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Decisão do STJ promete colocar fim à fraude contra credores

O voto concluiu que o "acesso às informações do CCS serve como medida que poderá subsidiar futura constrição, alargando a margem de pesquisa por ativos. Não se mostra razoável, assim, permitir a realização de medida constritiva por meio do BacenJud e negar a pesquisa exploratória em cadastro meramente informativo, como é o caso do CCS-Bacen.

terça-feira, 26 de julho de 2022

Atualizado às 08:53

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu no dia 28/4/22, Resp 1938665/SP, de relatoria da ministra Nancy Andrighi, por unanimidade, que, em procedimentos cíveis, é possível a consulta ao Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional do Banco Central do Brasil (CCS-Bacen).

O CCS-Bacen é um sistema de informações que registra as instituições financeiras e demais entidades autorizadas pelo Banco Central com as quais o cliente possui algum relacionamento: conta corrente, poupança e investimentos.

O banco de dados mencionado contém as seguintes informações sobre o relacionamento dos clientes com as instituições do Sistema Financeiro Nacional:

  • Identificação do cliente e de seus representantes legais e procuradores;
  • Instituições financeiras nas quais o cliente mantém seus ativos e/ou investimentos;
  • Datas de início e, se houver, de fim de relacionamento.

É importante mencionar que o acesso ao sistema é feito pela internet, devido ao sigilo. Contudo, não dispõe de dados relativos a valores, movimentação financeira ou saldos de contas e aplicações.

Essa pesquisa, antes, era permitida apenas em Ações Criminais, sendo medida considerada excepcional.

No caso, o que foi questionado foi a utilização deste cadastro, como uma ferramenta para propiciar uma busca aprofundada de dados do devedor.

O CCS- Bacen conta com um grande diferencial para a satisfação de crédito: a possibilidade de encontrar procurações.

Com efeito, comumente, devedores outorgam procurações para "laranjas" a fim de continuarem fazendo todas as transações financeiras em seu próprio benefício, mas em nome de terceiro, com o intuito de ocultar tais ativos.

Os termos coloquialmente conhecidos como "laranja" ou "testa de ferro", referem-se às pessoas que fornecem seus dados pessoais para que terceiros registrem bens móveis e imóveis e até mesmo empresas.

No ordenamento jurídico brasileiro há duas espécies de fraudes: a fraude contra credores e a fraude à execução.

Para a caracterização da fraude contra credores, disposta nos arts. 158 a 165 do CC, são exigidos dois requisitos:

1- Objetivo: a diminuição patrimonial do devedor ou estado de insolvência, valor das dívidas é superior ao valor dos bens e direitos do devedor;

2- Subjetivo: intenção do devedor em provocar a redução patrimonial até o estado de insolvência, ou seja, intenção de fraudar.

Quando o ato praticado for a título gratuito o intuito em fraudar é absoluto, já nos atos onerosos não há necessidade de demonstrar a intenção em fraudar.

Contudo, é necessária a demonstração da ciência do devedor que seu ato o levaria à insolvência e que o terceiro adquirente sabia que a alienação levaria o devedor a esse estado.

Já a fraude contra credores ocorre, em regra, após haver o inadimplemento da obrigação.

Ocorre que o STJ vem relativizando tal entendimento, a Corte entende que há fraude, mesmo antes do inadimplemento, quando está se mostrar predeterminada em detrimento de futuros credores.

No caso de ocorrência desta fraude, o lesado deve ajuizar ação pauliana, que objetiva a anulação do ato cometido em fraude contra credores, art. 158 CC.

A consequência, caso evidenciada a fraude, é a anulação do negócio jurídico, ou seja, consequentemente o retorno do bem ao patrimônio daquele que fraudou, conforme disposto no art. 790, VI, CPC.

Importante destacar, que a fraude contra credores não se confunde com a fraude à execução, prevista no art. 792 do CPC.

A fraude à execução, também pode gerar prejuízo ao credor, contudo, também é tida como ato atentatório à dignidade da justiça e a consequência pode ser a aplicação de multa.

Outra diferença entre as Ações é que na Fraude à Execução é necessário que a Ação já esteja em curso e, diversamente da fraude contra credores, o ato é válido, porém ineficaz.

Na fraude à Execução basta o simples peticionamento nos autos, não sendo necessário ajuizar Ação autônoma e a intenção em fraudar é presumida, logo não é necessário comprovar o requisito subjetivo.

A fraude contra credores está disposta no Código Civil, através do art. 158:

Art. 158. Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos.

Logo, nessas fraudes os devedores encontram, de forma ilícita, meios para se desfazerem de seus bens para evitar constrições advindas de sentenças judiciais.

Caso seja evidenciada a intenção de fraude contra o credor, conforme o art. 158, "os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos."

Importante destacar de se ressaltar que mencionada medida não indica, por si só, que haverá o bloqueio, mas alarga a margem de pesquisa de bens.

O Art. 139, inciso IV do CPC, dispõe que o juiz poderá "determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária"

No Acórdão do Resp 1938665/SP, a relatora Ministra Nancy Andrighi, declarou que a possibilidade do juiz determinar medidas executivas atípicas se trata de um "instrumento importante a viabilizar a satisfação da obrigação exequenda, homenageando o princípio do resultado na execução".

Nesse sentido, o voto concluiu que o "acesso às informações do CCS serve como medida que poderá subsidiar futura constrição, alargando a margem de pesquisa por ativos. Não se mostra razoável, assim, permitir a realização de medida constritiva por meio do BacenJud e negar a pesquisa exploratória em cadastro meramente informativo, como é o caso do CCS-Bacen".

Dessa forma, não há qualquer impedimento à consulta ao CCS-Bacen nos procedimentos cíveis, devendo ser considerado como apenas mais um mecanismo à disposição do credor na busca para satisfazer o seu crédito."

Com efeito, para o juiz determinar o CCS- Bacen, após a Decisão, é possível concluir que não é preciso esgotar as buscas dos bens pelo devedor através de outras pesquisas, não sendo mais considerada como medida atípica, apenas mais um meio à disposição do Exequente para facilitar a satisfação de seu crédito.

A nova modalidade de pesquisa, apesar de não ser uma constrição imediata, é uma ferramenta muito importante para evitar fraudes e possibilitar que o Exequente receba efetivamente o que lhe é devido, um precedente muito importante e grande avanço em relação aos direitos dos credores em processos de Execução.

Aline Reis Motta

Aline Reis Motta

Advogada, especialista em Direito Civil e LGPD, pós-graduada em Direito Público e Processo Civil.

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