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Subvenções para investimento e o crédito fiscal: para onde tudo isso caminha?

Com a promulgação da lei 14.789/23, uma alteração significativa ocorreu para as empresas optantes pelo Lucro Real que se beneficiam de incentivos fiscais do ICMS, especialmente do crédito presumido, o que certamente aumentará a carga tributária para essas pessoas jurídicas.

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

Atualizado às 14:21

Até o final de 2023, as empresas que tinham o direito de usufruir de incentivos fiscais estaduais, especialmente relacionados ao ICMS, tinham a prerrogativa de não tributar esses incentivos. Isso se devia ao fato de que tais incentivos não eram considerados receitas tributáveis para a empresa, conforme estabelecido pela lei 12.973/14.

Segundo a legislação, os incentivos fiscais eram conhecidos como subvenções para investimento se o contribuinte cumprisse com alguns critérios contábeis e fiscais, sendo os principais: contabilização desses valores em uma conta separada no patrimônio líquido e a não distribuição como lucro para sócios ou acionistas, ou seja, essa receita oriunda dos incentivos fiscais deveria ser reinvestida na sociedade. 

Nesse sentido, o Art. 30 da lei 12.973/14 determinava que as subvenções para investimento não seriam tributadas pelo IRPJ e pela CSLL, o que trazia uma redução de carga tributária muito relevante para as empresas contribuintes do Lucro Real, pois, essas receitas, se observados os critérios legais, seriam uma exclusão na apuração dos tributos, reduzindo significativamente o valor devido à União. 

No entanto, o Governo Federal, ciente do impacto dessa redução de tributos para os cofres públicos, apresentou a Medida Provisória - MP 1.185/23, revogando o Artigo 30 da lei 12.973/14, transformando os incentivos fiscais concedidos por qualquer ente federativo (União, Estados ou Municípios) em uma receita tributada para a empresa, passando a atribuir um crédito fiscal sobre estes valores, cuja concessão oferece alguns obstáculos. 

Nesse sentido, esse crédito fiscal será calculado sobre o valor das receitas oriundas da concessão dos incentivos fiscais pelos estados, municípios ou pela própria União, observando o disposto no Art. 8º, da lei 14.789/23, ou seja, a própria lei traz uma limitação para a base para cálculo do crédito fiscal.  

Explica-se: o estado que concede um incentivo fiscal de ICMS reduz o pagamento desse imposto através de crédito presumido, redução da base de cálculo ou diferimento, esse valor reduzido seria, nos termos da nova legislação, uma receita para a empresa que está no lucro real, pois ela deixou de pagar parte do ICMS devido. 

Agora, essa receita será tributada pelo IRPJ e pela CSLL, diferentemente do que ocorria anteriormente, acarretando um aumento significativo nos impostos devidos. Além disso, esses valores também serão tributados pelo PIS e pela COFINS, com alíquota nominal, totalizando uma carga tributária de aproximadamente 43% sobre as subvenções (IRPJ, CSLL, PIS e COFINS). 

Esse aumento da carga tributária irá impactar fortemente as empresas que faziam a apuração das subvenções, nos termos do Art. 30, da lei 12.973/14, e não tributavam essas receitas. O contribuinte deverá adicionar esses valores na apuração do PIS e da COFINS mensalmente e na apuração do Lucro Real Trimestral, a exceção é para a apuração por estimativa mensal do IRPJ e da CSLL, pois, neste caso, a tributação ocorrerá somente no ajuste anual.

No entanto, temos alguns pontos importantes para tratar sobre o assunto, os quais vão gerar uma série de discussões administrativas e judiciais. 

O primeiro deles trata da decisão do STJ no RESP 1.517.492/PR, o qual definiu que os créditos presumidos de ICMS não poderiam ser tributados pelo IRPJ e pela CSLL, pois este benefício concedido pelos estados seria uma transferência patrimonial do estado para o contribuinte, como forma de fomentar o desenvolvimento econômico. 

Para o STJ, a tributação dos créditos presumidos pela União ofenderia o pacto federativo e o princípio da imunidade recíproca, o que seria uma afronta ao nosso modelo constitucional, pois a União estaria interferindo em uma política econômica promovida pelo estado. 

Muitas empresas buscaram seus direitos junto ao judiciário, pleiteando a aplicação desse entendimento a todos os incentivos fiscais concedidos pelos estados. Contudo, o STJ, no Tema 1182, definiu que o é "impossível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS, - tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros - da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, salvo quando atendidos os requisitos previstos em lei (art. 10, da lei Complementar 160/17 e art. 30, da lei 12.973/14), não se lhes aplicando o entendimento firmado no ERESP 1.517.492/PR que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL".

Isso significa que, no entendimento do tribunal, somente o crédito presumido não seria tributado pelo IRPJ e pela CSLL, exceto se o contribuinte observasse os requisitos do Art. 30, da lei 12.973/14. 

