei não defina o que seria grupo de extermínio, a doutrina se debruça sobre o conceito para explicar o seguinte:

"A atividade típica de grupo de extermínio é caracterizada pelo homicídio praticado pela pessoa denominada justiceiro, sendo aquela pessoa que realiza pessoalmente a justiça, destemida e que se coloca na posição de exterminador ao fazer justiça com as próprias mãos, eliminando ou exterminando determinadas pessoas nocivas à coletividade" (HABIB, Gabriel. Leis Penais Especiais volume único, 2016, p. 371).

Para exemplificar, podemos dizer que a reprimenda foi assim disposta na lei ante a repercussão de um outro caso também bastante famoso e lamentável que foi a chacina da candelaria, ocorrida em 23 de julho de 1993, quando policiais atiraram contra várias pessoas que dormiam em frente a igreja da candelaria, muitas delas crianças e adolescentes, e segundo noticiado, havia informações de que os envolvidos atiravam objetos contra a polícia e nos dias anteriores pichavam e depredavam a igreja, se recusando inclusive a abandonar o local.

Voltando ao rol do art. 1º, I, da lei 8.072/90, além do homicídio simples, previsto numa hipótese peculiar à redação do diploma penal, encontram-se também previstos na norma extravagante, todas as hipóteses de homicídio qualificado (incisos I a VII do parágrafo 2º do art. 121).

A indagação que poderia ser feita diz respeito ao homicídio privilegiado, e a dúvida que se apresenta diz respeito à possibilidade de se cumular as qualificadoras especiais com as hipóteses de privilégio. Primeiro, há de se ressaltar que as causas de privilégio são subjetivas, isto é, estão atreladas ao sujeito, que pode cometer o crime impelido por relevante valor social, moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima.

Em todas as hipóteses de homicídio privilegiado, há previsão para diminuição da pena em 1/6 a 1/3.

Por sua vez, as qualificadoras se dividem em subjetivas e objetivas. As primeiras são ligadas aos aspectos do sujeito, sendo as hipóteses previstas nos incisos I, II e V do § 2º do art. 121, CP, e as objetivas aquelas previstas nos incisos III e IV, a saber: a) emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou que possa resultar em perigo comum; e b) Traição, emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido.

Desta forma, é possível cumular as hipóteses de privilégio com as qualificadoras de natureza objetiva, entendimento consolidado pelos tribunais superiores (STJ, HC 199602, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 11/03/2014). Todavia, ressalta-se que o homicídio privilegiado-qualificado seja possível, não será hediondo, por ausência de previsão legal, falta de tipicidade, e também pelo fato de o privilégio ser incompatível com a hediondez, de modo que não está sujeito às disposições da norma especial citada.

O tipo penal especial ainda contém outras duas hipóteses de homicídio tratado como crime hediondo, sendo o feminicídio, previsto no inciso VI, art. 121, § 2º, consistindo no homicídio contra mulher motivado por condições de sexo feminino, entendendo-se como tais: a violência doméstica e familiar e, o menosprezo ou à condição de mulher. Por se tratar de novatio legis in pejus, a Lei 13.104/2015 que deu acrescentou o art. 121, § 2º, VI, do CP e o inciso VI, no rol do art. 1º, I, da lei 8.072/90, não retroage para alcançar os casos anteriores à sua vigência.

Por último, a lei 13.142/15 alterou o Código Penal para acrescentar ao rol do art. 121, § 2º, o inciso VII, passando a tratar como qualificado o homicídio praticado contra agentes e autoridades públicas, ou seja, aquelas previstas nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal.

Conclui-se assim, que o legislador não apenas se preocupou em tratar e punir severamente às infrações penais elencadas como homicídio em suas mais diferentes formas criminais, abarcando quase toda legislação codificada, mas aperfeiçoou e manteve o rigor dado aos delitos hediondos em consonância com as exigências sociais, visando garantir a ordem social estável e imune a atitudes bárbaras e desumanas praticadas no seio da coletividade.

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1- Clique aqui. acesso em 11.03.2021

Rodrigo Nazário Geronimo Pinto

Rodrigo Nazário Geronimo Pinto

Advogado, especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Universidade Estadual de Londrina - UEL.

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