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Carros híbridos com neutralização de carbono no Brasil

Valdir Bhering

As indústrias automotivas priorizam soluções sustentáveis para reduzir emissões. Enquanto globalmente os carros elétricos ganham destaque, no Brasil, os híbridos são foco, especialmente os flex, que combinam eficiência de combustível com redução de emissões, sendo o etanol considerado um recurso de baixo carbono devido ao ciclo fechado de carbono.

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Atualizado às 08:39

Atualmente, cada vez mais as indústrias automotivas estão buscando por soluções eficientes e limpas, objetivando a redução de impactos ambientais provenientes da emissão de gases do efeito estufa e sua consequente pegada de carbono. Nesse contexto, carros com propulsão 100% elétricos ou híbridos, que combinam a tecnologia dos motores a combustão interna com a propulsão elétrica, tem se destacado como uma alternativa para reduzir os impactos ambientais e garantir a mobilidade do futuro. Embora atualmente, em termos globais a atenção esteja mais voltada para o desenvolvimento de veículos 100% elétricos, no Brasil, a atenção está mais voltada aos veículos híbridos.  

Inicialmente sendo empregados apenas em conjunto com gasolina ou diesel, os carros híbridos proporcionam considerável economia de combustível, reduzindo assim a emissão de poluentes na atmosfera. Atualmente, além de gasolina e diesel, é possível encontrarmos carros híbridos Flex, movidos tanto à gasolina quanto ao etanol, o que proporciona uma redução ainda maior na pegada de carbono desse tipo de carro híbrido. Isso se deve ao ciclo fechado de carbono presente no etanol, uma vez que a cana-de-açúcar ou milho, ou ainda outros vegetais, absorve CO2 da atmosfera durante o seu crescimento, compensando as emissões liberadas durante a queima desse combustível. Dessa forma, o etanol é considerado um recurso de baixo carbono, contribuindo significativamente para a redução das emissões de gases de efeito estufa. 

Como se sabe, o Brasil é um dos maiores produtores de etanol no mundo, e conta com uma infraestrutura bastante desenvolvida de produção e distribuição deste combustível. Embora os motivos para isso, inicialmente não estavam relacionados com a questão ambiental. No Brasil, na década de 1970, por conta das consequências das crises do petróleo de 1973 e 1979, foi implementado o Programa Nacional do Álcool (Proálcool), cujo objetivo era diminuir a dependência brasileira do petróleo mundial por meio do impulsionamento da produção de etanol a partir da cana-de-açúcar como solução alternativa aos combustíveis derivados do petróleo. No entanto, pode-se dizer que hoje, a questão ambiental é um fator preponderante para o uso do etanol como fonte alternativa de combustíveis veiculares no Brasil.  

Vale ressaltar que o etanol é considerado um combustível renovável, e sua combustão é acentuadamente menos poluente em relação aos combustíveis fósseis. A combustão do etanol libera menos gases nocivos, como dióxido de carbono (CO2), óxidos de nitrogênio (NOx) e material particulado, o que contribui para a melhoria da qualidade do ar e reduz os impactos negativos na saúde pública. Além disso, o uso do etanol como combustível traz benefícios econômicos e sociais, impulsionando o setor agrícola e a geração de empregos no campo. 

Adicionalmente, quando consideramos a redução de pegada de carbono de carros híbridos movidos a etanol no Brasil, outro fator inerente ao Brasil e que possui contribuição importante no cômputo dessa pegada de carbono é o fato de que a matriz energética brasileira ser majoritariamente de fontes limpas e renováveis. Um estudo realizado pela Stellantis (conglomerado dona de marcas como Fiat, Jeep, Citroën e Peugeot) em parceria com a Bosch apresentou que o carro híbrido movido a etanol no Brasil possui uma pegada de carbono menor do que a de um carro elétrico que roda na Europa. Em 240,49 km rodados, o carro a etanol emitiu 25,79 kg de CO2. O número para o veículo elétrico em ciclo europeu foi de 30,41 kg e para a gasolina, de 60,64 kg. 

E por conta dessa menor pegada de carbono, tudo indica que os veículos híbridos no Brasil serão movidos a etanol (ou pelo menos contemplarão essa possibilidade - Flex). Dados divulgados pela Anfavea indicam que cerca de 90% dos veículos leves (não híbridos) em 2020 já eram Flex. E algo que corrobora essa afirmação é que a Volkswagen e a Stellantis anunciaram investimentos bilionários (7 bilhões e 16 bilhões de reais, respectivamente) nos próximos anos para desenvolver e produzir veículos híbridos movidos a etanol no Brasil. A Toyota, que atualmente já conta com um veículo híbrido Flex (movido a gasolina e/ou etanol - Corolla Cross Hybrid), também anunciou um investimento da ordem de 1,7 bilhões de reais para a produção de um novo carro híbrido Flex no Brasil. As montadoras chinesas também não ficaram atrás, GWM, BYD e Higer Bus anunciaram aportes que somam mais de 20 bilhões de reais a serem investidos no Brasil até 2026.  