Transportando essas premissas para a situação atual, a lei 14.789/23 revogou o Art. 30 da lei 12.973/14, o que acabou com a possibilidade de exclusão das subvenções da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, mas o STJ não fundamentou seu entendimento, no que tange aos créditos presumidos de ICMS, na lei 12.973/14, mas sim em uma questão constitucional. 

Logo, muitas empresas estão buscando a aplicação do entendimento do STJ (Tema 1182 e ERESP 1.517.492/PR) para fim de não tributar as receitas oriundas dos créditos presumidos utilizados pela pessoa jurídica. 

Nesse mesmo sentido, as pessoas jurídicas que já tinham decisões judiciais favoráveis, transitadas em julgado, que permitiam a não tributação do crédito presumido, em nome do pacto federativo e da imunidade recíproca, se perguntam se essas decisões permanecem válidas, tendo em vista o entendimento do STF sobre a quebra da coisa julgada em matéria tributária (temas 885 e 881). 

Não há garantias de que o judiciário manterá o entendimento do STJ no Tema 1182 ou se considerará que a lei 14.789/23 alterou o cenário a ponto de permitir a tributação, inclusive, das receitas oriundas de créditos presumidos concedidos pelos estados, mas o que podemos adiantar é que certamente a Receita Federal fiscalizará essas empresas e cobrará o IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre essas receitas. 

Temos uma série de argumentos para acreditar que o crédito presumido não deveria ser tributado pelo IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, especialmente pelo nosso arranjo político, que se fundamenta no princípio federativo, pois, permitir a tributação de uma receita que seria do estado pela União, é reduzir a política econômica idealizada pelos estados. 

Em relação aos demais incentivos fiscais (diferimento, redução da base de cálculo, alíquota reduzida e isenção), com a publicação da Lei n. 14.789/2023, seria muito difícil aplicar o entendimento do STJ no Tema 1182.

O segundo ponto que podemos citar é o conceito de receita para fins tributários (não contábeis). Os incentivos fiscais de ICMS não seriam uma receita oriunda da atividade da empresa, bem como não seriam uma receita financeira, nos termos da IN 1.700/17, Art. 144, o que pode ser um argumento condizente para a não tributação das subvenções. 

Sobre o PIS e a COFINS, teremos muitas discussões sobre a tributação desses valores, pois, segundo o CPC 07, os benefícios fiscais de ICMS, que foram classificado como subvenções, deveriam ser contabilizados como uma receita para a empresa, mas qual seria a classificação dessas receitas? Seria uma receita tributada pela alíquota nominal das contribuições ou seria uma receita financeira? De acordo com as regras do imposto de renda, esses valores poderiam ser classificados como outras receitas, não como receitas financeiras. 

Agora, o que temos certeza é que a Receita Federal vai exigir que os contribuintes contabilizem todos os incentivos fiscais de ICMS (diferimento, isenção, redução da base de cálculo, alíquota reduzida e crédito presumido) como uma receita tributada para fins de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.

Logo, se a empresa não aproveitou para deduzir esses valores no passado, por falta de contabilização correta, ela terá que corrigir isso para fins de tributação futura. Em alguns casos, ainda é possível recuperar os valores não contabilizados no passado, com um limite de até cinco anos.

Além desses pontos, vale mencionar que a utilização do crédito fiscal trazido pela lei 14.789/23 será muito complexa, dadas as exigências da legislação e da IN 2.170/23, e o valor será consideravelmente inferior aos benefícios proporcionados pela exclusão dos créditos presumidos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Assim, a empresa que pretende pleitear a aplicação do entendimento do STJ (exclusão dos créditos presumidos de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL) ao seu caso em concreto deverá ficar atenta a habilitação do crédito fiscal (nos termos da lei 14.789/23), especialmente pela impossibilidade de aproveitamento dos dois incentivos. 

Sendo assim, o que podemos adiantar é que teremos muitos litígios sobre o assunto, seja pela mudança da legislação e afronta ao entendimento do judiciário seja por questões conceituais e de ofensa aos princípios constitucionais, mas o que temos certeza é que, enquanto esses litígios perdurarem, muitas empresas terão um aumento significativo na carga tributária (aproximadamente 43%) dos tributos federais. 

Por fim, como dito infinitamente nas mídias, a Receita Federal vem fiscalizando com muito afinco a tributação dos incentivos fiscais de ICMS, o que certamente será intensificado neste ano, considerando a nova legislação. Assim, é fundamental reforçar a vigilância por parte das empresas diante das mudanças legislativas e a necessidade de preparação para possíveis litígios.

Bruna Kanning

VIP Bruna Kanning

Consultora e Advogada Tributarista com mais de 3 anos de experiência. Especialista em direito tributário, com foco em planejamento tributário e defesas administrativas.

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