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Atos de improbidade administrativa que violam os princípios da administração pública

As alterações da lei 14.230/21 e sua incompatibilidade com a Constituição Federal.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

Atualizado às 08:56

(Imagem: Arte Migalhas)

1 ASPECTOS INTRODUTÓRIOS

A lei 14.230/21, com vigência a partir de 26 de outubro de 2021 (data da sua publicação), promoveu importantes alterações na leiº 8.429/92, que dispõe sobre as sanções aplicáveis em razão da prática de atos de improbidade administrativa, tratados no artigo 37, parágrafo 4º, da Constituição Federal. 

As normas contidas na citada lei modificaram, de maneira quantitativa e qualitativa, o sistema jurídico de proteção da probidade administrativa até então vigente. A alteração trouxe, em grande parte, preceitos normativos que minimizaram e retrocederam no combate à malversação do dinheiro público no País. 

Embora a nova legislação contenha regras de direito material e processual que permitem amplo e irrestrito campo para infindáveis debates doutrinários e jurisprudenciais, almeja-se, nas linhas a seguir desenvolvidas, realizar uma breve abordagem da alteração do artigo 11, caput, da antiga pela 8.429/92, com a nova redação dada pela lei 14.230/21, e sua correspondente compatibilidade ou não com a Constituição Federal.

Para cumprir esse desiderato, será realizada breve abordagem da probidade e moralidade administrativa na Constituição Federal para, em seguida, efetivar-se o cotejo da alteração legislativa do artigo 11, da lei 8.429/92, com a redação dada pela lei 14.230/21, frente aos princípios e regras constitucionais. No último tópico, serão expostas as conclusões do estudo proposto.

2 BREVES CONSIDERAÇÕES DO REGIME DE PROBIDADE ADMINISTRATIVA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL  

O artigo 1º, da Constituição Federal, estabelece um conjunto de fundamentos em que se assenta a República Federativa do Brasil, entre os quais têm proeminência o resguardo da dignidade da pessoa humana.

Em seu artigo 3º, elenca alguns objetivos fundamentais dos "poderes" da União (Executivo, Legislativo e Judiciário), que são a construção de uma sociedade livre, justa e solidária (I); garantia do desenvolvimento nacional (II); erradicação da pobreza e marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais (III); promoção do bem de todos, sem preconceitos e discriminação (IV).

 Além de uma gama de princípios individuais e sociais exaustivamente delineados nos artigos 5º e 6º, ambos da Constituição Federal, também não se excluiu o resguardo dos direitos e garantias decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou de tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte (artigo 5º, parágrafo 2º, da Constituição Federal). 

Para que União, Estados, Municípios e Distrito Federal pudessem cumprir, cada qual no âmbito de suas determinações constitucionais, com as prestações públicas fundamentais garantidas nos artigos 5º e 6º, ambos da Constituição Federal, acometeram-se inúmeros instrumentos de controle da gestão pública ("v.g.", ação popular; Tribunais de Contas; Ministério Público, etc), e deveres de fiscalização, interna e externa, dos comportamentos ímprobos de agentes públicos e políticos de cada ente federado. 

Sendo o exercício do poder político uma das mais elementares e indispensáveis consagrações de um Estado Democrático de Direito, a Constituição Federal vedou sua cassação, salvo nas restritas hipóteses de perda ou de suspensão, em que se dará, entre outras, com a prática do ato de improbidade administrativa (artigo 37, parágrafo 4º, da Constituição Federal).

No artigo 23, delimitou-se a competência comum dos entes Federados. Dentre elas, consta o dever de zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e de conservar o patrimônio público.

No artigo 37, caput, da Constituição Federal, determinou-se que a Administração Pública Direta ou Indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerão os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

Além de inúmeros instrumentos jurídicos de contenção e limite de atuação do agente público expressamente consagrados no texto constitucional, bem como nas competências e atribuições estabelecidas na Constituição Federal para salvaguarda do patrimônio público, também nela se delineou o ato de improbidade administrativa, cominando, de forma expressa, algumas sanções a que estariam submetidos os agentes ímprobos e desonestos, tais como a suspensão de direitos políticos, perda das funções públicas e indisponibilidade de bens, além do necessário dever de ressarcimento ao erário, nos termos do artigo 37, parágrafo 4º, da Constituição Federal.

Percebe-se, assim, que muito embora não seja comum o legislador constituinte indicar as espécies de sanções aplicáveis a determinado ato ilícito, a proeminência dos bens jurídicos resguardados motivaram sua predefinição.

Renato de Lima Castro

Renato de Lima Castro

Mestre em Direito Penal pela Universidade Estadual de Maringá. Pós-graduado em Direito Penal e Econômico e Europeu. Ex procurador do Estado do Paraná. Promotor de Justiça do Estado do Paraná e Coordenador do Grupo Especializado na Proteção do Patrimônio e no Combate à Improbidade Administrativa - Núcleo Londrina.

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