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Superlotação na unidade prisional plácido de sá carvalho e suas consequências internacionais

A Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 31 de agosto de 2017, solicitou ao Brasil que adotasse, de imediato, todas as medidas que fossem necessárias para proteger eficazmente a vida e a integridade física e psiquica das pessoas privadas de liberdade, no Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho

terça-feira, 11 de outubro de 2022

Atualizado às 12:52

A Unidade Prisional Plácido de Sá Carvalho, é um Instituto Penal para presos em regime semiaberto, administrado pela Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Governo do Estado do Rio de Janeiro.

No ano de 2015, 90 (noventa) presos morreram na Unidade Prisional Plácido de Sá Carvalho, muitos por problemas decorrentes da saúde e de superlotação. Segundo a decisão do CIDH, o Estado brasileiro:

"deve tomar as medidas necessárias" para que, "a partir da presente resolução, novos presos não ingressem no IPPSC". A determinação também é expressa ao "requerer ao Estado que adote imediatamente todas as medidas que sejam necessárias para proteger eficazmente a vida e a integridade pessoal de todas as pessoas privadas de liberdade no Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, bem como de qualquer pessoa que se encontre nesse estabelecimento, inclusive os agentes penitenciários, os funcionários e os visitantes".

Segundo as inspeções realizadas pelo Núcleo do Sistema Penitenciário da DPRJ, em 23 de janeiro de 2016, o Plácido de Sá Carvalho tinha capacidade para 1.699 internos, mas 3.454 pessoas se encontravam no estabelecimento. O índice de superlotação registrado na época foi de 198%.

A Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 31 de agosto de 2017, solicitou ao Brasil que adotasse, de imediato, todas as medidas que fossem necessárias para proteger eficazmente a vida e a integridade física e psiquica das pessoas privadas de liberdade, no Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, Unidade Prisional do Regime Semiaberto, localizada no Complexo Peniteniário de Bangu, no Estado do Rio de Janeiro.

O Governo do Estado do Rio de Janeiro, através da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, argumentou que a superlotação abrange todo o sistema prisional carioca.

Nesse ponto, a Secretaria Penitenciária do RJ tem razão, realmente abrange todo o sistema prisional, e que as denúncias não alcançam apenas a superlotação, mas há problemas de alimentação em péssima situação nutritiva e em estado de azedamento, fornecimento de água potável etc.

Segundo o relato dos presos e das autoridades locais, esse parecer contribuiu para a implementação da decisão no cenário local, além de destacar várias ações relevantes desenhadas na política pública judiciária que estava sendo construída, o documento parte do pressuposto de que as medidas provisórias da Corte IDH. Além disso, o parecer é ilustrativo de uma atuação comprometida com a realização de um controle de convencionalidade, vale dizer, do dever imposto a todo funcionário público para promover a aplicação da CADH segundo os parâmetros interpretativos delineados pela

O tema é relevante, importante e fere a dignidade da pessoa humana, que já foi analisada pela ADPF 370 do STF. Já discutida, mas pouco refletida no âmbito da  jurisprudência do STF, talvez pelo seu caráter inovador e, por isso mesmo, objeto de certa rejeição em razão de promover verdadeira mudança na dinâmica clássica da distribuição funcional dos poderes.

No Brasil, a categoria do estado de coisas inconstitucional, foi pela primeira vez, objeto de debate no STF, com o julgamento da polêmica medida cautelar, na ação de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), formalizada pelo PSOL, contra a União e os entes subnacionais, em que se questionavam as graves e drásticas violações, a direitos fundamentais operadas no âmbito do sistema carcerário brasileiro.

O fato é que, após o reconhecimento unânime do estado crítico do sistema penitenciário brasileiro pelos ministros do STF, e não obstante a repercussão internacional que o caso ganhou, especialmente porque passou-se a considerar que o Brasil, adotou a técnica decisória do estado de coisas inconstitucional, concedeu-se apenas parcialmente e em uma extensão menor, o pedido de medida acautelatória formulada pelo PSOL. Deferiu-se apenas o pedido "b", relativo à implementação das audiências de custódia, e o pedido "h", concernente à liberação das verbas contingenciadas do Funpen.

A dificuldade e complexidade do mundo carcerário são gigantescas, envolvem questões práticas e teóricas, empirismo funcional, individualidade, verbas maiores para implementação de medidas geométricas amplas, para alocação de pessoas sob o poder do Estado.

Especificadamente no Rio de Janeiro, local da pesquisa e foco do presente trabalho, temos uma pluralidade de problemas, não somente no Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, mas em toda a teia penitenciária carioca.

Apesar da máquina judiciária ser movimentada criminalmente, pelo elevado índice de criminalidade nesse Estado da Federação, ainda temos, prisões decretadas sem necessidade, proporcionalidade e homogeneidade, magistrados punitivistas, pouco investimento no Sistema Penitenciário, tendo em vista, que os políticos da Câmara Legislativa se movem por votos, não tendo a pasta penitenciária uma fonte de retorno de sufrágio, dentre outros problemas específicos.

Atualmente, além da superlotação das Unidades Prisionais, temos sérios problemas na área da alimentação, com relatos de comida azeda ou em estado de putrefação, tortura praticada por Policiais Penais e entrada ilícita de produtos telefônicos portáteis, drogas e armas.

Se o Estado quiser frear a violência nas unidades prisionais e evitar que a barbárie tome as ruas, como aconteceu no Rio Grande do Norte, terá de retomar a ordem dentro das penitenciárias.

