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Guarda compartilhada ou guarda alternada - o que diz a legislação vigente

Leonardo Costa Ramos

Não importa o regime jurídico adotado, para além da vontade dos pais o que deve ser priorizado é o bem-estar físico e emocional das crianças.

quinta-feira, 21 de julho de 2022

Atualizado às 08:48

Diante da separação inevitável, o universo familiar se transforma e traz incertezas frequentes sobre a guarda dos filhos. A primeira aflição surge ao pensar em como ficará o relacionamento com as crianças, com que frequência e de que forma o contato com elas se dará e quais direitos de cada um em relação ao tema. 

O significado da palavra 'guarda', que nos remete à proteção que, em regra, os genitores, de forma conjunta ou separada, exercem sobre os filhos. A lei, por sua vez, define como a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo ao seu detentor o direito de opor-se a terceiros. Ainda, a guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários.

Pois bem, enquanto o relacionamento amoroso dos pais perdura, é fácil identificar o instituto da guarda como compartilhado, ou seja, ambos têm o dever de exercer a proteção do filho comum, decidindo, conjuntamente, as melhores opções. Mas com o fim do relacionamento dos pais e, principalmente, quando há o rompimento do chamado 'lar da família' e, por consequência, do convívio diário com os filhos, as coisas se complicam. Contudo, mesmo quando os pais não estão mais convivendo com os filhos de forma diária, eles seguem com o dever de proteção da criança, pois não perderam o poder familiar. 

Hoje, o nosso ordenamento jurídico prevê apenas e tão somente duas espécies de guarda: a guarda unilateral e a guarda compartilhada, conforme disposição expressa contida no art. 1.583, do Código Civil. A leitura da legislação em vigor nos leva à inevitável conclusão de que só existem esses dois tipos de guarda, de forma expressa. Em outras palavras, não há previsão de guarda alternada em nossa legislação.

Mas, em termos práticos, o instituto da guarda refere-se à tomada de decisão das questões atinentes aos filhos. Desde a decisão de onde a criança deve estudar, a qual médico ou tratamento será submetida ou até mesmo se deve ou não se permitir que faça algo, passa pelo crivo do detentor da guarda, que também exerce um papel de fiscalização dessa atividade, sempre em busca do bem-estar da criança.

Mais adiante, o Código Civil estabelece a conceituação da guarda, considerando por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5o) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto.

Há que se desmistificar, porém, alguns pontos sobre a guarda compartilhada. Isto porque ela não significa domicílio alternado da criança, mas sim que a responsabilidade pela sua educação e seu bem-estar são de competência de ambos os pais. Na prática, a criança tem um domicílio definido - residência da mãe ou do pai, geralmente - ou seja, tem um endereço residencial para os fins de direito. Com isso, o outro genitor exercerá o regime de convivência familiar, no mais amplo espectro possível, visando a equidade de convivência da criança com ambos os genitores.

Conforme entendimento dominante do Superior Tribunal de Justiça, não é preciso haver convívio amigável entre os ex-cônjuges para que se estabeleça o compartilhamento da guarda, a fim de que o interesse da criança e do adolescente seja priorizado. O Tribunal entende que o convívio do filho com ambos os genitores é a regra, independentemente do fato de haver clima hostil entre os adultos - salvo diante da comprovação de absoluta inviabilidade. 

Em contrapartida, embora não exista previsão expressa na legislação em vigor, há diversas decisões judiciais, e até mesmo discussões doutrinárias, acerca da viabilidade da guarda alternada. Nesse caso, há uma alternância entre os genitores do exercício exclusivo da guarda jurídica e material, de modo que, enquanto a criança estiver em companhia de um dos genitores, a este caberá tomar as decisões de interesse dos filhos.

Ademais, a guarda alternada caracteriza-se pela distribuição de tempo em que a guarda deve ficar com um e com outro genitor. Por exemplo, quinze dias residindo com a genitora e os quinze dias seguintes com o genitor. Durante os períodos determinados, que podem variar, ocorre a transferência absoluta da responsabilidade em relação ao menor. Tomando por base esse exemplo, tem-se que a mãe seria a guardiã e responsável durante o período em que a prole permanece com ela, enquanto o pai seria o protetor e encarregado por todos os pontos no intervalo seguinte.

Justamente por retirar a guarda jurídica (autoridade parental) de um dos genitores por certo período, alguns juristas defendem que tal modelo não seria compatível com o direito brasileiro, por força do disposto no art. 1.634, do Código Civil, segundo o qual compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar. 

Mas o fato é que cada família deveria estabelecer, independentemente do regime de guarda escolhido, a forma que garanta maior conforto e segurança para a sua prole, levando-se em consideração a própria relação da criança com cada genitor, e baseando-se em estudos clínicos, psicológicos e psicossociais, caso haja divergência de entendimento entre os pais. Não importa o regime jurídico adotado, para além da vontade dos pais o que deve ser priorizado é o bem-estar físico e emocional das crianças.

Leonardo Costa Ramos

Leonardo Costa Ramos

Advogado e especialista em Direito de Família no Luz Moreira Advogados.

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