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Provas digitais: Documentos eletrônicos com valor probatório

Tatiana Cristina Dias Mascioli Amêndola

Documentos digitais têm valor probatório, desde que observados os requisitos de validade.

quinta-feira, 18 de maio de 2023

Atualizado às 07:54

Em 1988, pela primeira vez, surgiu o conceito do trabalho mediado pelo computador, em livro da professora Soshana Zuboff, alertando que caminhávamos para uma vida balizada por esse equipamento.

Desde então, vivemos uma verdadeira revolução com a era digital, cuja principal engrenagem é a tecnologia, que exerce papel fundamental na informação e influencia sobremaneira como interagimos e nos comunicamos. A interação imediata entre interlocutores por meio da tecnologia, seja qual for a distância que os separe, está moldando as relações sociais. Tudo é rastreado, monitorado, gera dados e metadados.

Neste ambiente, são produzidos cada vez mais documentos com auxílio de equipamentos eletrônicos, em sua maioria microprocessados e armazenados em meio digital, segundo a lógica binária. O documento digital é formado por bits, ou seja, conjuntos de 0 ou 1, alocados de maneira conveniente para que sejam interpretados por outros equipamentos eletrônicos. Não é vinculado a qualquer substrato físico, nem é legível aos olhos humanos. Por óbvio, é necessário um intermediário para essa leitura.

Daí surge a questão: documentos criados e armazenados em ambiente digital têm valor probatório no direito processual brasileiro? A resposta é afirmativa, desde que se possa verificar se são lícitos e oferecem segurança jurídica.

No ordenamento jurídico brasileiro, são admitidos todos os meios probatórios (TARUFFO, M., 2014), desde que legalmente ou moralmente legítimos, conforme artigo 369 do Código de Processo Civil. É importante destacar que a Constituição Federal veda as provas ilícitas. Assim, embora o CPC admita qualquer meio de prova, é essencial verificar se a prova obtida por meio eletrônico é lícita.

Tramita no Congresso Nacional o PL 4.939/20, que dispõe, em seu art. 4o, sobre as normas de obtenção e admissibilidade de provas digitais na investigação e no processo.

Atualmente a doutrina define como prova digital todo elemento extraído ou armazenado em meio digital, apto a provar ocorrência ou inocorrência de fato.

Para a prova digital ser utilizada com segurança, é importante atribuir valor probatório aos documentos eletrônicos (DIDIER JR, F., BRAGA, P. S., OLIVEIRA, R. A., 2013), observando-se três pressupostos:

  • Autenticidade - característica da prova digital que permite a certeza com relação ao autor do fato digital; é a qualidade que assegura que o autor aparente do fato é seu autor real. A autenticidade tem por objetivo identificar a origem e a autoria, através da qualidade da informação produzida, expedida, recebida ou modificada por determinado indivíduo, equipamento ou sistema. Prevista no art. 4°, inciso VIII da Lei de Acesso à Informação 12.527/11 e no art. 195 do Código de Processo Civil.
  • Integridade - característica da prova digital que permite a certeza com relação à sua completude e não adulteração. Será considerada íntegra quando se apresentar isenta de modificação em seu estado ou adulteração, desde o momento da realização do fato até a apresentação do resultado, estando apta a reproduzir o fato na integralidade. Tem por objetivo demonstrar que a prova digital não sofreu alteração quanto a origem, trânsito e destino, e garantir que não foi nem poderá ser alterada com o tempo. Prevista no art. 4°, inciso VII da Lei de Acesso à Informação 12.527/11 e no art. 195 do CPC.
  • Cadeia de Custódia - preserva a autenticidade e a integridade em todo o histórico de produção da prova digital, da identificação à apresentação em juízo, devendo a parte fazer o possível para identificar: datas e horários de acesso e extração da prova; lugar em que ocorreu; se mais alguém teve acesso à prova; e se, na extração dos dados, houve alterações inevitáveis. Prevista na Resolução 408/21 do CNJ.

Conclui-se que documentos digitais têm valor probatório, desde que observados os requisitos de validade, que lhes garantam segurança e eficácia, assegurando sua credibilidade perante o Judiciário.

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DIDIER JR, F., BRAGA, P. S., OLIVEIRA, R. A., 2013, Curso de Direito Processual Civil: Teoria da Prova, Direito Probatório, Ações Probatórias, Decisão, Precedente, Coisa Julgada e Antecipação da Tutela, vol. 2, 8ª edição, Editora JusPODIVM.

MISKULIN, A. P. S. C., BERTACHINI, D., 2022, Prova Digitais no Processo do Trabalho: Realidade e Futuro, Editora Lacier.

TARUFFO, M., 2012, Uma simples verdade: O juiz e a construção dos fatos, Editora Marcial Pons.

TARUFFO, M., 2014, A Prova, Editora Marcial Pons.

TEIXEIRA, T., 2023, Direito Digital e Processo Eletrônico, 7ª edição, Editora Saraiva.

ZUBOFF, S., 1988, Na Era da Máquina Inteligente: O futuro do trabalho e do poder, 1ª edição.

https://revistaacademica.mpce.mp.br/revista/article/view/147/137, acessado em novembro de 2022

Tatiana Cristina Dias Mascioli Amêndola

Tatiana Cristina Dias Mascioli Amêndola

Especialista em Direito Processual Civil e Advogada no Reis Advogados.

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