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Mais que um imóvel: A domus na sociedade e no direito romano

As fontes arqueológicas mudaram recentemente a perspectiva construtiva dos romanos.

terça-feira, 27 de junho de 2023

Atualizado em 3 de julho de 2023 10:37

A palavra "Domus", habitualmente identificada com a casa, enquanto espaço físico que os romanos distinguiam como sua habitação, em melhores ou piores condições, como veremos a seguir, não goza dos critérios inequívocos da doutrina quanto ao seu significado, já que alguns autores sugerem a extensão semântica desse famoso termo, declarando também como domus a união de um grupo aparentado, que inclui a família, escravos, agnados, cognados, ancestrais e até patrimônio.

Esta utilização do termo domus como casa física, mas também como lar, constituída por membros de um grupo familiar sob a autoridade do mesmo páter-famílias (paterfamilias), tem sido reivindicada há algum tempo pela doutrina1 na tentativa de demonstrar o uso comum da habitação e do lugar em que o dominus exercia seu controle, com base em trechos em que é difícil saber se pretendiam um sentido ou outro2.

Existem, no entanto, passagens suficientes em que domus pode simbolizar apenas um elemento físico. É fato que os testemunhos que temos à nossa disposição são de épocas posteriores, mas pode servir de exemplo o fato de, durante e imediatamente após o seu exílio, Cícero ter repetidamente manifestado a sua preocupação em recuperar a sua domus. Além disso, quando menciona a decisão do Senado que ordenou a sua reconstrução, refere-se claramente à estrutura física e não ao domínio doméstico, e existem muitos outros exemplos claros que nos permitem dar muita plausibilidade à diferença de nuances de Ernout, além do fato de que não pretendemos neste prestigiado fórum que as nuances filológicas constituam o cerne da nossa intervenção, mas apenas esta pequena alusão inicial.

  1. Domus.

A domus, no sentido de espaço físico, é o que vamos usar como principal referência para destacar a importância da habitação na sociedade e no direito romano.

A princípio, a casa como habitação independente era o estilo de residência habitual, preferencialmente localizada no campo3, afastada das mansões imperiais que não se comparam com o restante das habitações da cidadania romana.

Nas palavras de Marco Lucio Vitrubio Polión, renomado arquiteto romano, em sua obra "Los diez libros de arquitectura", no sexto livro4, a proporção da antiga casa itálica deve seguir uma série de cânones para atingir as medidas perfeitas de uma construção, sempre composto por uma parte essencial, o átrio. Cercado pelos quartos que o rodeavam, e frequentemente com um pequeno jardim na parte posterior, surgiu posteriormente a necessidade de um peristilo, cujo nome indica o aposento masculino de uma casa grega, hoje transformado em jardim caracterizado por pórticos colunados, em que abriam salas de diferentes tamanhos em cada lado.

A típica casa romana, de caráter um tanto imponente, não era o único modelo na Roma antiga. Muito pelo contrário, a habitação individual, ou melhor, o domicílio de uma família unida pelo vínculo de poder e autoridade do mesmo páter-famílias (paterfamilias), foi logo substituído por blocos de casas alugadas, as ínsulas, já que a economia urbana, em constante crescimento, tornava necessária a importação de mão de obra do campo ou de outras localidades, que chegavam à Urbs com vontade de prosperar, mas que não podiam arcar com o custo de moradias exorbitantes para sua ínfima capacidade econômica.

Existia, também, um outro modelo de arrendatário, que exigia serviços de arrendamento habitacional mas com um status elevado, quando se deslocava para a cidade para realizar determinados negócios, e depois regressava ao seu local de origem, pelo que o regime de arrendamento habitacional não era o mesmo para todos, nas mesmas condições ou no mesmo tipo de habitação oferecida, pois enquanto alguns podiam desfrutar de uma casa no auge de sua confortável posição econômica, outros teriam que se adaptar, em número muito maior, a um lugar muito menos desejável, mas dentro de suas possibilidades.

