Interoperabilidade e propriedade intelectual em sistemas robóticos
A interoperabilidade e a proteção da propriedade intelectual são desafios para o avanço da robótica no Brasil. Analisamos como o país pode superar esses obstáculos, inspirado nas propostas europeias.
sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025
Atualizado às 13:28
A robótica e a IA - inteligência artificial estão transformando setores como saúde, transporte e indústria, mas também trazem desafios jurídicos e técnicos complexos. Um dos principais desafios é garantir a interoperabilidade entre sistemas robóticos, ou seja, a capacidade de diferentes sistemas trabalharem em conjunto de forma eficiente. No entanto, a interoperabilidade esbarra em questões de propriedade intelectual, especialmente no que diz respeito ao acesso a códigos-fonte e à proteção de patentes. Enquanto a Europa avança na criação de normas que equilibram a interoperabilidade e a proteção da propriedade intelectual, o Brasil ainda carece de um marco regulatório robusto para lidar com esses desafios. Este artigo analisa como o Brasil pode superar esses obstáculos, inspirado nas propostas europeias.
A importância da interoperabilidade e os desafios da propriedade intelectual
A interoperabilidade é essencial para o desenvolvimento de sistemas robóticos eficientes e seguros. Ela permite que diferentes sistemas, desenvolvidos por diferentes fabricantes, trabalhem em conjunto, compartilhando dados e funcionalidades. No entanto, a interoperabilidade esbarra em questões de propriedade intelectual, especialmente no que diz respeito ao acesso a códigos-fonte e à proteção de patentes.
Na Europa, a Diretiva de Direitos Autorais no Mercado Único Digital (2019/790) estabelece normas para garantir a interoperabilidade entre sistemas digitais, incluindo sistemas robóticos, sem prejudicar a proteção da propriedade intelectual. A diretiva prevê que os desenvolvedores de sistemas digitais devem garantir a interoperabilidade, fornecendo informações técnicas e códigos-fonte quando necessário, desde que isso não prejudique a proteção de direitos autorais e patentes.
No Brasil, a lei de propriedade industrial (lei 9.279/1996) e a lei de direitos autorais (lei 9.610/1998) protegem os direitos de propriedade intelectual, mas não estabelecem normas específicas para a interoperabilidade entre sistemas robóticos. Isso gera incertezas jurídicas e pode dificultar o desenvolvimento de sistemas robóticos interoperáveis.
Lições da Europa: Equilíbrio entre interoperabilidade e propriedade intelectual
A experiência europeia mostra que é possível equilibrar a interoperabilidade e a proteção da propriedade intelectual. A Diretiva de Direitos Autorais no Mercado Único Digital estabelece que os desenvolvedores de sistemas digitais devem garantir a interoperabilidade, fornecendo informações técnicas e códigos-fonte quando necessário, desde que isso não prejudique a proteção de direitos autorais e patentes.
Além disso, a Agência Europeia para a Robótica e Inteligência Artificial tem competências para supervisionar o desenvolvimento e uso de sistemas robóticos, garantindo que as normas de interoperabilidade e propriedade intelectual sejam cumpridas.
No Brasil, o PL 2338/23, aprovado no Senado, já prevê a necessidade de garantir a interoperabilidade entre sistemas de IA (art. 19). No entanto, o projeto não estabelece normas específicas para o acesso a códigos-fonte e a proteção de propriedade intelectual, o que pode gerar incertezas jurídicas e dificultar o desenvolvimento de sistemas robóticos interoperáveis.
Propostas para o Brasil: Garantir a interoperabilidade sem prejudicar a propriedade intelectual
Para superar os desafios da interoperabilidade e da propriedade intelectual no Brasil, é necessário adotar medidas que equilibrem os interesses dos desenvolvedores de sistemas robóticos e a proteção dos direitos de propriedade intelectual. Algumas propostas incluem:
- Estabelecer normas específicas para a interoperabilidade entre sistemas robóticos, garantindo que os desenvolvedores forneçam informações técnicas e códigos-fonte quando necessário, desde que isso não prejudique a proteção de direitos autorais e patentes;
- Criar uma agência reguladora para robótica e IA, nos moldes da proposta europeia, com competências para supervisionar o desenvolvimento e uso de sistemas robóticos, garantindo que as normas de interoperabilidade e propriedade intelectual sejam cumpridas;
- Promover a cooperação entre os setores público e privado, incentivando o desenvolvimento de sistemas robóticos interoperáveis e a proteção dos direitos de propriedade intelectual;
- Garantir a proteção dos direitos de propriedade intelectual, em conformidade com a lei de propriedade industrial e a lei de direitos autorais, mas estabelecendo exceções para garantir a interoperabilidade entre sistemas robóticos.
Desafios e viabilidade da implementação no Brasil
A implementação de normas que garantam a interoperabilidade entre sistemas robóticos no Brasil enfrenta desafios, como a necessidade de recursos financeiros e humanos especializados, a complexidade das tecnologias envolvidas e a resistência de setores da indústria. No entanto, a experiência europeia mostra que é possível superar esses desafios, garantindo a interoperabilidade e a proteção da propriedade intelectual.
O PL 2338/23 já estabelece algumas das competências necessárias para a regulação da IA, mas a criação de uma agência específica permitiria maior especialização e eficiência. Além disso, a agência poderia atuar em conjunto com outras autoridades reguladoras, como a ANPD - Autoridade Nacional de Proteção de Dados e a ANATEL - Agência Nacional de Telecomunicações, para garantir uma regulação integrada e eficiente.
Conclusão
A interoperabilidade e a proteção da propriedade intelectual são desafios cruciais para o avanço da robótica no Brasil. A experiência europeia mostra que é possível equilibrar esses interesses, garantindo a interoperabilidade entre sistemas robóticos sem prejudicar a proteção dos direitos de propriedade intelectual.
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1 BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996. Lei de Propriedade Industrial.
2 BRASIL. Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Lei de Direitos Autorais.
3 EUROPEAN PARLIAMENT. Directive (EU) 2019/790 on copyright and related rights in the Digital Single Market.
4 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2020.
5 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 32ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
6 TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. 5ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2019.
7 BRASIL. Projeto de Lei 2338/23. Dispõe sobre o uso da Inteligência Artificial.