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O papel do ESG no desenvolvimento da empresa

Certas práticas empresariais se tornaram inadiáveis com o avanço de uma nova leitura sobre o papel da empresa na sociedade.

terça-feira, 12 de abril de 2022

Atualizado às 09:38

(Imagem: Arte Migalhas)

Embora não seja algo novo, tendo seu primeiro registro oficial em 2004 no relatório "Who Cares, Wins", das Nações Unidas, o termo ESG (Environmental, Social and Corporate Governance) vem ganhando cada vez mais preponderância no panorama empresarial do que se espera de administradores, não apenas em relação às atividades econômicas que desempenham, mas também a responsabilidade social, ambiental e corporativa que passam a ser inerentes ao crescimento financeiro do negócio1.

Trata-se de uma forma de prestar responsabilidade ao mercado que atuam e, de maneira mais ampla, aos stakeholders: consumidores, fornecedores, colaboradores, investidores, mas também e em mesma medida, à sociedade e ao meio ambiente. Em outras palavras, a empresa passa a adotar uma postura de que não é apenas uma organização econômica, mas também uma agente de mudanças na comunidade e no mundo.

Os três eixos constitutivos da sigla antes poderiam ser tidos como antagônicos, mas agora são integrados à gestão dos negócios, a ponto de que a decisão sobre um não possa ser tomada sem a avaliação e consideração dos demais. No Direito, seu âmbito abrange quase todas as esferas jurídicas, haja vista cláusulas ambientais, sociais e de governança nos contratos, acordos, regulamentos e declarações públicas2.

Inclusive, é da essência do ESG o trabalho multidisciplinar, que implica desde a atuação consultiva até o envolvimento contencioso, com equipes de societário, contratos, trabalhista, tributário, cível, proteção de dados e compliance, unidas na consecução de objetivos comuns.

Aliás, neste ponto, não deve ser confundida com o último3: enquanto o Compliance examina aspectos ligados à conformidades, buscando sancionar erros, cumprir regulações, aperfeiçoar processos, sancionar e dissuadir condutas, as práticas ESG olham primordialmente para o futuro, formulando e fomentando práticas com medidas específicas, a longo prazo. No Compliance, autoridades e organismos reguladores são vistos tecnicamente como opositores da corporação diante do seu projeto de crescimento, enquanto no processo ESG eles passam a ser aliados4.

Muitas questões levantadas no âmbito ESG nem ao menos trazem violações legais, mas podem ter grandes repercussões na forma com que a sociedade, clientes e o poder público enxergam determinada empresa, o que na prática leva a uma importância na leitura de cenários pelo líder empresarial na adaptação a estas questões5. Soma-se a esse elemento a chegada das redes sociais como fatores dissuasórios no comportamento público das empresas.

Sobre tal aspecto, não raro ocorrem incidentes em espaços virtuais que põem à prova os princípios ESG, levando os mais descuidados a certos pedidos de desculpas, reformulação emergencial de políticas internas e sujeição à procedimentos administrativos do Ministério Público. Ou seja, é um termo que mesmo não estando disseminado na consciência coletiva, vem testando cotidianamente a resiliência das empresas na manutenção de sua imagem6.

O resultado da sua inobservância costuma também gerar animosidade entre a clientela de determinada marca, com perda do faturamento pela mácula a sua imagem no mercado, junto com a perda de patrocinadores, que podem rescindir unilateralmente seus contratos caso existam previsões com esse permissivo.

Tal impacto na reputação pode atingir até o valor de mercado da empresa (prejudicando investidores), a percepção do consumidor ao escolher a marca, dificuldades de atração e retenção de talentos, acesso a crédito (instituições financeiras internacionais já começam a condicionar serviços a certos marcos de ESG), acesso a contratos com o poder público, entre outros efeitos. Nesse contexto, é sintomático que eventualmente surja a judicialização de certos eventos, tanto na relação investidor-empresa, quanto na relação empresa-empresa (cadeias de fornecimento e parceiros) e empresa-sociedade (consumidor, coletividade, meio ambiente)7.

Ou seja, no momento atual a luta também está na conscientização de que ESG atende, sim, os melhores interesses dos stakeholders e que, a longo prazo, não há perda de rentabilidade nem descapitalização desnecessária. Ao contrário, ganha-se credibilidade em atender ao apelo global para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente, o clima, os princípios humanos e se aliar aos cidadãos na busca de paz e justiça social. Em suma, é uma construção típica das democracias ocidentais que vem ganhando espaço no debate público e precisa ser incorporada pelos fatos já expostos.

Além disso, em um ordenamento jurídico como o brasileiro, onde há uma crescente adoção das formas de responsabilidade civil baseadas no risco e alta volatilidade jurisprudencial, a adoção de práticas ESG, embora não obrigatória, institui um dever geral de cuidado que não pode passar despercebido pelo administrador mais prudente com seu negócio8.

___________

1 https://www.ifc.org/wps/wcm/connect/topics_ext_content/ifc_external_corporate_site/sustainability-at-ifc/publications/publications_report_whocareswins__wci__1319579355342. Acesso em abr.2022.

2 ESG se incorpora a todas as áreas do Direito, afirma Yun Ki Lee. Acesso em abr.2022.

Idem.

4 https://codigoconduta.com/2021/08/16/doses-de-esg-diferencas-entre-compliance-e-esg/. Acesso em abr.2022.

Idem.

6 https://envolverde.com.br/presenca-do-tema-esg-nos-perfis-das-redes-sociais-mostra-gargalos-e-tropecos-das-empresas-no-tratamento-dos-temas/. Acesso em abr.2022.

7 https://direitoambiental.com/esg-e-bioeconomia-como-e-quando-estas-duas-expressoes-se-conjugam/. Acesso em abr.2022.

8 Idem.

Leonardo Relvas Rodrigues Pinto

Leonardo Relvas Rodrigues Pinto

Brasileiro, advogado, componente do corpo do escritório Pietniczka & Advogados. Formado em Direito pelo Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec/RJ). Pós-Graduado em Ciências Criminais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Pós-Graduando em Direito Societário e Contratos Empresariais pela PUC-PR; possui qualificações em Direito Imobiliário e Contratual pela FGV.

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