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Tribunal de Justiça de Goiás nega pagamento da remuneração dos mediadores e conciliadores

As decisões são extremamente contraditórias as duas primeiras demandas ajuizadas pela Associação.

terça-feira, 1 de junho de 2021

Atualizado em 2 de junho de 2021 08:37

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Na semana passada o TJGO negou o pagamento imediato de remunerações a mediadores e conciliadores movida pela Associação CONAME¹. O acesso a remuneração foi negado na primeira e segunda instâncias do TJGO, segue em anexo a decisão preliminar em sede de recurso de agravo de instrumento de relatoria do Desembargador Fausto Moreira Diniz, que confirmou a decisão pela não configuração de tutela de urgência da juíza de primeiro grau Dra. Mariuccia Benicio Soares Miguel.

As decisões são extremamente contraditórias as duas primeiras demandas ajuizadas pela Associação, que tiveram recentemente sentenças de mérito consagrando o direito a remuneração dos mediadores, as quais ainda houve confirmação a decisões liminares para recebimento imediato. Contudo, o mesmo Tribunal que gerou as primeiras sentenças do Brasil, que consideraram o caráter alimentar da remuneração dos mediadores em Goiás, na terceira demanda de identidade de pedidos, os direitos humanos dos conciliadores foram negados de forma genérica, sem o cuidado e a atenção merecidos.

Observa-se que trata de valores oriundos de processos da justiça gratuita apenas do ano de 2018, em que mediadores e conciliadores trabalharam sem recebimento da remuneração, mesmo com previsão legal e resguardados por previsão orçamentária estadual, com identificação clara e individual dos valores de cada auxiliar da justiça.

Relembramos que existe a remuneração privada, prevista inicialmente pela lei de Mediação, que entrou em vigou no final do ano de 2015 (lei 13.140/15), a qual em seu art. 13 prevê que a remuneração devida aos mediadores judiciais será fixada pelos tribunais e custeada pelas partes. E existe a remuneração pública, prevista no novo Código de Processo Civil em seu art. 169, em que o poder público se responsabiliza a pagar aos conciliadores e mediadores judiciais suas remunerações em casos de ações guarnecidas pela assistência judiciária gratuita, conforme parâmetros estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ - Resolução 125/10, emenda 02, de 08 de março de 2016).

É necessário que sejam feitos todos os esforços para padronizar o procedimento de pagamento da remuneração privada pelas partes. Ainda existem magistrados que não compreendem nem determinam o pagamento, além de formas não convenientes de realização desse pagamento, sendo mais comum ocorrerem no primeiro momento da audiência, de forma pouco ortodoxa.

Embora já tenhamos levantado vários problemas quanto a remuneração paga pelas partes (privada), as ações ajuizadas tratam da remuneração paga pelo poder público, em casos de gratuidade da justiça, que estamos enfrentando entraves burocráticos na efetivação dos pagamentos aos auxiliares da justiça.

Em Goiás, a questão da remuneração foi estabelecida pela recente lei estadual 19.931, publicada e em vigor desde 29/12/17, a qual alterou o Regimento de Custas e Emolumentos da Justiça do Estado de Goiás, a lei 14.376/02, estando a previsão legal em todo art. 38-C.

O caput do artigo supramencionado se refere a remuneração privada, enquanto o § 1º estabelece a pública, pelo que em caso de conciliação ou mediação sob o pálio da gratuidade da justiça, os respectivos atos serão remunerados pelo Estado de acordo com a tabela publicada pelo Tribunal de Justiça.  Assim, com a publicação do Decreto Judiciário 757/18, a remuneração do conciliador ou mediador judicial nos procedimentos pré-processuais e processos judiciais com deferimento da gratuidade da justiça ficou definido que será paga pelo Estado nos seguintes valores: audiência de conciliação, R$ 7,98, e a audiência de mediação, R$ 23,96.

Importante lembrar o § 2º do mesmo art. 38-C, que grifa o fato deste tipo de remuneração dar-se-á mediante previsão da lei Orçamentária Anual, segundo proposta do Poder Judiciário. Esta previsão apresentou no ano de 2018 uma reserva orçamentária de mais de R$245 mil reais a serem destinados para pagar os auxiliares da justiça.

Seguindo esta linha, a Associação CONAME em conjunto com o Movimento Mediadores em Ação abriram alguns procedimentos administrativos junto a Procuradoria-Geral do Estado de Goiás (PGE-GO - processo 202000003006357), o órgão responsável pelo efetivo comprometimento dos valores para liberação da transferência dos pagamentos individuais, bem como junto ao TJGO (PROADs 202102000261674 e 202104000270402), todos pleiteando a regularização e pagamento das remunerações, requerendo ainda a emissão de novo Decreto ao Presidente do Tribunal para atualizar os valores das mediações e conciliações judiciais em processos de assistência judiciária gratuita, conforme previsto em lei. Os processos administrativos estão parados no NUPEMEC do TJGO sem previsão de movimentação.

O mais intrigante é que mesmo com o êxito da CONAME nas duas primeiras ações judiciais na comarca de Goiânia/GO (protocolos 5531952.40.2018.8.09.0051 e 5598333.93.2019.8.09.0051), sentenciadas pela Drª. Zilmene Gomide da 4ª Vara da Fazenda Pública Estadual, com as medidas acolhidas liminarmente para liberação imediata das remunerações do ano de 2018, tendo como argumento principal tratar de verba de caráter alimentar, na terceira demanda a tutela de urgência foi negada sem critério plausível.

A Associação CONAME lamenta muito o ocorrido, mas a realidade da prática judicial deve ser estampada a todos. Infelizmente, estamos diante de um Judiciário lotérico em que a segurança jurídica é cada vez mais rara. Como se não bastasse uma associação de conciliadores buscar a jurisdição, ainda temos que experimentar o amargo típico, desatento e indiferente do Judiciário, que sequer valoriza seus auxiliares que também fazem a entrega da prestação jurisdicional.

Informamos que ainda não foi julgado o mérito do recurso, se tratando de decisão preliminar que pode ser modificada até pelo próprio Relator, portanto a Associação vai manejar recurso, pois estarão presentes inclusive os requisitos para uma tutela de evidência, com mais proeminência do que a tutela de urgência convencional, máxime pelo caráter alimentar da remuneração e pelo amparo normativo, grifando tratar de direito humano.

Toda classe dos mediadores e conciliadores do Brasil deve se unir em especial pela defesa de seus direitos. Esta notícia de negativa da remuneração, por certo, deve ter mais visibilidade do que as anteriores que autorizaram o pagamento, muito devido a indignação e frustação da infeliz realidade. Além da CONAME existem diversas associações e sindicatos de conciliadores e mediadores pelo Brasil, que já estão em plena comunicação e união dos interesses da classe, um movimento nacional está sendo criado para representar conciliadores e mediadores juntos aos Tribunais e no Conselho Nacional de Justiça, mas é necessários o apoio e a aderência de todos.

___________

1. TJGO - Agravo de Instrumento 5249356-34.2021.8.09.0000, decisão preliminar em anexo.

Fernando Sousa

Fernando Sousa

Advogado. Doutorando em ciências jurídicas processuais pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Portugal. Professor de processo civil, prática jurídica cível e teoria geral do processo. Professor em pós-graduações de processo civil, negociação, mediação, conciliação e arbitragem. Mediador e instrutor de mediação judicial pelo Conselho Nacional de Justiça. Arbitralista. Presidente da associação de conciliadores, arbitralistas e mediadores CONAME. Autor de duas obras jurídicas e de artigos e ensaios científicos publicados.

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