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Os impactos do posicionamento de grandes empresas na sociedade contemporânea

Os jovens de hoje exigem um posicionamento transparente e direto das marcas que consomem. Entretanto, é importante entender como esses posicionamentos podem ter consequências diferentes, a depender da cultura local.

segunda-feira, 5 de abril de 2021

Atualizado em 6 de abril de 2021 16:59

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Geralmente os padrões de consumo e produção varejista são ditados pelas gerações mais jovens, de 20 a 30 anos, ou seja, aqueles nascidos entre 1985 e 2010. Essas gerações são conhecidas popularmente como Geração Z e Millennials. Elas dominam grande parte do mercado de trabalho, detém um poder de compra significativo e, consequentemente, compõem grande parte do público consumidor. Uma demanda frequente dessas gerações é rapidez, agilidade, energia e transparência, em consonância com o estilo de vida da maioria deles. As grandes empresas, por sua vez, para acompanhar as novas tendências de consumo, têm enfrentado alguns desafios quanto a suas formas de produção, marketing e gestão.

Primeiramente, é importante contextualizar o cenário político e socioeconômico na qual os jovens dessas duas gerações cresceram. Um dos fatores mais marcantes dessa juventude é a globalização, um ritmo de vida mais acelerado, mudanças constantes e mais frequentes. Muitos deles acompanharam o surgimento das principais redes de comunicação utilizadas hoje, como WhatsApp, Instagram e Facebook. Há quem defenda também que essas gerações são mais imediatistas, pois estão acostumadas ao livre acesso de informações com simples e poucos toques em smartphones ou tablets. Uma refeição pode chegar rapidamente, por aplicativos de delivery uma mensagem é enviada e respondida quase que instantaneamente, um motorista de aplicativos consegue buscar um passageiro em menos de cinco minutos.  Somados a esses hábitos, têm-se as manifestações populares que marcaram os anos de 2011 a 2020, ao redor do mundo, para citar algumas, a Revolução Branca, no Egito em 2011, as Jornadas de Junho, no Brasil, em 2013, o Movimento #BLACKLIVESMATTER, dos Estados Unidos, em 2020.  Apesar de motivações distintas, esses movimentos demonstram como esses jovens conseguem ter uma repercussão nacional e, às vezes, até global dos seus pontos de vista, posicionamentos políticos e ideológicos e, através das redes sociais, se ligarem a pessoas com ideias parecidas.

Como consequência, essas gerações têm uma visão crítica e questionadora de tudo ao seu redor, não apenas da política, mas também das informações e produtos que consomem. Afinal de contas, os Millennials e a Geração Z, sabem que o conteúdo que consomem e têm acesso impacta no seu modo de vida e na forma como eles serão vistos pelos outros ao seu redor.

Não é surpresa que os jovens de hoje estejam mais preocupados com o resultado de suas atitudes e modo de vida. Muitos deles se preocupam com o consumo sustentável, em oposição ao consumismo exacerbado de gerações passadas. Há também aqueles que preferem consumir produtos reciclados que, quando descartados, tenham menos impacto no meio ambiente. Há uma demanda maior por marcas que sejam socialmente responsáveis e uma procura por aquelas que vão de encontro com suas ideologias e posicionamentos. Esses jovens aceitam diferenças com maior facilidade e aprendem a utilizá-las ao seu favor. Além disso, é comum que esses jovens usem seus celulares durante compras para fazer comparações de preços, que, antes de comprar, procurem a origem do produto e a forma como ele foi feito. Ademais, esses consumidores se importam com a história por trás da marca, por trás do produto e, gostam de se relacionar com as empresas. Nesse sentido, esse público tem dado preferência a produtores, serviços e negócios locais.

Atentas a esse novo padrão de consumo, algumas grandes empresas varejistas, como H&M, Zara, Nike e Adidas, tem se posicionado abertamente a acontecimentos políticos e socioeconômicos, mostrado a etapas do processo de produção das peças e reduzido o impacto das suas matérias primas no meio-ambiente.

Contudo, o problema é que, algumas vezes, grandes marcas atendem um público mundial, muito diversificado e, elas podem ter dificuldades em se posicionar diante de algumas questões sociais e ideológicas. Por outro lado, elas entendem que não devem se manter neutras diante de algumas situações. Assim, ao mesmo tempo que muitas empresas tentam acompanhar a linha dos Millenial e Geração Z, elas se chocam com alguns problemas estruturais de sua linha de produção e acabam sendo boicotadas pelo seu público consumidor.

Esse comportamento foi observado nas últimas semanas na China. As multinacionais Nike e H&M, foram algumas das marcas a sofrer críticas de seus consumidores chineses, depois de se posicionarem contra o suposto caso de genocídio de uigures. É possível que a maioria dos uigures esteja em campos de trabalho e doutrinação política e antirreligiosa.  Esses campos, por sua vez, são áreas de cultivo de algodão, matéria prima para a produção de algumas roupas dessas empresas. As empresas se posicionaram contra o trabalho escravo e anunciaram que vão cortar as relações de compra de algodão que vem da região chinesa Xinjijang. Como consequência, jovens e celebridades chinesas iniciaram um posicionamento contrário a essas marcas. Os produtos da H&M foram banidos dos maiores sites de e-commerces do país, o aplicativo de celular desta marca foi banido dos celulares de marcas Xiaomi, Tencent e Huawei. O aplicativo chinês de transporte privado, Didi, foi proibido de deixar passageiros na porta das lojas da H&M e que, ainda, desapareceram do Apple Maps da China. Outrossim, mais de 50 celebridades chinesas rescindiram contratos com a Nike, Adidas e H&M. Como consequência, as expectativas de crescimento dessas multinacionais não estão tão positivas na China, como antes.

De fato, nota-se que, hoje os jovens dessa geração não têm a mesma preocupação em ser politicamente corretos como os jovens de outrora, muitos deles acabam preferindo persistir nos seus ideais e valores, inclusive na hora de consumir, do que se preocupar cegamente com os Direitos Humanos. A maioria vê com bons olhos a ideia de respeitar suas crenças e ideologias ao consumir. Entretanto, para acompanhar as tendências de consumo, a maioria dessas empresas entende que não é vantajoso não se posicionar ou se manter neutro.

 Além disso, eles sabem do poder que têm com a acessibilidade de tecnologias de comunicação na palma de suas mãos. Ademais, os acontecimentos na China fizeram multinacionais repensarem estratégias de marketing. Considerando as penalidades que o público-alvo conseguiu aplicar em grandes marcas, é provável que elas se promovam de formas diferentes na China e no resto do mundo.

Os últimos acontecimentos, motivaram a reflexão de como o posicionamento de uma grande marca é importante e de como ele pode impactar diferentemente em diversas regiões ao redor do mundo, dependendo das culturas e tradições locais. Se por um lado, a oposição ao genocídio de Uigures foi vista como maus olhos pelos chineses, por outro, é provável que o público ocidental não aprovasse uma falta de posicionamento quanto a essa questão. Cumpre ressaltar que a Geração Z e os Millenials valorizam a transparência das empresas que consomem, pois hoje não se compra apenas o produto, mas toda a ideia do que ele representa, em toda a cadeia do processo produtivo.

Helena Ávila

Helena Ávila

Colaboradora no escritório Macedo e Barreto Advocacia e Consultoria e atua nas áreas de Direito Consultivo e Propriedade Intelectual.

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