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Tecnologia, pandemia e direito processual do trabalho

A tecnologia favorece a celeridade sem ferir o devido processo legal, mas também defronta com mazelas como: resistência de magistrados, servidores e oficiais de justiça, assim como a de condutas ao menos imorais por parte de advogados.

quinta-feira, 11 de novembro de 2021

Atualizado às 09:13

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

O ano de 2020 ficará marcado na memória de todos os brasileiros principalmente em decorrência da chegada da pandemia, COVID19, no território pátrio de maneira avassaladora, porém os efeitos trazidos vão muito além dos aspectos de saúde perpassam por: comportamentos políticos, divisões sociais, baixo padrão cultural, baixa estima e a falta de perspectiva de vida contribuindo para que uma parcela gigantesca da sociedade banalizasse ou minimizasse extremamente o vírus e suas consequências.

Este estudo tem como pano de fundo o cenário supracitado, mas seu objetivo é discutir como no meio deste "novo normal", a justiça do trabalho teve que se adaptar para que os processos simplesmente não parassem, o Estado Democrático de Direito estagnasse e a barbárie tomasse conta das relações trabalhistas, as quais, diga-se de   passagem, ficaram em estado de ebulição contínua durante todo o período.

Vive-se na chamada terceira Revolução Industrial, da tecnologia da informação e comunicação, de forma que o incremento tecnológico no direito processual se tornou imperativo e como não poderia deixar de ser, trouxe em anexo benefícios e malefícios no cotidiano dos operadores do direito que militam na seara trabalhista.

Assim, busca-se avaliar como a adaptação ao rito imposto com uso do CPC (BRASIL 2015), o Ato da Corregedoria Regional em particular o nº 21, de 27 de abril de 2020, do TRT5 e o Ato nº 11, de 23 de abril de 2020 da Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho, pois estes foram os pilares de funcionamento da Justiça do Trabalho durante este período, contribuíram para o prosseguimento do feito e o devido processo legal.

Aborda-se, em conjunto como na realidade prática, situações variadas atrapalham ou colaboram no fazer cotiando, desde as dificuldades em manuseio com a tecnologia, a baixa qualidade da internet no Brasil, no tocante ao sinal, fazendo com que advogados se afastassem, ainda mais, da Justiça do Trabalho e também como em outros aspectos facilitou o labor dos advogados, possibilitado pelas audiências telepresenciais evitando deslocamento, congestionamento no trânsito, estacionamentos e esperas intermináveis para realização de uma simples audiência inicial, a qual em contexto real, na maioria das vezes, são infrutíferas e duram pouquíssimo tempo.

Salienta-se, mesmo que em apertada síntese, como alguns juízes são resistentes ao uso da tecnologia, atrapalhando significativamente o prosseguimento do feito e como a interpretação ipsis litteris, diria tendenciosa, do Ato Normativo Conjunto n° 20, de 29 de setembro de 2020, TJBA, pelos oficiais de justiça travaram o processo no tocante a entrega das notificações, assim como no momento da execução e como o TRT5, em face de recurso que inviabiliza ou retarda ao máximo o direito de defesa e do contraditório, em ato inconstitucional.

Por fim, apresenta-se a discussão sobre quais procedimentos espera-se que façam parte do cotidiano da Justiça do Trabalho, após período pandêmico, uma vez que trouxe possibilidades reais no tocante a aplicação dos princípios da celeridade e economia processual, contribuindo para o descongestionamento nos trâmites processuais.

É de amplo conhecimento para todos que laboram na Justiça do Trabalho que o CPC, Código de Processo Civil - lei 13.105/15, tem seu uso de forma subsidiária e supletiva, naquilo que a CLT (Consolidação das Leis Trabalhista), Decreto-Lei 5.452/43, for omissa ou incompleta (vide o artigo 769 do próprio dispositivo legal).

Diante deste mandamento e com a necessidade de readaptação decorrente da impossibilidade de manutenção das audiências presenciais, fez-se uso da aplicação supletiva do CPC, dada a sua completa compatibilidade neste contexto. Muitas audiências inaugurais simplesmente deixaram de existir, pois no corpo da intimação passou a existir determinação para o reclamado apresentar defesa no prazo de 15 (quinze) dias sob pena de revelia e confissão ficta, ou seja, obedecendo ao artigo 335 do CPC.