Com esta variedade de edifícios à disposição da população, consideramos necessário oferecer, em primeiro lugar, as características da domus destinada ao uso e fruição de uma única família, especificadas a seguir:

  1. Uma domus típica, que pode servir de modelo, carecia de vista exterior, sem aberturas para janelas, pois eram entendidas como elementos estranhos na construção, e quando existiam eram de tamanho reduzido, sem moldura exterior, com um aspecto rústico e sem brilho que não remete à realidade do que está contido nas paredes da casa.
  2. A orientação habitual era para o interior, através do átrio, amplo e luminoso, que, sendo aberto na cobertura, absorve o ar e a luz dos quartos construídos à sua volta, e também através do jardim do peristilo, mais amplo que o átrio, e, portanto, com mais luz.
  3. Uma característica diferencial em relação a outras construções é que a domus foi concebida como um edifício térreo, e quando outros andares foram construídos foi por demandas familiares imprevistas, não por desejo estético da própria domus construída, embora pouco a pouco não fosse tão estranho visualizar casas de dois ou três andares.
  4. Cada um dos espaços que compõem a casa destina-se única e exclusivamente a uma única utilização. Desta forma, o triclínio será utilizado como sala de jantar5, o cubículo como quarto, o tablino como sala de reuniões ou de trabalho para o páter-famílias (paterfamilias), e assim sucessivamente com todas as outras divisões previstas6.

Nesta casa, fechada sobre si mesma, depois da porta, ianua, era preciso atravessar um corredor, fauces7, para chegar ao átrio. Às vezes, previa-se até mesmo a construção de uma porta, entre este vestíbulo e o átrio que impossibilitasse a visualização do seu interior mesmo que a porta principal estivesse aberta, ou seja, negava informação visual aos curiosos interessados em conhecer o interior da domus.

O átrio era espaçoso8, com uma ampla abertura na cobertura (compluvium), que correspondia a um tanque quadrado (impluvium), que servia para recolher as águas pluviais9. O ralo que foi construído no implúvio, revestido por um poço cilíndrico, puteal, conduzia a água coletada para uma cisterna subterrânea, que era a caixa d'água da família na casa. Tal era a importância do átrio, que a família o utilizava para trabalhar, comer e dormir, embora com o tempo pequenos cômodos, alae, fossem dispostos em ambos os lados do átrio, que serviam de dormitórios e despensa.

As salas eram aquecidas com estufas portáteis de bronze ou com braseiros fixos, embora o frio parecesse ser a tendência dominante no inverno. Com relação à iluminação, os romanos usavam velas, candelas, feitas de cera ou sebo, e lamparinas de óleo, lucernae, mas elas forneciam pouca iluminação, então muitas lucernae tinham que ser usadas se você quisesse iluminar uma sala com claridade suficiente.

O tablino10, aberto no átrio, eixo central da casa e centro da vida familiar, era o local destinado a guardar os livros de contabilidade, os arquivos da família, bem como o altar dedicado aos deuses penates, e geralmente dava para um extenso pátio atrás da domus.

Por fim, o piso, pavimentum11, foi decorado com mosaicos que conferiam beleza e solidez à casa, e as paredes foram enfeitadas com pinturas ou cortinas, velae, presentes nas aberturas das portas da casa.

É fato que esta ordenação permitia uma perfeita organização das atividades programadas pelo dominus ou páter-famílias (paterfamilias), que devia exercer a sua autoridade dentro das paredes da domus. Exemplo disso é o consilium domesticum, tribunal de família não isento de controvérsias quanto à sua constituição e funções, mas que serviu decisivamente em certos conflitos que afetavam o conjunto familiar, e que serviu para preservar a honra, valor fundamental no âmbito da família romana. Quanto ao consilium domesticum, também conhecido como iudicium domesticum, não há unanimidade na doutrina ao avaliar a existência de um tribunal de família, ou se era realmente um órgão consultivo, um instrumento a serviço da família, mas para consumo interno, que não tinha os poderes de um tribunal.

Este tribunal de família funcionava dentro da domus e era um mecanismo de direito processual que poderia ajudar a configurar o poder disciplinar a serviço do páter-famílias (paterfamilias), regulamentando o direito de vida e morte que tinha sobre os membros do grupo familiar sujeito a seus poderes, e ordenando-o dentro do sistema jurídico romano.

Em outras palavras, o consilium domesticum bem poderia ser o canal jurídico, com funções jurisdicionais12, que limitava e ordenava a vitae necisque potestas13 do páter-famílias (paterfamilias), ou apenas um órgão interno da família com caráter consultivo, um conselho de família não vinculante em suas decisões a respeito dos membros do núcleo familiar14, que se realizava dentro de casa.

Assim, a domus parece ultrapassar os limites da esfera privada para a esfera pública, e embora não acreditemos, segundo as fontes de que dispomos, que o iudicium ou consilium domesticum represente um órgão jurisdicional paralelo à justiça pública romana, apostando no caráter consultivo deste conselho de família, a relevância da domus como centro de excelência doméstica é endossada com as possibilidades que poderiam acontecer dentro dela.

