O risco oculto da equiparação hospitalar tributária
Clínicas médicas têm buscado a equiparação hospitalar para redução de impostos, mas ignorar os requisitos estruturais e jurídicos pode gerar multas, autuações e anulação do benefício.
segunda-feira, 28 de abril de 2025
Atualizado às 11:55
Nos últimos anos, a equiparação hospitalar tem sido a solução adotada por muitas clínicas médicas para reduzir a carga tributária, sobretudo no que se refere ao IRPJ - Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e à CSLL - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.
O benefício é real, mas os riscos, quando ignorados, também são e podem transformar uma economia de curto prazo em um prejuízo de longo prazo.
A Receita Federal permite que clínicas médicas sejam equiparadas a hospitais quando atendem a determinados critérios de estrutura e funcionamento. O problema é que, muitas vezes, a busca pelo benefício é feita com base apenas em uma interpretação superficial da legislação, sem que sejam preenchidos os requisitos mínimos exigidos.
Entre os principais pontos negligenciados estão:
- Ausência de alvará sanitário atualizado e regular;
- Desalinhamento entre o CNAE da clínica e o objeto da equiparação;
- Ausência de contratos formais com profissionais da saúde e responsáveis técnicos.
Para que uma clínica possa usufruir da redução de impostos no regime de lucro presumido, como a aplicação das alíquotas de 8% para o IRPJ e 12% para a CSLL, é necessário que ela preste serviços hospitalares, conforme previsto no art. 15, §1º, inciso III, da lei 9.249/1995.
Mas o que exatamente são considerados "serviços hospitalares"?
Esse conceito foi definido pelo STJ no julgamento do REsp 1.116.399, julgado sob a sistemática dos recursos repetitivos, que tem força vinculante para outros processos semelhantes. De acordo com a tese fixada, a interpretação deve ser objetiva, ou seja, baseada no tipo de atividade efetivamente realizada pelo contribuinte, não basta se autodeclarar hospitalar, é preciso comprovar a natureza dos serviços prestados.
Além disso, para fatos ocorridos após a lei 11.727/2008, a Receita Federal e o STJ passaram a exigir que:
- A empresa esteja registrada como sociedade empresária;
- Cumpra integralmente as normas da Anvisa, especialmente no que diz respeito à estrutura física e à prestação de serviços de saúde em ambiente controlado e adequado.
Um exemplo importante envolve clínicas odontológicas. Diversas decisões judiciais têm entendido que não basta ser uma clínica com equipamentos modernos ou realizar procedimentos mais complexos. O benefício fiscal só se aplica quando a clínica não atua exclusivamente com consultas e procedimentos simples, mas sim presta serviços verdadeiramente hospitalares, como sedação assistida, internação breve, centro cirúrgico, sala de recuperação, equipe multidisciplinar, entre outros. Caso esses critérios sejam cumpridos, aí sim é possível aplicar as alíquotas reduzidas de 8% e 12% sobre a receita bruta com exceção dos serviços comuns, como consultas odontológicas, que devem ser tributados separadamente.
Em resumo, a equiparação exige organização empresarial e adequação sanitária comprovada.
Por isso, é fundamental que a busca pela equiparação hospitalar venha acompanhada de um diagnóstico técnico e jurídico, que avalie os contratos, os documentos sanitários e o enquadramento tributário da clínica.
Como atuante na área, tenho visto muitos estabelecimentos que "aderem" à equiparação sem saberem exatamente o que isso significa na prática e acabam descobrindo, tardiamente, os custos dessa decisão.
A regularização sanitária e o compliance jurídico são a base de qualquer estratégia tributária sustentável no setor da saúde.


