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O grande desafio de gestão do sistema OAB em relação a advocacia

A ordem dos advogados do Brasil no momento pós-eleitoral interno e ambiente de atuação da advocacia no país durante a pandemia da Covid-19.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Atualizado em 9 de fevereiro de 2022 09:37

(Imagem: Arte Migalhas)

Findo o período eleitoral interno da OAB tanto nas seccionais, quanto no Conselho Federal, começamos um novo ciclo, o ano judiciário já teve seu "start" dado no último dia 01/02 pelo Ministro Luiz Fux destacou que o STF terá seu foco em temas voltados para a "estabilidade" social e econômica. No âmbito administrativo, a Corte se prepara para lançar o programa Corte Aberta, para estruturar e disponibilizar dados públicos sobre a atuação do Supremo. E nos chama especial atenção no seu discurso o trecho onde diz:

"Por essa razão, a pauta de julgamentos do Supremo Tribunal Federal, neste primeiro semestre de 2022, continuará dedicada às agendas da estabilidade democrática e da preservação das instituições políticas do país; da revitalização econômica e da proteção das relações contratuais e de trabalho; da moralidade administrativa; e da concretização da saúde pública e dos direitos humanos afetados pela pandemia, especialmente em prol dos mais marginalizados sob o prisma social".

A partir dessa perspectiva, lanço o olhar para advocacia, pois a pandemia gerou para além das dificuldades de saúde, um dos maiores desafios para advocacia moderna dos últimos tempos, se manter atuante em meio a medidas sanitárias, fóruns fechados, infectados faltosos nas repartições, e atos administrativos variados dos 27 tribunais estaduais, com suspensões de prazo, e retomadas de contagens que inclusive tornaram a contagem de prazo um desafio lógico-matemático, até para o próprio PJe, que aqui e acolá derrapou na contagem de prazos.

Todavia, para além de todos esses problemas práticos temos um bem maior, gerado pela falta de fiscalização da OAB em relação as leis que envolvem procedimentos, principalmente os da lei 11.419/06 que trata do Processo Judicial Eletrônico.  Pois segundo este diploma deveria ser efetivado o processo judicial eletrônico no âmbito do processo civil, penal, e trabalhista, conforme §1º Art.1º da referida lei.

No entanto, ao longo dos último 15 anos quase nenhum esforço houve sobre o tema de digitalização do processo penal, o que gerou um impacto imenso a ampla defesa e contraditório (Inciso LV do Artigo 5º da Constituição), pois com muitos fóruns fechados, e a determinação do CNJ que os atos judiciais ocorressem preferencialmente por meio eletrônico no PJe, ato contínuo foi criado o ambiente de videoconferência do judiciário através da plataforma Cisco Webex, todas iniciativas muito bem-vindas pela advocacia. Todavia fica aqui a questão, e os processos que não estavam digitalizados no advento da pandemia? Como advogar sem acesso aos autos? Essa questão a mim parece passou ao largo do sistema OAB.

As seccionais da OAB cada uma lançou mão de estratégias totalmente diferentes, mas todas sem exceção tiveram que agir na omissão do poder judiciário, que não digitalizou os processos que já deveriam estar digitalizados a mais de uma década. Essa situação jamais imaginada que vivenciamos, fez materializar pela omissão dos diversos responsáveis um nefasto "isolamento processual", que não permitiu acesso das partes, e dos advogados aos feitos, tornou a produção de provas irrepetíveis prejudicada, ferindo de morte o direito ao devido processo legal.

E me preocupa muito em meio as muitas cerimônias de posse os discursos dos dirigentes da OAB que ressaltam que "(...)caminham na mesma direção do tribunal na garantia do acesso a justiça", pois, os advogados e advogadas que tem sob sua responsabilidade processos físicos em pleno século XXI, são duplamente guerreiros, pois lutam o bom combate, a custa de muito esforço físico nos balcões dos cartórios judiciais, e também no manejo de autos muitas vezes volumosos em causas penais, isso se tiverem acesso a esses autos, e a miopia está aí! Existe uma parte representativa da advocacia que não está conseguindo acessar os autos processuais para trabalhar, o que viola as prerrogativas das mais básicas da advocacia do art.7º do Estatuto da Advocacia, como de ter acesso aos autos, despachar diretamente com magistrado, e acessar livremente qualquer edifício onde funcione repartição em que precise lá exercer a advocacia.

O que assusta é a falta de urgência em dar uma solução para essa situação, pois a Ordem via CNJ quer ter acesso aos fóruns conforme notícia recente, e o que nós precisamos é acesso aos autos, é paridade de armas, e razoável duração do processo, tudo que nos foi subtraído de forma repentina durante a pandemia, e até a presente data não nos foi devolvido, principalmente os que tem processos físicos sob sua responsabilidade. E aqui cabe um lembrete, não é só na área penal que padece dessa agrura, temos igual realidade em muitas sucessões, processos de cumprimento de sentenças antigos, execuções, apenas para fazer referências a algumas modalidades e ramos de atuação que passam por essa difícil realidade, que parece só ser percebida por quem a vive.

Para além, há também uma faceta que ninguém fala, e aqui quero lançar luzes, que é a própria dignidade da advocacia, pois alguns de nós advogados temos virado um balcão de reclamações dos clientes e do jurisdicionado, em razão da impossibilidade de atuar, em razão as restrições do Covid-19 somadas ao descumprimento da lei 11.149/06, enquanto escutamos que estão trabalhando para solução desse problema.

Ocorre que, no atual cenário o Sistema OAB através de seus gestores estaduais e nacional, tem nesse panorama o seu maior desafio, que é devolver a advocacia a sua dignidade através da efetividade das prerrogativas, e não só pelo que advocacia representa, mas pelo papel que a advocacia representa para sociedade para efetivação dos direitos do cidadão. Chegou a hora de não mais agir apenas de forma a reprimir os violadores das prerrogativas, há sim que prevenir a violação, com efetiva atuação institucional perante todos os locais onde a advocacia exercer seu mister. Chega de desalento, e burocracia, diplomacia institucional através de notas de repúdio e ofícios, o que escuto diariamente de meus alunos, ex-estagiários e colegas, e um só desejo, respeito a advocacia, que é o mesmo de dizer, respeito a constituição. Pois assim juramos "Prometo exercer a advocacia com dignidade e independência, observar a ética, os deveres e prerrogativas profissionais e defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado Democrático, os direitos humanos, a justiça social, a boa aplicação das leis, a rápida administração da justiça e o aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas.", que seja esse o norte de todos nós.

Andre Luiz B Canuto

VIP Andre Luiz B Canuto

Advogado e Professor, Mestre em Direito Penal - especializado em crimes financeiros de competência da justiça federal, direito penal médico, e Planejamento Sucessório.

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