Por outro lado, podemos levar em consideração a importância da domus, já desde o direito arcaico, como prova inegável do comportamento das matronas romanas. O caso de Lucrécia15, mulher casta, símbolo virtuoso e exemplo para as mulheres romanas, violada por Sexto Tarquínio, filho do último rei etrusco16, ocorre, independentemente das suas luzes e sombras, como convém a um episódio mítico17, na casa conjugal de Lucrécia, quando Sexto, depois de ter verificado em ocasião anterior o pudor e a castidade de Lucrécia por ficar sempre em casa, na domus, fiando lã com a única companhia de seus escravos, trama um plano para ter acesso a ela. Em sua visita, ele a engana a respeito de seus motivos, indicando que precisa descansar para continuar sua jornada, e ela gentilmente oferece a ele o jantar e a chance de dormir naquela noite em sua casa para poder descansar adequadamente antes de iniciar a viagem de volta, como convém a uma amiga e parente de seu marido.

A princípio18, quando Sexto entrou no quarto armado com uma espada, quis fazer Lucrécia acreditar que se casaria com ela se ela se curvasse a ele. Mas então ele mudou de ideia e, quando ela o recusou, ele ameaçou matá-la e colocar uma escrava morta e nua ao lado dela19, para que mais tarde pudesse justificar que havia vingado a desonra da família ao encontrá-la em flagrante adultério. É fato que a possibilidade de acabar com a vida de quem é apanhado em adultério não correspondia de todo a Tarquínio, mas sim ao páter-famílias em virtude do ius vitae et necis ou, neste caso concreto, ao seu marido20, sabendo também que este tipos de crime foi fundamentado perante o iudicium domesticum, como acabamos de ver.

Naquela época, o adultério não era considerado um crime público, como viria a incluir a legislação do imperador Augusto, ao convertê-lo, através da lex Iulia de adulteriis coercendis21, em crimen publicum, suscetível de ser processado perante um tribunal popular que não permitirá que a desonra seja escondida dentro da própria família, expondo a prática de um crime de adultério a toda a sociedade romana.

Porém, diante de tal possibilidade, sabendo que a honra de sua família seria maculada apesar de sua inabalável virtude, a vontade de Lucrécia foi quebrada22, para depois ser estuprada por Sexto em sua própria casa, um acontecimento terrível que destruirá a vida imaculada que Lucrécia levara até agora, despojando-a de sua honra e, portanto, de sua própria família.

O paradoxo é que para defender sua honra ela terá que se submeter ao seu estuprador para depois poder contar a agressão sexual sofrida em sua própria domus, algo realmente inédito porque a casa romana era entendida como um refúgio ideal para as mulheres, já que a vida se fazia dentro de casa, a salvo de olhares indiscretos23, e as matronas romanas podiam realizar diversas atividades sempre com o aconchego do lar familiar, que era também o lugar destinado às mulheres como consequência do regime patriarcal romano da época.

O final dramático nos conta como Lucrécia, convencida da necessidade de começar a reparar a honra da família, na sua própria pessoa e num momento de desespero perante a honra perdida, cravou uma faca em seu coração que acabou com sua vida, mas restaurou seu bem mais precioso, a honra24. A domus está segura, a casa como espaço físico que se ultrapassou, assim como o pudor e a honra da ilustre matrona. A sua morte servirá de exemplo para as gerações femininas seguintes, que devem mostrar um comportamento irrepreensível na domus e fora dela, como a casta e pudica Lucrécia.

Talvez, se a domus não fosse constituída por cômodos de proporções fixas, planejados para um determinado uso, nem alinhados um após o outro de forma invariável, e fosse um espaço físico mutável, ou pelo menos não imaginável pelo agressor tendo um divisão diferente, teria servido como elemento defensivo para Lucrécia, embora seja uma especulação que evidentemente não encontra respaldo nas fontes, nem serve para proteger nosso famoso protagonista, já que na lei mais arcaica as dimensões e proporções das casas itálicas não são conhecidas com tanta exatidão25.

Nesta Roma tão diversa, que reunia os mais grandiosos conjuntos monumentais e edifícios gigantescos onde se reuniam multidões, os indivíduos não viviam apenas em domus, casas típicas de disposição axial sempre abertas a um espaço interior, que refletia fielmente as exigências e a vida familiar das populações italianas, imitando plenamente a cultura grega, mas é fato que quem gozou de tal privilégio, ainda assim, consideravam-se merecedores de melhoramentos na casa, quase à altura do seu status sem interrupção, identificando de certa forma a imagem da casa, domus, com a posição na rígida pirâmide social romana.

