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O direito à amplitude probatória no processo civil à luz da Constituição Federal de 1988

Ao garantir o direito constitucional dos litigantes de produzir amplamente as provas necessárias à comprovação de fatos e argumentações, o magistrado possibilita ao cidadão jurisdicionado provar a verdade e, assim, ter um vasto arcabouço probatório para fundamentar, com total propriedade, sua decisão final.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2023

Atualizado às 09:43

A Constituição Federal de 1988 garante ao jurisdicionado o direito de petição e acesso à justiça1. Referida garantia constitucional é protegida pelos princípios da ampla defesa e contraditório e do devido processo, os quais também compõem, assim como outros princípios, a segurança jurídica, supra princípio que protege todos os que buscam uma decisão isonômica.

Entende-se, pois, que o julgador está submetido ao contraditório da mesma forma que as partes; e mais: como servidor-técnico-concursado é (ou assim se espera ser) capaz de analisar argumentos das partes de forma técnica e constitucional, percebendo que, ao proporcionar às partes todo alcance de produção probatória possível, poderá julgar com propriedade e tranquilidade qualquer demanda.

Esse é o ponto: busca-se segurança jurídica ao árduo trabalho do magistrado (processual civilista), que, ao permitir toda a produção de provas possíveis no decorrer dos autos, ao final, quando for julga-lo, terá informações e capacidade inconteste para proferir o melhor resultado (decisão) ao caso concreto.

Mesmo considerando-se a controversa e aqui questionada "livre convicção motivada do julgador", esta convicção não detém caráter absoluto, ou seja, o julgador deve ponderar e atuar de forma a permitir a efetiva busca pela verdade pelas partes, o que o assegurará a prolatar uma decisão constitucionalmente adequada2 (STRECK, 2010).

Percebe-se, pois, com todo respeito aos entendimentos em contrário, que o Código de Processo Civil em vigor, consubstanciado na Constituição Federal, em nenhum momento restringiu a ampla produção probatória. Pelo contrário. 

Sem querer esgotar o tema ou parecer intransigente, mas entende-se que essa é a interpretação constitucional da legislação processual civil acerca das provas: ampliar ao máximo a sua realização e produção, em prol da melhor decisão aos jurisdicionados e à própria construção jurisprudencial. 

Contudo, o magistrado deve constatar a má-fé, a ilegalidade ou intuito protelatório de alguma parte e fundamentar sua decisão nesse sentido para indeferir (excepcionalmente) o pleito de produção de provas. No mais, deve-se permitir a amplitude probatória e deferir-se todos pedidos de produção provas, sejam elas documentais, periciais, exibição de documentos, testemunhais, enfim, todo o espectro probatório possível.

O que se defende aqui é a permissão incontinenti pelo juiz à toda a forma de efetivar a busca pela verdade, para não haver questionamentos acerca da (im)possibilidade probatória em recursos às instâncias superiores, deixando o processo devidamente instruído com tudo que foi pleiteado e devidamente (leiase legalmente possível) realizado e produzido em termos de provas no processo civil.

A Jurisprudência Pátria sobre o tema tem decisões importantes em casos concretos, nos quais entendeu-se muitas vezes pelo cerceamento de defesa acerca de decisões que não permitiram a ampla instrução, produção e realização probatória.

No entanto, não se pode deixar de consignar, infelizmente, com todo respeito, que outras várias decisões de Tribunais de Justiça e do próprio Superior Tribunal de Justiça ainda convalidam o livre convencimento motivado tão combatido por vários doutrinadores, professores e operadores do direito3.  

Essa busca pela real necessidade da sociedade brasileira no processo civil em fazer valer seu direito constitucional de provar a verdade e ter garantida a efetiva busca pela verdade através da amplitude probatória é de extrema importância ao Estado Democrático de Direito.

Qualquer um de nós pode-se se deparar a qualquer momento com uma obstrução probatória injusta se assim permanecer o entendimento do livre convencimento motivado.

Nesse sentido, o Professor Guilherme Pupe da Nobrega, orientador deste subscritor, em sua recente tese de doutorado, abordando vasta doutrina, em capítulo próprio ("2.3.2 O tema da "livre" valoração e produção de provas"; NÓBREGA, 2021)4, consigna que "em matéria de prova, a discricionariedade busca afiançar e blindar o efeito perseverança, subvertendo o convencimento motivado em favor da reafirmação de pré-concepções e, colateralmente, do esvaziamento do contraditório e do devido processo legal."

Esse é o caminho para uma decisão justa: ampliar a produção probatória, evitar a discricionariedade, respeitar o contraditório e o devido processo para que fique oportunizado às partes a ampla dilação probatória tão necessária ao correto deslinde da lide processual civil.

Dessa forma se atingirá a resposta que o jurisdicionado merece, e claro, respeitando-se o contraditório, desviando-se de se aplicar o ultrapassado "livre convencimento", mesmo que "motivado", consolidar-se-á, assim, a tão almejada segurança jurídica às decisões judiciais.

Ao magistrado, como consequência dessa permissão (e aplicação constitucional), - em que permite como julgador-intérprete-máximo tal amplitude probatória, - constata-se a facilitação da sua fundamentação em decisão final, sendo que a sentença (ou voto) estará constitucionalmente adequada5, proporcionando às partes a segurança jurídica na resposta do Poder Judiciário.

_______________

1 Artigo 5º, incisos XXXIV e XXXV da Constituição Federal de 1988.

2 STRECK, Lenio Luiz. O Direito de Obter Respostas Constitucionalmente Adequadas em Tempos de Crise do Direito: a Necessária Concretização dos Direitos Humanos. Hendu - Revista Latino-Americana de Direitos Humanos, 2010-0815, Vol.1 (1), p.93.Agosto, 2010.

3https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=PROCESSO+CIVIL+E+LIVRE+CONVENCIMENTO+MOTIVADO&pesquisaAmigavel=+%3Cb%3Eprocesso+civil+e+livre+convencimento+motivado%3C%2Fb%3E&b=ACOR&p=fals e&l=10&i=1&operador=e&tipo_visualizacao=RESUMO&tp=T ACESSO EM 14.06.2022:

4 NÓBREGA, Guilherme Pupe da. Jurisdi(cri)ção: a discricionariedade judicial como estratégia e sua (in)validade perante o direito. 2022. 292f. Tese (Doutorado em Direito Constitucional). - Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e Pesquisa, Brasília, 2021. 

5 STRECK, Lenio Luiz. O Direito de Obter Respostas Constitucionalmente Adequadas em Tempos de Crise do Direito: a Necessária Concretização dos Direitos Humanos. Hendu - Revista Latino-Americana de Direitos Humanos, 2010-0815, Vol.1 (1), p.93.Agosto.2010 

Rodrigo Fontoura

VIP Rodrigo Fontoura

Advogado desde 2003; Pós-graduado em Direito Civil-Empresarial PUC-PR; Pós-graduado em Direito Processual Civil IDP-DF.

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