Por mais que o foco global esteja voltado aos veículos 100% elétricos, isso não significa que os híbridos perderão mercado, muito pelo contrário. De acordo com dados disponibilizados pela Precedence Research, que é uma organização mundial de consultoria e pesquisa de mercado, o tamanho de mercado de veículos híbridos no mundo todo deve atingir até o final de 2023 um valor próximo a 82 bilhões de dólares (432 bilhões de reais). Ainda, segundo a referida organização, estima-se que o tamanho de mercado de veículos híbridos deve atingir cerca de 444 bilhões de dólares (2,182 trilhões de reais) em 2032. 

Como mencionado anteriormente, em termos globais, o foco da indústria automotiva está mais voltado para o investimento em veículos elétricos a bateria, o Brasil sendo um dos poucos países em que as empresas estão priorizando o investimento nos veículos híbridos. Dessa forma, pode-se dizer que, pelo menos relativamente, o Brasil terá uma fatia maior no mercado de veículos híbridos.  

E todas essas empresas estão contando com uma bela ajuda por parte da Toyota, que com o objetivo de fomentar ainda mais o desenvolvimento da tecnologia aplicada a veículos híbridos, em 2019, informou que licenciaria de forma gratuita até 2030 muitas de suas patentes direcionadas aos veículos híbridos. A Toyota disse que concederia licenças para quase 24.000 patentes sobre tecnologias usadas em seu Prius, o primeiro carro "verde" produzido em massa no mundo, e se ofereceria para fornecer aos concorrentes componentes, incluindo motores, conversores de energia e baterias usadas em seus veículos com emissões mais baixas. 

Com relação ao desenvolvimento tecnológico dos veículos híbridos, segundo o estudo "The global patents dataset on the vehicle powertrains of ICEV, HEV, and BEV" publicado em outubro de 2020, de acordo com dados obtidos utilizando o "Thomson Reuters' Derwent Innovations Index (DII)", foram concedidas cerca de 10888 patentes relacionadas à veículos híbridos entre 1985 e 2016.  

Utilizando o citado índice, em uma metodologia de pesquisa semelhante, e adicionando o termo etanol ou álcool em conjunto com os demais termos empregados na pesquisa, o número de resultados diminui bastante, para apenas 134, o que pode ser um indicativo de que o desenvolvimento de tecnologias relacionadas com veículos híbridos movidos a etanol ainda é bastante incipiente, e tem ainda bastante espaço para crescimento. 

Vale destacar ainda que os avanços tecnológicos nos carros híbridos não estão limitados à apenas ao tipo de combustível utilizado. No geral, os avanços tecnológicos têm sido impressionantes, permitindo uma integração mais eficiente entre os motores de combustão interna e elétricos. Os veículos híbridos atuais utilizam sistemas de propulsão inteligentes que alternam entre o motor elétrico e o motor a combustão, otimizando o consumo de combustível e o desempenho. As baterias também estão em constante desenvolvimento, proporcionando cada vez mais uma maior capacidade de armazenamento de energia e uma vida útil mais longa, permitindo uma maior autonomia elétrica. Os sistemas de regeneração de energia, como o freio regenerativo, também têm sido incorporados, aproveitando a energia cinética para recarregar a bateria, tornando os carros híbridos ainda mais eficientes. Além disso, as tecnologias de gerenciamento eletrônico têm se aprimorado, possibilitando um controle mais preciso do fluxo de energia entre os motores e maximizando a eficiência do conjunto híbrido. A conectividade e a digitalização dos veículos também têm contribuído para uma melhor experiência do usuário e para a otimização do consumo de combustível. 

Em vista do exposto, pode-se concluir que os veículos híbridos representam uma resposta inteligente e sustentável aos desafios do setor automotivo no século XXI. No Brasil, o etanol tem um papel significativo nessa equação, impulsionando a mobilidade verde e contribuindo para a redução das emissões de carbono. Com avanços tecnológicos constantes, a incorporação de recursos de última geração tem permitido que os veículos híbridos sejam cada vez mais eficientes, econômicos e "amigáveis" ao meio ambiente. A convergência entre a tradição do etanol e a inovação dos motores elétricos é a chave para um futuro promissor, no qual a mobilidade e a sustentabilidade caminham juntas. 

Valdir Bhering

Valdir Bhering

Especialista de Patentes da Daniel Advogados.

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