Ou seja, os privilegiados que possuíam uma habitação unifamiliar, casa de proporções que evidenciavam a posição distinta de seus proprietários, podiam vangloriar-se de seu status com a contínua publicidade de sua casa própria, enquanto outros, talvez novos cidadãos ou patres conscripti, senadores que não provinham de uma oligarquia familiar secular, tinham que se apresentar aos seus concidadãos com amostras externamente visíveis de sua posição adquirida, exibicionismo que foi objeto de ridículo pela literatura que preferia a nobreza da história e do direito romano arcaico.

A casa de um cidadão pertencente às elites cidadãs ou à oligarquia romana, na época de Cícero, estava preparada para receber os seus muitos clientes todas as manhãs26. Assim, desde o amanhecer, as portas voltadas para a rua foram abertas e o acesso foi liberado para a saudação matinal. Todas as cerimônias ocorriam no átrio, uma sala de amplas dimensões, muitas vezes sem impluvium27, e onde o compluvium era pequeno ou inexistente.

A evolução da domus é forçada pelas exigências da vida social cotidiana impostas por um enorme átrio, e os diferentes quartos multiplicam-se com o crescimento econômico das famílias abastadas28, enquanto os detentores de pouco patrimônio não precisam de tais facilidades, pois serão eles que serão obrigados a fazer visitas patronais, já que ninguém virá visitá-los.

Surge assim um novo modelo de domus mista, fechada para o interior, a imitar o exemplo das casas gentias rurais, mas por outro lado expande-se nas partes que se abrem para o exterior. Estamos diante da construção de habitações luxuosas que são muito raras em Roma29, já que o espaço necessário não é rentável de forma alguma e o uso urbano tem um modus operandi claro para no futuro obter um grande retorno econômico sobre o solo urbano.

As fontes arqueológicas, especialmente as relacionadas com as escavações de Pompeia30, Herculano e mesmo de Óstia31, mudaram recentemente a perspectiva construtiva dos romanos. Embora a casa clássica com o seu átrio tenha sido durante muito tempo a habitação romana por excelência, como acabamos de ver, logo começaram a ser construídos edifícios com divisões de todas as tipologias e condições, que logo assumiram o papel arquitetônico do ambiente urbano, as ínsulas, deixando a domus, que exigia uma área considerável e também poderia acomodar apenas uma família, em total regressão, a que se soma o desempenho econômico infinitamente superior.

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1 ERNOUT, A.: "Domus, fores et leurs substituts", en RPh, 6, 1932, p. 297-314, reimp. en Philologica, París, 1946, pp. 103-118, destacava o uso adverbial de domus como suporte para a tese do uso comum do termo em relação à habitação mas também ao grupo familiar.

2 ERNOUT, A.-MILLET, A.: Dictionnaire Etymologique de la Langue Latine. Histoire des mots, 3ª ed., Lib. C. Klincksieck, París, 1951, p. 326: "maison; de la domi, loc., "chez soi, à la maison" par oppos. à peregri, foris et à militiae. domus désigne la maison en tant que symbole de la famille: domus te nostra tota salutat Cic., Att.4,13, et aussi "l' école, la secte", apostando no duplo sentido do termo domus.

3 Embora a posse de uma casa não esteja incontestavelmente ligada ao conceito de arrendamento de terras rurais, é fato que os proprietários, principais habitantes das domus, eram os arrendatários que exploravam as grandes propriedades agrícolas diretamente ou por meio de representantes, já na época imperial, como aponta MENTXACA R.: La pignoración de colectividades en el derecho romano clásico, ed. Universidad del País Vasco, Bilbao, 1986, pp. 34 ss.

