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Principais aspectos da lei do Superendividamento

Em síntese a lei consiste em evitar o crescente número de inadimplentes, viabilizar as negociações dos endividados, através das seguintes mudanças: processo de repactuação de dívida, clareza nas propostas de contratação de serviços de créditos, proibição de assédio ao consumidor na hora de fechar contratos.

segunda-feira, 2 de agosto de 2021

Atualizado às 13:44

(Imagem: Arte Migalhas)

O que é a lei do superendividamento?

A lei do "Superendividamento" foi criada para trazer mudanças no Código de Defesa do Consumidor, atribuindo recursos para evitar o número crescente de endividados no Brasil, bem como permitir meios para as negociações.

Assim expressa a implementação dos incisos IX e X no art.4 e inciso VI do art.5, ambos do CDC:

"art.4° A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

(...)

IX - fomento de ações direcionadas à educação financeira e ambiental dos consumidores;

X - prevenção e tratamento do superendividamento como forma de evitar a exclusão social do consumidor.

art.5°  Para a execução da Política Nacional das Relações de Consumo, contará o poder público com os seguintes instrumentos, entre outros:

(...)

VI - instituição de mecanismos de prevenção e tratamento extrajudicial e judicial do superendividamento e de proteção do consumidor pessoa natural;" 

Podemos dizer que a nova lei traz uma nova característica para o consumidor inadimplente, que é o "Superendividado", este perfil é atribuído ao indivíduo que está impossibilitado de arcar com suas dívidas e em razão desta insolvência, sua subsistência está sendo afetada.

É importante reforçar que a lei do SUPERENDIVIDAMENTO não se estende aos consumidores que contraem dividas agindo de má-fé, contratos fraudulentos ou com o propósito de não realizar o pagamento ou decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor (art.54-A, §3 do CDC).

Segundo o CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) a entidade alega que no primeiro semestre de 2021 o número de inadimplentes que ganham até 10 salário mínimos chegaram a 69%. Para reverter este quatro critico, a lei 14.181/21 estabeleceu as seguintes mudanças:

Processo de repactuação de divida 

A lei viabiliza um mecanismo, análogo à recuperação judicial, mas para as pessoas físicas

Nas hipóteses em que o insolvente tiver mais de um credor, mesmo que de instituições financeiras diferentes, poderá chamar todos para o mesmo processo, estabelecendo um montante total de todas as dívidas e fixando um valor mensal a ser pago de uma só vez a todos os credores.

"Art. 104-A. A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas.  

Outro ponto importante, é que na mesma lei se dá como prioridade a conclusão das negociações pelas audiências de conciliação, sendo que se o credor menosprezar a tentativa de acordo, se omitindo injustificadamente em comparecer, terá a exigibilidade de sua dívida suspensa e a interrupção das cobranças encargos de mora.

Ocorrendo o acordo já na audiência de conciliação o juiz homologará a decisão:

1.    estabelecendo o prazo de pagamento e sua dilação;

2.    A suspenção ou a extinção das ações de exigibilidade de dívida em curso;

3.    Data que será excluído o nome do consumidor dos bancos de dados de canais de inadimplência (SERASA, SPC...); e

4.    Firmar meios de condutas voltados para o Consumidor, para evitar que o mesmo se endivide novamente ou agrave suas dívidas.

Nas hipóteses em que não houver acordo na conciliação, a pedido do consumidor o juiz estabelecerá o processo de superendividamento que consistirá na revisão de todos os contratos e repactuação das dívidas remanescentes, podendo ser exigido somente o valor original da dívida sem os encargos e juros abusivos.

O plano judicial da repactuação será compulsório, ou seja, será imposto aos credores, garantindo o valor principal da dívida e estabelecerá um prazo máximo de até 5 anos para quitação, devendo ser paga a primeira parcela em até 180 (cento e oitenta) dias, contado a parti da homologação.

Quando não houver riscos de onerar as partes, o juiz poderá nomear administrador no prazo de 30 dias (Art. 104-B, § 4° CDC).

