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TJ/SP autoriza a inclusão de sócio unipessoal no polo passivo de execução devido à desídia na transformação societária da empresa

Raphael Roque

A negligência do sócio unipessoal/remanescente em proceder com o ajuste do tipo societário perante os órgãos competentes poderá, e deverá ser considerado como abuso da personalidade jurídica.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

Atualizado às 08:52

 (Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

Em incidente de cumprimento de sentença em trâmite perante a 15ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo/SP, após a realização de diversas medidas constritivas infrutíferas pelo exequente, foi requerida a inclusão de sócia unipessoal da empresa devedora no polo passivo da execução. 

Na ocasião o exequente sustentou que, porquanto tratar-se de empresa individual, a autonomia patrimonial inexiste, sendo medida que se impõe a inclusão de sua única sócia/administradora como executada na ação, com a imediata determinação de pesquisas de valores e veículos via sistema SISBAJUD e RENAJUD, e demais bens via INFOJUD, bem como sua inclusão nos órgãos de cadastro de inadimplentes, conforme preceitua o artigo 782, § 3º, do Código de Processo Civil. 

O referido pedido foi integralmente deferido pelo juízo, sob o fundamento de que a desídia na transformação societária da empresa caracteriza o abuso de personalidade jurídica, previsto no artigo 50, do Código Civil, autorizando, por corolário, a responsabilização ilimitada do sócio pelas obrigações assumidas em nome da pessoa jurídica, in verbis: 

"O pedido comporta deferimento.

Com efeito, conforme pontuado, a jurisprudência em casos como esse entende que não há necessidade de desconsideração da personalidade jurídica para inclusão do sócio no polo passivo.

Considerando que a empresa executada permaneceu unipessoal por mais de 180 dias e, não havendo a transformação da sociedade em empresário individual ou empresa individual de responsabilidade limitada, fica caracterizada o abuso de personalidade jurídica e a consequente responsabilidade ilimitada do sócio remanescente, conforme precedentes desse Egrégio Tribunal (...).

Assim, considerando que a empresa executada é unipessoal (fls. 213/214), defiro a inclusão da sócia no polo passivo."

Merece destaque o fato de, inobstante a determinação de citação da sócia em observância ao contraditório e ampla defesa, a inclusão, bem como o reconhecimento do abuso ter ocorrido sem a necessidade de instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica. 

Notadamente, anteriormente à lei 12.441/11, revogada pela Medida Provisória 1.085/21, a qual instituiu a constituição de empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI) mediante a inclusão do Título I-A na Lei nº 10.406/02, pouco havia a ser feito relativamente à separação de patrimônio entre sócio e empresa individual, diferentemente das sociedades limitadas. 

O dispositivo no códex civil que dispõe acerca da limitação de responsabilidade dos sócios é de clareza solar: 

"Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social." 

Todavia, o artigo 1.033, inciso IV, do Código Civil, revogado pela lei 14.195/21, alertava para a dissolução da sociedade quando da falta de pluralidade de sócios não houvesse sua recomposição no prazo de 180 (cento e oitenta) dias. 

Advém que, com a edição da lei 13.874/19, popularmente conhecida como Lei da Liberdade Econômica, o capítulo do Código Civil que tratava da sociedade limitada foi substancialmente alterado com a introdução do § 1º, do artigo 1.052, ao prever a possibilidade de a sociedade limitada ser constituída por apenas 1 (uma) pessoa. 

Verifica-se, portanto que, ante as alternativas previstas na legislação, para regularização e transformação da pessoa jurídica, a negligência do sócio unipessoal/remanescente em proceder com o ajuste do tipo societário perante os órgãos competentes poderá, e deverá ser considerado como abuso da personalidade jurídica. 

Isso porque, tal como no caso em tela, em que há o transcurso de mais de 6 (seis) meses sem a tomada de providências pelo responsável legal da empresa, configurar-se-á a nítida utilização da personalidade jurídica como forma de blindagem ilegal do sócio na tentativa de se esquivar das dívidas e demais obrigações contraídas pela pessoa jurídica enquanto regulamente constituída como sociedade, sendo, por conseguinte, mister a inclusão do sócio nos autos da execução, a fim de responder pelo inadimplemento com seus bens pessoais, com a persecução através de todos os mecanismos previstos na legislação processual civil para o pagamento do quantum debeatur, proporcionando, destarte, a efetividade do processo de execução tão pretendido pelos jurisdicionados ao apresentar/obter um título executivo junto ao Poder Judiciário.

Raphael Roque

Raphael Roque

Advogado do escritório CMMM - Carmona Maya, Martins e Medeiros Advogados.

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