4 Vitrubio, Los diez Libros de Arquitectura, trad. esp., Biblioteca Miguel de Cervantes, Alicante, 2014, prólogo sexto livro, p. 69: "Quando observo que o prestígio desta nobre ciência está nas mãos de pessoas com o mínimo de conhecimento, de inexperiências, e mesmo de indivíduos que não têm a menor ideia de arquitetura ou construção, não posso deixar de elogiar aos pais que, encorajados pela seriedade da sua erudição, decidem construir por si próprios; Em vez de confiar em pessoas inexperientes, eles preferem se defender sozinhos, gastar seu dinheiro de acordo com sua própria vontade e não confiar no capricho das outras pessoas. Ninguém se atreve a fazer trabalhos artesanais em casa, como sapateiro, manusear moinhos ou qualquer outra atividade que seja fácil de exercer, mas atrevem-se a ser arquitetos, porque as pessoas que exercem a arquitetura facilmente se definem como arquitetos, quando na realidade desconhecem esta autêntica arte. Por tudo isto, decidi escrever, com todo o cuidado possível, um estudo completo de Arquitetura, com todas as suas regras, na convicção de que o meu trabalho será positivamente reconhecido por todos. E como no quinto livro tratei da situação mais vantajosa dos edifícios públicos, neste explicarei a teoria dos edifícios privados. E a simetria de suas proporções".

5 DUNBABIN, K.M.D.: "Triclinium and Stibadium, en Dining in a Classical Context", (W.J. Slater ed.), The University of Michigan Press, Ann Arbor, 1991, p. 125, afirma que mesmo nos últimos séculos do Império, o triclínio continuou a ser utilizado, tanto no seu uso público como privado, como sala de jantar.

6 CARCOPINO, J.: La vida cotidiana en Roma en el apogeo del Imperio, trad. esp., ed. Temas de Hoy, Madrid, 2001, p. 45: "A domus é composta por salas de proporções fixas, planejadas para um uso específico, alinhadas uma após a outra seguindo uma ordem invariável: fauces, atrium, alae, triclinium, tablinum y peristilum".

GREENOUGH, J.B.: "The Fauces of the Roman House", en Harvard Studies in Classical Philology , 1, 1890, pp. 2 ss.

8 Vitrubio, Los diez libros de Arquitectura, cit., 6.3.1-2: "Devem distinguir-se cinco classes diferentes de átrios, cujos nomes respondem precisamente à sua aparência: «toscano», «coríntio», «tetrastilo», «displuviado» e «abobadado». Os átrios toscanos são aqueles em que as vigas, que atravessam a largura do átrio, têm alguns suportes suspensos e algumas vigas (que sustentam os canais para coletar a água) que dos ângulos das paredes terminam nos ângulos das vigas que atravessam o átrio; por meio de escoras forma-se um declive para que a água corra em direção ao complúvio, situado no meio da cobertura do átrio. Nos átrios chamados coríntios, coloque as vigas e o complúvio da mesma forma que no átrio toscano, mas separe as vigas das paredes e apoie-as em algumas colunas que cercarão o espaço que fica descoberto. Os átrios tetrastilos oferecem grande solidez, pois possuem colunas angulares sob as vigas que os sustentam, portanto não devem suportar grandes pressões ou carregar pontos pendentes. Átrios displuviados são aqueles com as vigas dos canais de tal forma que suportam a superfície da abertura do telhado e impedem o derramamento de água (já que não possuem beirais que despejam água no complúvio). No inverno, eles oferecem uma grande vantagem porque, quando seus complúvios são elevados, permitem que a luz penetre nos triclínios; mas apresentam um grande inconveniente devido aos seus reparos frequentes, pois possuem canais por onde escoa a água da chuva ao redor das paredes; Às vezes, tais canais não conseguem escoar rapidamente toda a água que recebem, então a água transborda, inundando tudo, causando sérios danos tanto à madeira quanto às paredes dessas construções. Utilizam-se átrios abobadados onde a abertura não é muito ampla e no topo do seu caixilho existe a possibilidade de habilitar cômodos amplos".

9 NACK, E.-WÄGNER W.: Roma, trad. esp., ed. Labor, Barcelona, 1960, p. 148, com a representação gráfica da planta de uma casa romana, certamente ilustrativa. 

10 GRIMAL, P.: La civilización romana, trad. esp., ed. Paidós, Barcelona, 1999, p. 242: "O seu nome talvez indique que na sua origem não era mais do que um barraco feito de tábuas de madeira (tablinum, evidentemente, deriva de tábula, mesa), mas nos tempos clássicos se manteve a memória do tempo em que o tablinum era o quarto do senhor e da dona da casa".

11 FERRARA, D.-DE CAROLIS, E.- ESPOSITO, F.: "Riflessioni sul sectile pavimentum del triclinio della Casa dell'Efebo a Pompei", en Rivista di Studi Pompeiani, 2017, pp. 17 ss., de especial interesse conhecer o interior da casa de um empresário pompeiano com uma visa social intensa, portanto preocupado com a decoração da sua casa, incluindo pavimentos, de forma a receber devidamente os seus concidadãos.

