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A necessária imparcialidade e vedação da iniciativa probatória do juiz da instrução e julgamento no curso do processo penal

Uma breve análise ao que concerne à vedação da iniciativa probatória pelo juiz da instrução e julgamento no processo penal.

sexta-feira, 26 de março de 2021

Atualizado às 17:41

O sistema processual penal brasileiro é caracterizado pela contraposição de acusação e defesa em iguais condições, sobrepondo-se a ambas um juiz equidistante e imparcial. Portanto, não se admite qualquer aproximação ao processo inquisitório, haja vista que este se mostra como incompatível com dos direitos e garantias individuas preconizados pela CRFB/88, bem como viola gravemente a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH, art. 8º, nº1).

Ao se abordar a iniciativa probatória do juiz durante a instrução e julgamento da ação penal, remetida principalmente ao art. 156, inciso II do CPP (por exemplo, não se excluindo os demais dispositivos legais), observa-se a previsão expressa da atuação ex officio do magistrado, de maneira subsidiária, no curso do processo judicial. Tal iniciativa deve, por óbvio, observar as garantias inerentes ao devido processo legal, bem como prezar por sua imparcialidade e motivar suas decisões ao dispor de tais medidas.

Os defensores da iniciativa probatória do juiz afirmam que não haveria qualquer comprometimento da imparcialidade por parte dos magistrados, uma vez que este, ao determinar a produção de uma prova, não saberia, de forma antecipada, o resultado a ser obtido pela diligência, bem como não seria capaz de possuir o conhecimento de qual parte da relação processual seria beneficiada diante do resultado probatório. Seria, portanto, um mecanismo voltado para, de forma secundária, sanar dúvidas e eliminar incertezas.

No entanto, conforme se observa, boa parte da doutrina mostra-se resistente quanto à admissibilidade da atuação ex officio pelos magistrados, eis que estaríamos diante de uma violação ao nosso sistema processual penal acusatório e, consequentemente, comprometendo a imparcialidade do julgador.

Nessa perspectiva, sob a óptica psicológica e os atributos inerentes ao ser humano, o magistrado ao determinar de ofício a produção de determinada prova, em proveito de quaisquer das partes, restaria ligado a uma destas. Ou seja, quando assim o faz, o julgador assume um papel desarmônico na relação processual, mesmo que de maneira inconsciente.

Ademais, buscando assegurar a imparcialidade daquele que desempenha a função de julgar e aplicar o Direito, em consonância ao garantismo empregado pelo nosso ordenamento jurídico, tem-se a nova redação do Art. 3º-A do CPP, ratificando a estrutura acusatória do processo penal, como também vedando a iniciativa do juiz na fase investigação e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação.

Muito embora o dispositivo legal não trate de forma expressa a vedação quanto à fase processual, faz-se necessária uma interpretação sistemática da lei 13.964/19, eis que por esta também restou vedada a decretação de medidas cautelares pessoais ex officio pelo magistrado, em sede de investigação ou processo penal.

Por fim, necessária se faz a fala de Zaffaroni:

A jurisdição não existe se não for imparcial. Isto deve ser devidamente esclarecido: não se trata de que a jurisdição possa ou não ser imparcial e se não o for não cumpra eficazmente sua função, mas que sem imparcialidade não há jurisdição. A imparcialidade é a essência da jurisdicionariedade e não o seu acidente.1

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1 ZAFFARONI, Eugênio Raul. Poder judiciário: crise, acertos e desacertos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

Joanna Cunha Machado da Rosa

Joanna Cunha Machado da Rosa

Pós-graduanda em Direito Público.

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