MP 1.292/25: Mudanças no crédito consignado para empresas e trabalhadores
Nova MP cria sistema digital e centralizado para o crédito consignado, simplificando o processo e exigindo adequações das empresas.
segunda-feira, 12 de maio de 2025
Atualizado em 26 de maio de 2025 10:51
Publicada no dia 12 de março de 2025, no Diário Oficial da União, a MP 1.292 promove uma transformação significativa na concessão de crédito consignado para trabalhadores da iniciativa privada. A medida altera a lei 10.820/03 e cria um novo ecossistema de operação, inteiramente digital, centralizado e padronizado, que promete simplificar o acesso ao crédito, garantir maior segurança jurídica e ampliar a inclusão financeira de categorias até então à margem desse tipo de operação.
Em paralelo, a portaria MTE 435/25 regulamenta os aspectos operacionais da consignação em folha, estabelecendo regras que impactam diretamente as rotinas de recursos humanos e os sistemas de folha de pagamento das empresas.
1. Modernização do consignado: o que propõe a MP
A MP institui o Programa Crédito do Trabalhador, que permite a contratação de empréstimo consignado sem necessidade de convênio entre empregador e instituição financeira. A operação será feita por meio da Plataforma Crédito do Trabalhador, desenvolvida pela Dataprev, com acesso via Carteira de Trabalho Digital. O sistema será obrigatório a partir de 21 de março de 2025.
O novo modelo abrange empregados formais regidos pela CLT, além de categorias como domésticos, rurais, MEIs e até diretores não empregados com direito ao FGTS. Um dos principais avanços é a possibilidade de utilizar o FGTS como garantia - inclusive até 10% do saldo da conta vinculada e 100% da multa rescisória de 40% -, o que tende a reduzir os juros praticados.
2. Plataforma pública e a digitalização do processo
A nova plataforma concentrará todas as etapas da operação: da simulação à contratação, passando pelo compartilhamento de dados e seleção da melhor proposta. Todo o processo será digital e autônomo, dispensando intermediações. As instituições financeiras terão até 24 horas para apresentar as propostas, que poderão ser contratadas diretamente no aplicativo da CTPS Digital.
Embora a figura do empregador não seja parte do contrato de crédito, sua atuação se torna essencial. Caberá à empresa prestar informações de folha ao sistema público, processar os descontos mensais em folha, recolher os valores via FGTS Digital e manter seus dados atualizados no eSocial e no DET - Domicílio Eletrônico Trabalhista. As comunicações via DET terão início em 21 de abril de 2025.
3. Como a empresa será notificada sobre os contratos
Entre os dias 21 e 25 de cada mês, o empregador deverá acessar o Portal Emprega Brasil para consultar os contratos ativos de seus empregados. Os dados virão em arquivos padronizados, aptos para integração com os sistemas internos de folha. Em breve, essa função será transferida para a nova plataforma da Dataprev, mas já está previsto que o fluxo de informações será automatizado, sem envio direto pelos bancos.
4. Averbação obrigatória e portabilidade com juros reduzidos
Todos os contratos antigos, celebrados fora da nova plataforma, deverão ser averbados no sistema público em até 120 dias após sua entrada em operação. Sem esse registro, os contratos podem ser considerados nulos. Além disso, durante esse período, novos contratos só poderão ser firmados para quitação de dívidas anteriores e com taxas de juros menores.
A partir de junho de 2025, estará autorizada a portabilidade entre instituições financeiras, desde que a nova operação tenha juros inferiores aos do contrato original - medida que busca aumentar a concorrência e beneficiar o trabalhador.
5. Limites legais e cálculo da margem consignável
A MP não modifica o teto legal da margem consignável: permanece o limite de até 35% da remuneração líquida do trabalhador. Destes, 30% podem ser utilizados para empréstimos comuns e 5% para cartão consignado ou produto similar.
A plataforma da Dataprev fará automaticamente o cálculo com base nos parâmetros legais. A Portaria 435/2025 deixa claro que o empregador não poderá impor regras próprias sobre esse limite. Assim, empresas que adotam política interna de margem reduzida, como a Votorantim com seus 30%, deverão se adequar ao padrão legal, ainda que mantenham sistemas auxiliares para controle interno.
6. Responsabilidades do empregador e riscos jurídicos
Mesmo sem integrar a relação contratual, o empregador será responsável por:
- Consultar periodicamente o Portal Emprega Brasil;
- Integrar os dados ao eSocial e garantir a retenção correta dos valores;
- Recolher os descontos por meio da guia do FGTS Digital (ou DAE, se aplicável);
- Manter o DET atualizado;
- Informar corretamente o saldo devedor em caso de rescisão contratual.
O descumprimento desses deveres poderá ensejar sanções administrativas, civis e até penais.
7. Proteção de dados e conformidade com a LGPD
A nova sistemática também reforça o compromisso com a proteção de dados. A utilização das informações dos trabalhadores será limitada ao necessário para concessão do crédito, com consentimento prévio e expresso do titular. O compartilhamento para fins diversos é vedado, em conformidade com a LGPD (Lei nº 13.709/2018).
8. Pontos de atenção para as empresas
Diante das mudanças impostas pela MP 1.292/2025, as empresas devem revisar seus fluxos internos e adotar uma postura proativa. A seguir, destacam-se os principais pontos de atenção:
- Integração com o Portal Emprega Brasil e, posteriormente, com a Plataforma da Dataprev;
- Adequação da política interna de margem consignável ao teto legal de 35%;
- Treinamento das equipes de RH e atualização dos sistemas de folha;
- Recolhimento tempestivo dos valores via FGTS Digital;
- Monitoramento do DET para notificações sobre novos contratos;
- Averbação dos contratos antigos no prazo legal;
- Verificação da habilitação das instituições financeiras utilizadas;
- Acompanhamento das futuras regulamentações do Ministério do Trabalho.
9. Conclusão
A MP 1.292/25 representa uma inflexão importante na forma como o crédito consignado é operacionalizado no setor privado. A substituição do modelo descentralizado e dependente de convênios por um sistema digital unificado traz ganhos relevantes em transparência, concorrência e segurança jurídica. Contudo, exige das empresas um esforço imediato de adaptação tecnológica, procedimental e regulatória.
A adequação tempestiva será essencial não apenas para evitar riscos legais, mas para garantir que trabalhadores e empresas possam se beneficiar plenamente dos avanços propostos pela nova legislação.
Maria Carolina Mattar Diaz
Advogada especialista em Direito do Trabalho no escritório Hapner Kroetz Advogados.