A partir de então, são abertos prazos para manifestação do reclamante a respeito das preliminares, prejudiciais de mérito e demais documentos, pois alguns juízes de forma aleatória aplicam 5 (cinco), 10 (dez) e 15(quinze) dias, coisas do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª região (TRT5). Porém, tal procedimento contribuiu para certa vantagem ou reequilíbrio em relação ao reclamante no tocante aos processos do rito sumaríssimo, previstos no artigo 852-A da CLT, durante a audiência, a qual obrigatoriamente é Una.

Sabe-se que nestes processos, os quais os valores não ultrapassam 40 (quarenta) salários mínimos, o reclamado geralmente deixa para fazer a juntada da contestação e demais documentos minutos antes da audiência, pelo sistema PJE, pois no artigo 847 da CLT no seu Parágrafo único permite que a contestação seja juntada até a audiência.

Dessa forma, o patrono do reclamante, caso exista, pois se sabe, também, que o empregado pode fazer uso do jus postulandi, teria apenas 20 (vinte) minutos para defesa oral, inteligência do artigo 847 da CLT. Com essa nova estrutura, esse prazo deixou de existir, de maneira que a análise do aduzido na contestação e demais documentos possa, e deva ser, mais cuidadosa. Reitera que tal situação é muito mais justa para o hipossuficiente empregado/reclamante, uma vez que um dos pilares da Justiça do Trabalho é a busca da verdade real, não cabendo a impugnação genérica, sendo imperativo a análise criteriosa de cada um dos documentos apresentados.

No contexto prático, as audiências com o magistrado têm ocorrido de fato somente quando da necessidade de oitiva das testemunhas e o procedimento tem sido no seguinte sentido:

  1. Inexistência da audiência inaugural, com fulcro na Resolução nº 314 do Conselho Nacional de Justiça em consonância com o artigo 6º do Ato nº 11 do Tribunal Superior do Trabalho, c/c Ato GP/TRT5 nº 06 de 06 abril de 2020, art. 6º, ainda, o CR TRT5 21, de 27/04/2020, art. 3º, §2º, alicerçado no art. 335, do CPC, aplicado supletivamente com supedâneo no art. 769, da CLT.
  2. Intimação da parte reclamada para no prazo de 15 dias, juntar contestação bem como para apresentar proposta conciliatória, sob pena de aplicação da revelia e suas consequências.
  3. Juntada a peça de oposição e demais documentos. Abre-se prazo para o reclamante manifestar-se sobre as preliminares, prejudiciais de mérito e documentos, período que tem variado no TRT5, entre 5 (cinco) e 15 (quinze) dias.
  4. Novos prazos para as partes especificar as provas que pretendem produzir, sua pertinência e finalidade, bem como se manifestar sobre a possibilidade de acordo e de realização da prova oral de forma telepresencial (videoconferência), com base no Ato nº 21, do TRT5.
  5. Necessidade apresentada e aceita pelo juízo de primeira instância, entra-se na fila para marcação da audiência telepresencial;
  6. Não havendo novas provas a serem produzidas e testemunhas arroladas, já com tema específico e deferido pelo juízo, fica-se concluso para sentença.

No primeiro olhar, existe uma lógica singular e que deveria ser aceita por todos, porém em uma ótica mais apurada, ficar ao encargo do magistrado entender se a oitiva da testemunha é necessária ou não, estar-se-á cerceando o direito de defesa e do contraditório e prejudicando mortalmente as argumentações/razões possíveis em caso da necessidade de um recurso ordinário ou de revista.

Não à toa, está sendo cada vez mais comum o uso de recursos ordinários com objetivo específico de nulidade do ato processual, por negatória da oitiva das testemunhas, de forma a sobrecarregar o judiciário trabalhista, tornando-se contraproducente, oneroso ao Estado e essencialmente prejudicial, ainda mais ao empregado/reclamante com a morosidade da decisão final. 

Wilton Silva Oliveira

Wilton Silva Oliveira

Bacharel em Direito, UNYAHNA, 2016. Especialista em Direito do Trabalho Material e Processual, FAEL, 2018. Especialista em Direito Civil Teoria Geral e Contratos, FAMEESP, 2020.

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