A prova técnica na lei de alienação parental
Aborda a necessidade de que seja exigida a qualificação técnica do perito psicólogo nos processos em que se apura a prática do ato de alienação parental.
segunda-feira, 12 de maio de 2025
Atualizado às 14:00
Nosso ordenamento dispõe que o juiz deverá ser assistido por perito quando a prova para solução do litígio depender de conhecimento técnico ou científico não disponível ao conhecimento do homem comum (156, caput e §1º, CPC). Portanto, a comprovação do conhecimento técnico-científico compatível com o objeto periciado é imprescindível para atuação do expert e para validade da prova produzida, impondo que, na ausência dessa comprovação, o próprio juízo promova a substituição do técnico (468, I, CPC).
Por exemplo, em um processo onde se alega violência obstétrica contra a mulher, em que é necessário que se apure irregularidade na conduta médica dispensada à gestante e à criança no pré-parto, durante o parto e no pós-parto, deve ser exigido que o perito comprove especialização em obstetrícia. Dependendo da hipótese, às vezes em mais de uma área (obstetrícia e ortopedia, por exemplo). O não atendimento aos ditames legais, configura violação dos princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, além de significar a não prestação da jurisdição de forma adequada.
Obviamente que o próprio juízo deve fazer cumprir os ditames legais do CPC, exigindo a demonstração da qualificação técnica-científica do profissional, já que é seu auxiliar (465, CPC). No entanto, não o fazendo, a parte deverá questionar quando tiver ciência da sua nomeação (465, §1º, CPC). Alguns julgados afastam essa regra admitindo o questionamento posterior, desde que seja o primeiro momento processual em que a parte teve ciência de quem é o nomeado, ou no primeiro momento que teve ciência efetiva da ausência de qualificação.
Esse último é o entendimento que melhor se coaduna com os princípios constitucionais que regem o processo civil: contraditório participativo, e a solução justa e adequada da lide, todos densificadores do acesso à justiça sob o aspecto material, afastando um arremedo de acesso à justiça, que ocorre quando um oftalmologista é nomeado para avaliação de erro médico em cirurgia no pâncreas, por exemplo.
Aliás, não tendo expertise na matéria, o próprio perito deveria declinar da sua nomeação (157, caput, CPC). O art. 465, §2º, inciso II do CPC determina que o perito apresente currículo, com comprovação de especialização ao ser nomeado, o que nem sempre é observado. Não o fazendo, suprime da parte a ciência das suas aptidões técnicas.
Por outro lado, os inúmeros acórdãos do STJ dando conta da preclusão da arguição de inaptidão do perito, quando da ciência de sua nomeação, a bem da verdade tem por intuito escusar-se da análise da matéria ao argumento de que demandaria reexame de provas, mas não deixam de descurar que a avaliação da capacitação técnica é dever de ofício do juízo: "o juiz, ao nomear o perito, deve atentar para a natureza dos fatos a provar e agir com prudência, aferindo se a perícia reclama conhecimentos específicos de profissionais qualificados e habilitados em lei, dando à norma interpretação teleológica". A leitura e interpretação do inteiro teor desses acórdãos é fundamental.
RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. ALEGADA CONTRAFAÇÃO . PROVA PERICIAL DETERMINADA. PERITO NOMEADO. CONHECIMENTO TÉCNICO CORRELATO. AUSÊNCIA . SUBSTITUIÇÃO DE PERITO NOMEADO. NECESSIDADE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1 . A prova pericial é meio probatório destinado a apurar a ocorrência de fatos para os quais é imprescindível o conhecimento de premissas técnico-científicas não disponíveis ao conhecimento do homem comum. 2. O conhecimento técnico-científico é, portanto, essencial ao perito, que deverá assumir o encargo com imparcialidade, atendendo os deveres e responsabilidades legalmente estabelecidos (art. 146, 147 e 422 do CPC/1973) . 3. A ausência de conhecimento técnico compatível com o objeto a ser periciado impõe ao juiz da causa a promoção, de ofício, de sua substituição. 4. O conhecimento jurídico, ainda que especializado e aprofundado no âmbito do direito autoral e de propriedade industrial, não assegura à perita nomeada o conhecimento necessário para apurar a similitude ou dessemelhança entre equipamentos eletrônicos, que envolve a composição física e o funcionamento e a programação dos dispositivos, fatos essenciais para configurar a contrafação alegada . 5. Recurso especial provido.
(STJ - REsp: 1726227 SP 2017/0150725-6, Relator.: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 5/6/18, T3 - 3ª TURMA, Data de Publicação: DJe 8/6/18)
E o que todas essas considerações tem com a alienação parental?
O art. 5º, §2º da lei 12.318/10 dispõe que no incidente de apuração da prática do ato de alienação parental, a perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental. O histórico profissional pode ser atestado nos autos por meio da indicação de casos de alienação parental em que o profissional atuou, com conclusão satisfatória ao próprio judiciário. Já os títulos acadêmicos devem ser comprovados através de certificados de especializações, ou cursos de extensão, que de fato capacitem o profissional para atuar em casos tão complexos como os de alienação parental.
Tal comprovação de aptidão é expressamente exigida pela lei dada a importância do bem estar da criança ou adolescente, cuja incolumidade psicológica é o bem a ser protegido, que podem sofrer impactos graves diante de uma resposta equivocada, após avaliação de um profissional perito despreparado. Os danos também podem ser irreversíveis ao genitor(a) alienado(a), especialmente quando vítima de falsas acusações criminais.
A lei 12.318/10 indica que o legislador fez sua parte, exigindo a comprovação de capacitação específica para o diagnóstico do ato de alienação parental. A questão que se coloca é: os operadores do direito estão fazendo sua parte, exigindo essa comprovação nos autos, já que possuem como instrumentos todos os arts. 464 e seguintes do CPC, além da própria lei de alienação parental? Ou estão culpabilizando o ordenamento jurídico por sua atuação deficiente, ou errônea interpretação da norma?


