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Contrato de namoro

O namoro pode ser distinguido em namoro qualificado, sendo aquele que poderia, facilmente, ser confundido com o instituto da união estável, atendendo aos requisitos presentes no artigo 1.723 do Código Civil com exceção do objetivo de constituir família.

quinta-feira, 27 de abril de 2023

Atualizado às 09:13

O contrato de namoro é compreendido por um negócio jurídico celebrado entre duas pessoas com vontades livres. 

O namoro, de acordo com o doutrinador Euclides de Oliveira, é a relação afetiva entre duas pessoas com fundamento na atração recíproca, sendo um processo de convivência que pode resultar na construção de uma família, mas não há, necessariamente, esse compromisso. 

Tal instituto passou a ter extrema importância na pandemia mundial de COVID-19, iniciada em 2020, em que os casais por consequência do isolamento social passaram a morar juntos, mesmo que não planejassem a curto prazo. 

O namoro pode ser distinguido em namoro qualificado, sendo aquele que poderia, facilmente, ser confundido com o instituto da união estável, atendendo aos requisitos presentes no artigo 1.723 do Código Civil com exceção do objetivo de constituir família:

"É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família."

E, namoro simples, em que os requisitos do artigo supracitado são mitigados, não existindo, por consequência, o objetivo de constituir família.

Haja vista, os tribunais ratificam a existência do instituto do namoro qualificado, conforme ementa abaixo:

APELAÇÃO CÍVEL - RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL - PARTILHA - ALIMENTOS - NAMORO QUALIFICADO - PRECEDENTES DO STJ. - Para o reconhecimento da união estável é necessária a comprovação dos requisitos elencados no art. 1.723 da Lei Civil, quais sejam: convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família - Conforme entendimento do STJ "o propósito de constituir família, alçado pela lei de regência como requisito essencial à constituição da união estável - a distinguir, inclusive, esta entidade familiar do denominado "namoro qualificado"-, não consubstancia mera proclamação, para o futuro, da intenção de constituir uma família. É mais abrangente. Esta deve se afigurar presente durante toda a convivência, a partir do efetivo compartilhamento de vida, com irrestrito apoio moral e material entre os companheiros. É dizer: a família deve, de fato, restar constituída". (Resp. 1.454.643/RJ - Relator Min. Marco Aurélio Bellizze - Terceira Turma - Dje.: 10/03/2015) - Ainda que se trate de uma relação duradoura, pública e contínua, pelo acervo probatório dos autos, não há prova de que existia o objetivo de constituir família, pelo que se trata de um "namoro qualificado" e não de uma união estável, devendo ser mantida a sentença de improcedência.

(TJ-MG - AC: 10105093146519002 Governador Valadares, Relator: Alexandre Santiago, Data de Julgamento: 24/03/2022, Câmaras Especializadas Cíveis / 8ª Câmara Cível Especializada, Data de Publicação: 29/03/2022)

Importante salientar que, o contrato de namoro não possui nenhuma previsão legal específica no Título V (Contratos em Geral) do Código Civil, entende-se que sob ele recai aos requisitos formais previstos no artigo 104 do Código supracitado: 

"Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:

I - agente capaz;

II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;

III - forma prescrita ou não defesa em lei."

Para que este tipo contratual tenha validade perante a sociedade se faz necessário também, a devida formalização em cartório de notas, por escritura pública, ou, de forma particular mediante assinatura das partes interessadas.

Recentemente, a lavratura de escritura pública de namoro ganhou relevância no meio jurídico e sua eficácia tem gerado bastante discussão entre os operadores do direito.

Atualmente, o casal pode buscar a formalização da existência do namoro por meio da escritura declaratória de namoro, cujo objetivo é tornar pública a existência do relacionamento afetivo, de modo a afastar a comunicabilidade de bens e eventuais vínculos sucessórios ou patrimoniais.

O contrato aqui tratado tem como objetivo limitar o relacionamento, obviamente, a um namoro, afastando, a possibilidade de este ser reconhecido como união estável, que tange questões relacionadas à regime de bens, por exemplo. As decisões publicadas acerca deste tema mostram que os tribunais tendem a entender, atualmente, que o contrato de namoro, desde que não preenchidos os requisitos de união estável, pode ser reconhecido, conforme julgado abaixo:

APELAÇÃO. Ação de reconhecimento e dissolução de união estável cumulada com partilha de bens. Sentença que julgou improcedente a ação. Inconformismo da parte autora. Não preenchidos os elementos essenciais caracterizadores da união estável previstos na lei. Contrato de namoro firmado pelas partes. Caracterizado simples namoro, sem intenção de formação de núcleo familiar. Sentença mantida. Recurso desprovido.

(TJ-SP - AC: 10008846520168260288 SP 1000884-65.2016.8.26.0288, Relator: Rogério Murillo Pereira Cimino, Data de Julgamento: 25/06/2020, 9ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/06/2020)

Insta mencionar, que entre os doutrinadores, a posição majoritária é de que este tipo contratual é desprovido de eficácia e, pode ser considerado, uma forma de renúncia dos direitos e obrigações inerentes ao instituto da união estável, devendo o contrato ser nulo, já que, busca fraudar a lei.

Contudo, é importante, também, que o contrato aluda de forma expressa que independente do modo que o relacionamento suceda, não poderá ser enquadrado como união estável, a fim de preservar os efeitos não sucessórios, e, a não incidência de repartição de bens. Nos casos em que a união estável for confessada por qualquer das partes e, o casal, posteriormente, se separar, prevalecerá o regime de bens escolhido, caso nenhum regime de bens for declarado, prevalecerá a comunhão parcial de bens.

Conforme o exposto, apesar do contrato de namoro gerar inúmeros debates relativos à sua existência e validade jurídica, tem-se mostrado um instituto muito utilizado entre os casais que buscam afastar a incidência da união estável com o objetivo de assegurar a preservação do patrimônio individual.

Com a decisão do Supremo Tribunal Federal que declarou a inconstitucionalidade do artigo 1790 do Código Civil e determinou que a sucessão do companheiro segue as mesmas regras aplicáveis para a sucessão do cônjuge previstas no artigo 1829, a confecção do contrato de namoro e a lavratura da respectiva escritura possuem o condão de comprovar que existe uma relação de afeto sem consequências jurídicas.

Está prática é uma alternativa favorável de formalização dos casais que buscam afastar a incidência da união estável, amplamente discutida e impactante no caso de sucessão de bens e, apesar do contrato de namoro gerar inúmeros debates relativos à sua existência e validade jurídica, o desenvolvimento das relações sociais e o impacto jurídico desta formalização tende a tornar esta prática mais comum entre os brasileiros.

Giovanni Paolo Ferri

Giovanni Paolo Ferri

Advogado do escritório Sartori Sociedade de Advogados. Graduado pela Universidade Paulista (UNIP). Pós-graduado em Direito Cível - Contratos e Negócios Imobiliários pela Escola Paulista de Direito (EPD). Pós-graduado em Prática de Direito Empresarial Avançada pela Faculdade Damásio de Jesus (FDDJ).

Júlia Pietrosanto Teixeira

Júlia Pietrosanto Teixeira

Estagiária do escritório Sartori Sociedade de Advogados. Graduanda pela Faculdades de Campinas (FACAMP).

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