12 Em favor desta tese propensa a valor judicial: GEIB, G.: Geschichte des römische Criminalprozess, Buch. Weichmann, Leipzig, 1842, p. 82; ZUMPT, A. W.: Das Criminalrecht des römische Republik I, ed. Salzwasser, Berlín, 1865, p. 356; BONFANTE, P., Corso di diritto romano I, ed. A. Sampaolesi, Roma, 1925, pp. 74 ss.; DÜLL, R.: "Iudicium domesticum, abdicatio und apoceryxis", en ZSS 63, 1943, pp. 55 ss.; WESENER, G.: s.v. "Iudicium domesticum", en REPW 9, Stuttgart, 1962, p. 373.

13 Vid. al respecto, SACHERS, E.: s.v. "Potestas patria", en REPW 43, Munich, 1953, col. 1046 ss.; YARON, R.: "Vita Necisque Potestas", en Tijdschrift voor Rechtsgeschiedenis 30, 1962, p. 243: "Vita necisque potestas (vnp) has been aptly described as the core (Kernstück) of patria potestas, denoting the widest extent of the power enjoyed by the paterfamilias", destacando a seguir a unanimidade dos historiadores ao tratar da questão da vita necisque potestas independentemente das diferenças quanto ao tempo de seu desaparecimento.

14 GUARINO, A.: Diritto Privato Romano, 12ª ed., ed. Jovene, Nápoles, 2001, p. 533: "Che il paterfamilias non avesse autonomia di decisione e dovesse sottoporre le questioni da risolvere (e in particolare le decisioni punitive da prendere) ad un iudicium domesticum composto sotto la sua presidenza dai sottoposti più autorevoli, è una leggenda che le fonti attribuiscono ai più antichi tempi, ma che la critica storica ha ormai convincentemente sfatato. La verità è solo che il costume sociale, altamente civile, dei Romani tratteneva sin dai più antichi tempi i patres familiarum dal valersi effettivamente e drasticamente delle loro facoltà e li induceva altresì, con ogni probabilità, a consultarsi con i loro familiari: costume sociale ma non costume giuridico e perciò vincolante".

15 De cuya veracidad da cuenta GUARINO, A.: Il dossier di Lucrezia, en Pagine di diritto romano, IV, ed. Jovene, Nápoles, 1994, p. 216, en donde señala: "Il carattere eroico, che essi tentano in ogni modo di assegnare a Lucrezia, è contradetto dalla debolezza di lei nella notte della seduzione. Ben altrimenti, ripeto, avrebbe agito in quella notte una Lucrezia immaginaria, l'eroica Lucrezia del giorno dopo. Si rivela, dunque, se non vado errato, il nucleo di verità storica della narrazione famosa".

16 CENERINI, F.: La donna romana, ed. Il molino, Bolonia, 2009, p. 28: "Il figlio del re, Sesto Tarquinio, viene preso dal desiderio (mala libido) di violentare Lucrezia, eccitato dalla sua belleza e dalla sua spectata castitas (comprovata moralità)".

17 Cujo relato nos oferece Lívio, I. 58. 1-6, onde fala do crime cometido mas com uma requintada oratória que procura respeitar ao máximo Lucrécia na sua dor, com uma falta de eloquência que não é própria de Lívio17, mas do terrível acontecimento que teve de narrar.

18 DONALDSON, I.: The Rapes of Lucretia: AMyth and its Transformations, Oxford University Press, Oxford, 1982, p. 4: "At first he attempted to seduce the startled Lucretia by promising that he would marry her and make her his queen; then he threataned her with death if she did not let him have this way. Finding her adamant, Tarquin then tried another tactic".

19 Como parente de Colatino, Sexto Tarquínio poderia ter alegado justificativa legal para tal assassinato; vid. WATSON, A.: Rome of the XII Tables: Persons and Property, Princeton University Press, Nueva Jersey, 1975, p. 36. Além disso, a relação sexual entre uma mulher casada e um escravo era considerada especialmente hedionda, como observa POMEROY, S. B.: Goddesses, Whores, Wives and Slaves: Women in Classical Antiquity, Random House, Nueva York, 1975, pp. 160-161.

20 Desde a época de Rômulo, uma lei regulamentava a situação da mulher adúltera, declarando que a mulher que cometesse adultério poderia ser punida com a morte, sendo o marido a pessoa competente para julgá-la e condená-la em processo familiar com parentes. Esta lei é indicada por Dionisio de Halicarnaso, 2. 25. 1-2.