Clareza nas propostas de contratação de serviços de créditos

A lei de Superendividamento estabelece também, que na contratação de crédito o serviço deve ser o mais transparente possível. A intenção desta mudança é demonstrar os riscos na contratação, evitando novos endividados e também a implementação de juros abusivos.       

Mesmo sendo recente a publicação da lei, a mesma já produziu efeitos em relação a transparência de contratação de serviços de créditos. O TJGO condenou um banco em danos morais, se fundamentando na lei do Superendividamento, a qual a corte entendeu que não houve clareza pelo fornecedor na hora de fechar o serviço de crédito (processo 5409656.79.2019.8.09.0051).  

Proibição de assédio ao consumidor na hora de fechar contratos

Outra inovação é a defesa preventiva do consumidor, que ocorre no momento de fechar novos acordos. A lei proíbe e torna como irregular qualquer tipo de insistência, coação, propaganda promocional forçada ou qualquer outro tipo de constrangimento na hora de firmar um novo contrato.

"Art. 54-C. É vedado, expressa ou implicitamente, na oferta de crédito ao consumidor, publicitária ou não:

IV - assediar ou pressionar o consumidor para contratar o fornecimento de produto, serviço ou crédito, principalmente se se tratar de consumidor idoso, analfabeto, doente ou em estado de vulnerabilidade agravada ou se a contratação envolver prêmio;         

Na negativa do cliente, o fornecedor deve respeitar tal decisão e caso haja a insistência, pode denunciar a coação para a gerência do fornecedor ou para sua central de reclamações e em casos extremos para entidades e órgãos de proteção ao consumidor.

Orientação e educação financeira

Além de proporcionar mais equilíbrio nas negociações, ratifico aqui que a lei 14.181/21 visa evitar novos endividados, com isso traz também como missão a educação financeira. Fica evidente está tarefa à qual é citada por duas vezes no art.4, inciso IX e art.6, inciso XI do CDC.

Os meios para se atingir está educação estão na transparência nas contratações, deixando o consumidor ciente dos riscos no firmamento do pacto.

Cabe ainda reforçar que na sentença de homologação o juiz pode estabelecer meios para o consumidor se abster de novas práticas que implique em outros endividamentos, como posto no §2° do art.104-C:

 

"Art. 104-C. Compete concorrente e facultativamente aos órgãos públicos integrantes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor a fase conciliatória e preventiva do processo de repactuação de dívidas, nos moldes do art. 104-A deste Código, no que couber, com possibilidade de o processo ser regulado por convênios específicos celebrados entre os referidos órgãos e as instituições credoras ou suas associações.

§ 2º O acordo firmado perante os órgãos públicos de defesa do consumidor, em caso de superendividamento do consumidor pessoa natural, incluirá a data a partir da qual será providenciada a exclusão do consumidor de bancos de dados e de cadastros de inadimplentes, bem como o condicionamento de seus efeitos à abstenção, pelo consumidor, de condutas que importem no agravamento de sua situação de superendividamento, especialmente a de contrair novas dívidas."

GARANTIA DE UM VALOR MÍNIMO DE EXISTENCIAL

O endividamento pode comprometer grande parte da renda do endividado, impactando profundamente o modo de vida das pessoas, que veem o salário ir pelo ralo para pagar as contas.

O agravo desta situação estava totalmente contra o princípio da Dignidade da Pessoa Humana (prevista no art.1, inciso III da CF/88). Observa que esta situação crítica está voltada em uma pessoa que somente labora para remunerar seus credores, sem se aproveitar do salário de seu ofício.

Pensando nisto, que a lei do Superendividamento exige que na sentença de homologação seja estipulado um valor de "mínimo existencial", a qual este valor se dará por uma porcentagem da renda do consumidor e não pode ser contraído novas dividas em cima desta porcentagem.

Não há previsão da porcentagem, pois o texto que estipulava 30% do rendimento do inadimplente foi vetado, então o juiz deve analisar cada caso e estabelecer o mínimo.

Gabriel Martins Peixinho

Gabriel Martins Peixinho

Advogado que atua na área do Direito do Consumidor, Civil e Criminal.

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