As instalações em péssimas condições, a superlotação, as situações de tortura e maus-tratos são um combustível para a violência. A solução passa pela diminuição de presos provisórios. A forma indiscriminada de aprisionar e de combater a violência com violência, o modelo é parte do problema, se aprisiona muito e mal. O aprisionamento maciço está relacionado com a guerra às drogas. O pobre, negro e favelado que está na cadeia. O menino branco que mora em áreas privilegiadas vai ser sempre considerado usuário. A maioria das pessoas presas por tráfico foi pega em flagrante, estava sozinha, com pequena quantidade, desarmada e não havia cometido nenhum ato violento. O sistema foca no (traficante) do varejo, que logo será substituído por outro, e não vai atrás do grande responsável. Essas pessoas são jogadas dentro do sistema de horrores, onde estão vulneráveis ao recrutamento para o crime.

A violência poderia ser amenizada, se a lei de Execuções Penais fosse cumprida. Quando o Estado está ausente, há um vácuo de poder. É evidente que esses grupos se fortalecem, ocupam esses espaços e passam a recrutar filiados. A lei diz que o preso, com ensino incompleto tem de estudar (apenas 11% estudam), e que o preso condenado é obrigado a trabalhar e aprender um ofício (25% dos presos brasileiros realizam algum tipo de trabalho interno ou externo), pensando na possibilidade de se reintegrar à sociedade, e a grande maioria da população carcerária tem vontade ou interesse no trabalho interno, mas não há oportunidades dentro das Unidades Prisionais cariocas.

Unidades prisionais menores, estímulo do contato dos detentos com suas famílias e com a comunidade, trabalho, capacitação profissional e assistência jurídica eficiente. Essas são algumas das características de prisões consideradas modelo que já funcionam pelo país. Elas estão sendo tratadas pelas autoridades como possíveis soluções para os problemas do sistema prisional brasileiro.

O colegiado considerou a Resolução da CIDH - Corte Interamericana de Direitos Humanos, que, ao reconhecer o instituto inadequado para a execução de penas, especialmente em razão de os presos se acharem em situação degradante e desumana, determinou que se computasse "em dobro cada dia de privação de liberdade cumprido".

O relator, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, ressaltou que a unidade prisional, foi objeto de inúmeras inspeções que culminaram com a resolução da CIDH, que, ao reconhecer o instituto inadequado para a execução de penas, especialmente em razão dos presos, estarem em situação degradante e desumana, determinou que se computasse "em dobro cada dia de privação de liberdade cumprido no Plácido de Sá Carvalho"8

O item 4 determina que seja aplicado para "todas as pessoas ali alojadas, que não sejam acusadas de crimes contra a vida ou a integridade física, ou de crimes sexuais, ou não tenham sido por eles condenadas".

O relator enfatizou, que a aprovação da Convenção Americana de Direitos Humanos, também conhecida como Pacto de San Jose da Costa Rica, em 1969, trouxe aos Estados americanos, signatários do documento internacional, uma série de direitos e deveres envolvendo o tema.

"Ao sujeitar-se à jurisdição da Corte IDH, o país amplia o rol de direitos das pessoas e o espaço de diálogo com a comunidade internacional. Com isso, a jurisdição brasileira, ao basear-se na cooperação internacional, pode alargar a efetividade dos direitos humanos."

O Ministro salientou que as sentenças emitidas pela Corte IDH, têm eficácia vinculante aos Estados que sejam partes processuais, não havendo meios de impugnação aptos a revisar a decisão exarada:

"Portanto, a sentença da Corte IDH produz autoridade de coisa julgada internacional, com eficácia vinculante e direta às partes. Todos os órgãos e poderes internos do país encontram-se obrigados a cumprir a sentença."

Derradeiramente, em reta final, declaramos que os direitos humanos devem ser alcançados nas masmorras do cárcere a todo custo, pois influencia a segurança pública e a paz social, que é bem visado por toda a sociedade.

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1 https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2021/06/CNJ-Informe-sobre-as-Medidas_Provisorias_adotadas_em_relacao_ao_Brasil-1.pdf

2 Corte IDH. Caso Almonacid Arellano y otros Vs. Chile. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 26 de septiembre de 2006. Serie No. 154. 

3 Corte IDH. Caso Acevedo Buendía y otros ("Cesantes y Jubilados de la Contraloría") Vs. Perú. Excepción Preliminar, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 1 de julio de 2009. Serie C No. 198.

4. https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana.htm

5 https://www.gov.br/pt-br/noticias/justica-e-seguranca/2020/02/dados-sobre-populacao-carceraria-do-brasil-sao-atualizados

6 Corte IDH. Caso Almonacid Arellano y otros Vs. Chile. Excepciones Preliminares, Fondo, Reparaciones y Costas. Sentencia de 26 de septiembre de 2006. Serie C No. 154. 

7 Corte IDH. Caso Acevedo Buendía y otros ("Cesantes y Jubilados de la Contraloría") Vs. Perú

8 AgRg no RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 136.961 - RJ (2020/0284469-3) RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA

Cristiano Valle Brito

Cristiano Valle Brito

Advogado criminalista há 15 anos no RJ, Ex-advogado da Secretaria de Estado de Administração Penitemciaria; Presidente da DH da ANACRIM; pós-graduado em Direito Penal e Criminologia na PUC/RS.

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