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Cancelamento de plano de saúde sem aviso prévio: Direitos do segurado

Cancelamento de plano de saúde de forma unilateral. Prejuízos e providências.

quinta-feira, 24 de abril de 2025

Atualizado às 14:19

O acesso à saúde é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal de 1988, no art. 6º e, mais especificamente, no art. 196, que prevê:

"A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação."

No contexto da saúde suplementar, os planos e seguros de saúde desempenham papel essencial para o exercício efetivo desse direito. Contudo, muitas vezes, beneficiários são surpreendidos com o cancelamento unilateral do plano de saúde, sem qualquer aviso prévio ou justificativa, o que pode causar graves prejuízos, especialmente em situações de tratamento médico em curso.

1. Previsão legal e regulamentar

O cancelamento do contrato de plano de saúde está regulamentado pela lei 9.656/1998, que trata dos planos e seguros privados de assistência à saúde. A legislação estabelece limites claros para o encerramento do vínculo contratual, especialmente nos contratos individuais ou familiares.

Segundo o art. 13, inciso II, da referida lei:

"É vedada a suspensão ou rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja notificado até o quinquagésimo dia de inadimplência."

Portanto, a lei não permite o cancelamento sem justa causa, tampouco sem notificação prévia, mesmo em caso de inadimplência.

Adicionalmente, a ANS, por meio da RN 563/22, reforça o dever de notificação prévia ao beneficiário em caso de inadimplência e necessidade de rescisão contratual.

2. Entendimento jurisprudencial do STJ

O STJ já consolidou entendimento no sentido de proteger o consumidor contra cancelamentos abusivos e unilaterais de plano de saúde, especialmente em contratos individuais ou familiares.

Jurisprudência relevante:

  • STJ - AgRg no AREsp 1.015.313/SP

"A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que é abusiva a rescisão unilateral do contrato de plano de saúde individual sem a demonstração de inadimplemento por parte do consumidor e sem a devida notificação prévia."

  • STJ - REsp 1.487.229/SP

"A rescisão unilateral do contrato de plano de saúde, sem demonstração de inadimplemento e sem notificação do consumidor, é abusiva, pois coloca o consumidor em desvantagem excessiva e fere o princípio da boa-fé contratual."

  • STJ - AgInt no AREsp 1.211.676/SP

"É abusiva a rescisão imotivada de contrato de plano de saúde individual ou familiar por parte da operadora, devendo ser preservado o equilíbrio contratual e a continuidade do tratamento médico do beneficiário."

3. Princípios do direito do consumidor aplicáveis

A relação entre beneficiário e operadora de plano de saúde é regida pelo CDC, conforme pacífica jurisprudência do STJ.

Dentre os princípios aplicáveis, destacam-se:

  • Boa-fé objetiva (art. 4º, III e art. 51, IV do CDC);
  • Equilíbrio contratual (art. 6º, V);
  • Proibição de cláusulas abusivas (art. 51, IV e §1º, I);
  • Direito à informação adequada (art. 6º, III).

A ausência de notificação prévia infringe esses princípios, deixando o consumidor em posição de extrema vulnerabilidade, especialmente quando há tratamentos médicos em andamento.

4. Cancelamento em contratos coletivos

Nos contratos coletivos, principalmente por adesão, é comum a operadora rescindir o contrato por decisão da pessoa jurídica contratante. No entanto, mesmo nesses casos, o STJ reconhece abusividade em cancelamentos imotivados e sem aviso prévio, sobretudo quando há tratamento contínuo.

  • STJ - REsp 1.708.429/SP

"A rescisão imotivada de contrato coletivo de plano de saúde, sem prévia notificação do beneficiário e em curso de tratamento, pode configurar abuso de direito, passível de controle judicial."

5. Direitos do segurado

Diante de um cancelamento indevido ou sem notificação, o segurado pode:

  • Requerer a manutenção do contrato;
  • Exigir indenização por danos morais e materiais, quando demonstrado prejuízo concreto;
  • Obter liminar judicial para restabelecimento do plano, especialmente em casos de urgência ou continuidade de tratamento.

Conclusão

O cancelamento unilateral e sem aviso prévio do plano de saúde é vedado pela legislação e rechaçado pela jurisprudência. A proteção do consumidor, especialmente em contextos de vulnerabilidade decorrente de enfermidade, exige que operadoras atuem com transparência, boa-fé e respeito aos direitos contratualmente assumidos.

O Judiciário tem reafirmado seu papel de garantidor da dignidade do consumidor, impedindo práticas abusivas e assegurando a continuidade da assistência à saúde.

Raquel de Oliveira Mascarenhas

Raquel de Oliveira Mascarenhas

Advogada | Direito á saúde Sua saúde é um direito Atendimento em todo o Brasil

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