21 Vid. sobre a legislação de Augusto: VOLTERRA, E.: "In tema di accusatio adulterii", en Studi Bonfante, 2, Milán, 1930, p. 109 ss., ahora en Scritti giuridici 1, Nápoles, 1991, p. 313 ss.; DAUBE, D.: "The accuser under the Lex Iulia de Adulteriis", en Salonica Congress of Byzantine Studies, Atenas, 1955, p. 8 ss., ahora en Collected Studies in Roman Law, 1, Frankfurt, 1991, p. 561 ss.; RABELLO, A.M.: "Il ius occidendi iure patris della lex Iulia de adulteriis coercendis e la vitae necisque potestas del paterfamilias", en Atti Sem. Rom. Intern., Perugia, 1972, p. 228 ss.; ALBANESE, B.: Vita necisque potestas paterna e lex Iulia de adulteriis coercendis, en Studi Mussotto, 2, Palermo, 1980, p. 5 ss., ahora en Scritti, 1, Palermo, 1991, p. 1487 ss.; RUSSO RUGGERI, C.: "Qualche osservazione in tema di ius occidendi ex lege Iulia de adulteriis coercendis", en BIDR, 92-93, 1989-1990, p. 93 ss.; LAMBERTINI, R.: "Ancora sui leggitimati a uccidere iure patris ex lege Iulia de adulteriis", en SDHI, 58, 1992, p. 362 ss.; RIZZELLI, G.: Lex Iulia. Studi sulla disciplina di adulterium, lenocinium, stuprum, ed. Grifo, Lecce, 1997, passim; SPAGNUOLO VIGORITA, T.: "La data della lex Iulia de adulteriis", en Iuris Vincula, Studi Talamanca, 8, Nápoles, 2001, p. 81 ss.; SANNA, M.V.: "Matrimonium iniustum, accusatio iure viri et patris e ius occidendi", en AUPA, 54, 2010-2011, p. 203 ss.; id., Matrimonio e altre situazioni matrimoniali nel diritto romano classico. Matrimonium iustum-matrimonium iniustum, ed. Jovene, Nápoles, 2012, p. 93 y ss.; TORRENT, A.: "Derecho penal matrimonial romano y poena capitis en la represión del adulterium", en RIDROM, outubro de 2016, pp. 242 ss.

22 O consentimento de Lucrécia, obtido por meio de intimidação ou força moral para atingir o fim, pode ser tomado como antecedente da actio quod metus causa, ação pretoriana instituída por volta do ano 80 a.C. pelo pretor Otávio -daí o nome fórmula otaviana- para proteger a vítima de um ato de violência ou metus, dirigido contra o autor de tal violência ou medo; CALORE, E.: 'Actio quod metus causa'. Tutela della vittima e azione in rem scripta, ed. Giuffré, Milán, 2011, passim.

23 CARCOPINO, J.: La vida cotidiana en Roma en el apogeo del Imperio, cit., p. 45: "A domus, que apresenta uma parede cega e sólida para a rua, abre todas as suas aberturas para os pátios interiores".

24 PAVÓN, P.: "Valerio Máximo y la asimetría sexual en la severidad del castigo", em Latomus 67, 3, 2008, p. 691: "O excesso de zelo na preservação da honra familiar está amparado em antigas leis e costumes e recai sempre sobre a parte mais fraca, a mulher", onde considera que a pena por suspeita de ato desonroso cometido por mulher foi sempre excessiva, mas necessária de acordo com a mentalidade romana da época para preservar a honra da mulher junto com a do pai, a do marido, a de sua família e a de sua comunidade".

25 GRIMAL, P.: "La civilización romana, cit., p. 243: "Assim era a casa clássica. Hoje parece comprovado que originalmente não era uma casa de cidade, mas uma habitação camponesa, e que sua evolução consistiu em se adaptar gradualmente às condições urbanas. Admite-se que o átrio, com o seu tanque central, deriva do pátio interior que encontramos nas villae rusticae. Esta teoria parece ser ilustrada e demonstrada pelas descobertas do Fórum Romano, onde, de fato, foram descobertos vestígios de casas de pedra na antiga necrópole vizinha ao templo de Antonino e Faustina, em que a sala, uma simples cabana retangular, é precedida por um pátio. Mas é provável, ao mesmo tempo, que essa evolução não tenha sido tão simples como às vezes se pensa. Outras influências puderam mediar para dar ao átrio as funções que -como vimos- tem e a aparência que era conhecido nos tempos clássicos".

