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Mulheres advogadas e pretas - paridade numérica em busca de representatividade

Destaco ainda que os desafios das mulheres advogadas e dos pretos e das pretas ainda serão extremamente mais complicados.

terça-feira, 16 de março de 2021

Atualizado às 11:53

 (Imagem: Arte Migalhas.)

(Imagem: Arte Migalhas.)

Myrthes Gomes de Campos foi a primeira mulher a compor os quadros do Instituto dos Advogados do Brasil em 1906, antes mesmo da existência da OAB, e 115 anos depois, nenhuma das 27 presidências das seccionais da OAB é exercida por uma mulher, apesar de termos hoje uma paridade numérica no quadro da advocacia brasileira.

Nos quadros do conselho Federal, nenhuma mulher figura como diretora e temos apenas 17 conselheiras Federais, dentre os 81 exercendo a função. Por dois pleitos eleitorais as normas internas exigiam 30% de composição das chapas de um dos gêneros, o que mesmo assim, ainda não trouxe a representatividade necessária para elevar as mulheres advogadas em posições de destaque no poder político do cenário institucional.

Finalizando o caminho em busca da representatividade, em 2020 aprovou-se a paridade de gênero nas chapas das próximas eleições; há inclusive a obrigatoriedade de 30% de pretos e pardos, e assim, teremos neste ano pela primeira vez na história da OAB eleições mais plurais com a expectativa de melhor distribuição de poder que reflita, na composição da instituição, o retrato de uma sociedade menos desigual.

Foram longos 90 anos de existência da OAB de pouquíssimas mulheres que conseguiram galgar, apesar do merecimento e competência, os espaços de poder e liderança em pouquíssimos estados, nunca em âmbito federal. Devemos destacar que as cotas não visam uma obrigatoriedade de preferência por um dos gêneros, ao contrário, aponta para a oportunidade que o mérito seja exaltado independente do gênero.

Isto porque, o grande objetivo da instituição - que possui histórica militância democrática - é que as ferramentas impositivas sejam um dia dispensadas por terem alcançado o seu fim. Devemos reconhecer que, infelizmente, esta é ainda a melhor forma de colaborar para a igualdade de gênero, mesmo não sendo suficiente para transpor barreiras políticas e de poder enraizadas na OAB federal e nas seccionais há quase um século.

Quem sente conforto com a composição que estampa 32 homens brancos como representantes da OAB Federal e das OAB dos Estados, sabendo que somos nós mulheres que contribuímos com mais da metade dos recursos que sustentam a instituição? Como chegamos aqui sem ao menos nos questionarmos por que esta hegemonia ainda persiste em acontecer?

No decorrer da validade dessas ferramentas, conclui-se que nada vale a imposições na formação do pleito eleitoral se as posições forem de coadjuvância, se durante as gestões nós mulheres somos determinadas a ocupar espaços já delimitados e que não possamos exercer plenamente nossas capacidades em todos os temas da sociedade e do Direito, e também nas gestões administrativas.

E não tem jeito, somente mulheres sabem as dores e dificuldades de exercer a advocacia onde menos de 30% das sociedades de advogados são compostas por mulheres e onde se confia mais no terno do que no salto. Da mesma forma que somente um preto ou uma preta sabem todos os desafios em exercer a advocacia num sistema judiciário com predominância esmagadora de brancos, e por isso, a representatividade precisa sair das normas e conectar os homens às mulheres, os brancos e as brancas aos pretos e às pretas, no entendimento que, quanto mais rápido a pluralidade acontecer, mais rápido teremos um ambiente acolhedor e uma instituição realmente representativa, e ao fim e a cabo, com resultados que realmente atinjam a advocacia moderna.

Assim, as eleições de 2021 serão históricas para a nossa instituição quase secular, cabendo às mulheres, aos pretos e às pretas, valorizarem a força legal que possuem na formação das chapas e no exercício do voto, buscando compor quando realmente exista uma transferência de poder e escolher quem realmente busca a representatividade. Qualquer atitude mais conveniente e longe dessas premissas, prejudica e atrasa sobremaneira o avanço da nossa instituição em refletir os advogados e advogadas do nosso país.

Destaco ainda que os desafios das mulheres advogadas e dos pretos e das pretas ainda serão extremamente mais complicados. Como em qualquer iniciante dos ambientes profissionais, caberá a todas e todos, pioneiros nas funções, exercê-las com profissionalismo voluntário, obviamente, se saírem vencedores no pleito eleitoral, qual é minha declarada torcida para todo o Brasil e pela nossa OAB.

Erica Ferreira Neves

Erica Ferreira Neves

Advogada.

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