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A modulação dos efeitos da decisão proferida pelo Plenário do STF no tema n. 962 e a discriminação dos contribuintes em três classes: total ausência de excepcional interesse social

Cláudio Tessari e Camila Bandel

A decisão do julgamento de mérito do tema n. 962 com repercussão geral encerrou (virtual) no dia 24/09/21, sendo que o acórdão foi publicado no DJe em 16/12/21. Complementando tal julgado, a decisão referente a modulação dos efeitos no tempo encerrou o julgamento (virtual) em 29/04/22, por meio dos EDs opostos pelo Ente Tributante.

terça-feira, 17 de maio de 2022

Atualizado às 13:39

A decisão do julgamento de mérito do tema n. 962 com repercussão geral encerrou (virtual) no dia 24/9/21, sendo que o acórdão foi publicado no DJe em 16/12/21. Complementando tal julgado, a decisão referente a modulação dos efeitos no tempo encerrou o julgamento (virtual) em 29/4/22, por meio dos EDs opostos pelo ente tributante.

Insta destacar, de imediato, que a discussão neste processo limitou-se "a tese de repercussão geral" no sentido de que "é inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores atinentes à taxa SELIC" quando " recebidos em razão de repetição de indébito tributário", afastando-se, assim, toda e qualquer outra discussão que não a tributária.

A digressão do relator, ministro Dias Toffoli, bem expos as razões de mérito da temática, inclusive, pontuou - relacionou as razões de julgar - de outro julgamento: tema n. 808 que fixou a tese no sentido de que "não incide imposto de renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função", o qual transitou em julgado - recentemente - em 9/10/21.

Diferentemente do tema ora em análise (962), que teve seus efeitos modulados, no julgamento do tema n. 808 não foi acolhido o "pedido de modulação de efeitos" já que, no entendimento do STF, "o plenário da Corte enfrentou adequadamente todos os pontos colocados em debate, nos limites necessários ao deslinde do feito".

A discussão sobre a constitucionalidade da incidência de IRPJ e CSLL na repetição de indébito tributário (seja por compensação ou não) foi levada a efeito com a presunção de acréscimo patrimonial, na medida em que se entendia que o valor pago, a ser repetido, deveria, em tese, ser aplicado pela empresa.

Assim, para que o valor pago indevidamente pelo contribuinte, a ser repetido, fosse considerado acréscimo patrimonial todas as pessoas jurídicas deveriam aplicar tal quantia, o que como exposto no referido acórdão que julgou os EDS e modulou os efeitos do julgado, não espelha a realidade, que massiçamente é rechaçada com o endividamento que se constata na prática empresarial.1

O relator bem concluiu: "pode ser que a restituição de indébito tributário tenha representado para a pessoa jurídica não um lucro maior, mas simplesmente um prejuízo menor, o qual não se submete ao imposto de renda ou à CSLL, ou, ainda, que o tributo pago indevidamente não tenha sido computado como despesa dedutível do IRPJ ou da CSLL".

Inexistindo a comprovação técnica, ou, mesmo, matemática - na prática -, não há uma riqueza nova passível de soma ao patrimônio preexistente do contribuinte. Há simplesmente a recomposição da perda, que sequer alcança o índice da inflação, ou seja, inexiste ganho novo.

Diante de tal realidade fática e jurídica, é que, então, fixou-se a referida tese n. 962. Ato contínuo, em sede de embargos de declaração, pleiteou-se a modulação dos efeitos, que, como defendido por esses autores em outro artigo - publicado recentemente nesse periódico sob o título "razões para não modular os efeitos da decisão do STF no RE 1.063.187-SC - tema 962" -, se deve ter por regra a atenção e aplicação efetiva da segurança jurídica e do excepcional interesse social. Contudo, surpreendentemente, o julgamento dos referidos EDs, com a modulação dos efeitos, tratou, apenas,  de diferenciar, afastar a isonomia, entre os contribuintes, criando três faixas:

(i) a inconstitucionalidade, seria ex nunc, a todos os contribuintes após a publicação do julgamento de mérito, em 30/9/21;

(ii) repetição (compensação) aos contribuintes que até a data do inicio do julgamento de mérito teriam ajuizado as respectivas ações sobre ao que aqui se discute;

(iii) os contribuintes que estavam em débito estariam dispensados de qualquer cobrança a título desses tributos.

Em realidade, o objetivo de fixar tais parâmetros foi o de prestigiar aqueles que já haviam ingressado com ação até a referida data não sendo ressalvadas as ações ajuizadas após tal marco temporal.

Ainda nesse contexto, cumpre realçar trecho do voto do relator para justificar a referida modulação no sentido de que  "o movimento de judicialização visando-se, principalmente, a recuperação dos valores pagos a título das tributações declaradas inconstitucionais muito se intensificou durante o próprio julgamento do mérito do presente tema. A proposta de modulação sugerida visa a combater tal espécie de corrida ao Poder Judiciário, a qual me parece muito prejudicial, considerando as citadas particularidades do presente tema e o contexto econômico-social no qual se encontra o País"

Com esse fim, esdruxulamente afastou-se toda e qualquer possibilidade de discussão sobre as razões legais da verdadeira modulação de efeitos no tempo das ações constitucionais julgadas pelo STF, quais seriam: a efetiva segurança jurídica e as reais razões de excepcional interesse social.

Ainda que, em dado momento tenha sido observado o julgamento exarado pelo STJ no REsp 1.138.695/SC, que fixou em tema repetitivo 505 a tese no sentido de que "quanto aos juros incidentes na repetição do indébito tributário, inobstante a constatação de se tratarem de juros moratórios, se encontram dentro da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, dada a sua natureza de lucros cessantes, compondo o lucro operacional da empresa", a segurança jurídica ali posta não se fazia suficiente para di(e)scriminar os contribuintes em três classes.

Não há dúvida de que esse precedente específico, proferido há quase nove anos, estabeleceu legítima confiança, em prol da Fazenda, de que as tributações em questão eram válidas, mas e as razões de excepcional interesse, onde estariam postas?

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1 https://veja.abril.com.br/economia/seis-em-cada-dez-empresas-fecham-em-cinco-anos-de-atividade-aponta-ibge/

Cláudio Tessari

Cláudio Tessari

Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS. Mestre em Direito pela UniRitter Laureate International Universities. Especialista em Gestão de Tributos e Planejamento Tributário Estratégico pela PUCRS.

Camila Bandel

Camila Bandel

Advogada, Pós-graduada em direito tributário.

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