26 Cic. De offic.1. 121: Quod si una tantum adhibendum est diligens, ut homines in hospitium aut in convivium honestum accipiantur et in hospitis tum aut in convivio domus eadem liberalitas et largitas sit, tum quidem est ea quaedam hospitalitas in domo civis, quae tum etiam Gracis hospitibus vis est, no sentido de que se se deve ter diligência em alguma coisa, é precisamente ao receber as pessoas respeitosamente em casa ou num banquete, pois nesse momento deve haver a mesma generosidade e espaço para hóspedes e convidados da casa, o que é uma espécie de hospitalidade cidadã, apreciada também pelos hóspedes gregos.

27 DE WITT, N.W.: "The Primitive Roman Household", en The Classical Journal, 15, 4, 1920, p. 220: "Touching the Roman impluvium, few will be content to believe that it existed merely as an inlet for the rain, hardly a desirable thing", observando que poucos se contentarão em acreditar que existiu simplesmente como uma entrada de chuva.

28 Vitrubio, Los diez libros de Arquitectura, cit., 6.5.1, p. 76: "Após definir a orientação mais adequada, toda a atenção deve ser dada aos edifícios privados, às diferentes regras que devem ser observadas para localizar os quartos privados e exclusivos da família e, por outro lado, as salas que também serão comuns para visitas. Nos quartos privados, é permitida somente a entrada de convidados, não todo mundo, como quartos, triclínios, banheiros e outros quartos que tenham finalidade semelhante. Chamam-se salas comuns às quais qualquer pessoa da vila tem acesso, por direito próprio, e mesmo sem ser convidado, como vestíbulos, átrios, peristilos e outras salas cuja utilização e finalidade sejam semelhantes".

29 Esse tipo de construção era característico das fazendas rurais, as quais tinham um alto retorno econômico e não invejavam em nada a vida na cidade, usufruindo das margens econômicas geradas pela exploração das grandes propriedades de que dispunham; vid. al respecto, CAPOGROSSI COLOGNESI, L.: L'agricoltura romana. Guida storica e critica, ed. Laterza, Roma-Bari, 1982, passim; A. DI PORTO, "L'impresa agricola nel periodo imprenditoriale", en CERAMI, P.- DI PORTO, A.- PETRUCCI, A.:  Diritto commerciale romano. Profilo storico 2, ed. Giappichelli, Turín, 2004, pp. 301 ss.

30 BEARD, M.: Pompeya. Historia y leyenda de una ciudad romana, trad. esp., ed. Crítica, Barcelona, 2008, passim, refere claramente que Pompeia era uma cidade cheia de surpresas, com informações muito valiosas sobre a realidade imobiliária no mundo romano, sintetizando na p. 85 a possível situação residencial de um habitante pompeiano: "É fato que as famílias particularmente ricas tinham muito espaço em suas grandes mansões e palácios: quartos privados e silenciosos, jardins sombreados, salas de jantar espetaculares e até banheiros privativos. Embora não pertencessem a essa classe, outras pessoas viviam confortavelmente em casas de seis cômodos. À medida que descemos na escala de riqueza, muitos moradores da cidade viviam em um único cômodo acima do negócio que dirigiam, loja, taverna ou oficina, sem água corrente e, muitas vezes, sem meios de aquecimento ou cozinha, exceto talvez uma pequena fogueira (que representaria um sério risco de incêndio). A acomodação apertada para uma pessoa é um tipo de moradia que forneceria pouco mais do que um quarto escasso para uma família de três ou quatro pessoas".

31 CALZA, G.: Scavi di Ostia, vol.1, Topografia Generale, Libreria dello Stato, Roma, 1953; J. E. PACKER, The insulae of Imperial Ostiae, en MAAR 31, 1971, pp. 65-71.

María José Bravo Bosch

María José Bravo Bosch

Profesora Titular de Universidad. Facultad de Ciencias Jurídicas y del Trabajo. Departamento de Derecho Privado. Área de Derecho Romano. Universidad de Vigo. Acreditada a Catedrática. Diciembre 2022. Directora de 4 tesis doctorales, todas ellas con la máxima calificación. Dirige en la actualidad otras tres tesis doctorales. Autora de 5 libros, y coautora de otros 8 libros, siempre en relación con el Derecho Romano. Ha escrito más de 100 artículos y capítulos de libro, en español, inglés e italiano.

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