A proposta da ONU para evitar que a IA aumente desigualdades
Relatório do Banco Mundial mostra que o acesso à inteligência artificial é 50% menor em países em desenvolvimento, ampliando desigualdades globais.
quinta-feira, 29 de maio de 2025
Atualizado às 14:01
A inteligência artificial tem se mostrado extremamente vantajosa para diversos setores. Provavelmente você já conheceu algumas e até mesmo tenha as usado, como o ChatGPT, o Dall-E ou o Midjourney. Mas a verdade é que já existem milhares de IAs espalhadas pelo mundo, operando silenciosamente nos bastidores.
Sim, essa tecnologia interfere em diversos processos cotidianos e, consequentemente, na sua vida. Seja ao sugerir uma música no seu streaming favorito, ao organizar sua caixa de e-mails, ao filtrar currículos para uma vaga de emprego ou até ao identificar fraudes bancárias em segundos.
Olhando por esse ângulo, parece que o avanço digital tem sido mesmo muito útil. No entanto existe o outro lado da moeda.
Afinal, considerando que esses sistemas são treinados com base em dados humanos e que eles carregam nossos preconceitos e distorções históricas, como garantir que a IA não acabe replicando ou até amplificando esses mesmos problemas?
Inovação sem ética é retrocesso
Segundo um relatório citado pela ONU, a IA pode aprofundar desigualdades se não for adequadamente regulada. Isso significa que, sem atenção, responsabilidade e transparência, o que hoje parece avanço pode se tornar retrocesso.
Por isso, cresce no mundo todo o debate sobre a regulação ética da computação cognitiva. Não se trata de impedir a inovação, mas de certificar que ela aconteça com compromisso, respeitando direitos, promovendo inclusão e reduzindo disparidades.
Um estudo da Unesco, publicado em 2023, reforça essa preocupação. Ele aponta que a IA pode reproduzir e até ampliar vieses de gênero, raça e classe, afetando negativamente processos como contratações, acesso a serviços públicos e decisões automatizadas no sistema de justiça, por exemplo.
A IA irá trazer problemas para o mercado de trabalho?
Além dos riscos sociais já identificados, o desdobramento da inteligência artificial sobre o mercado de trabalho é outro ponto de grande atenção. Uma pesquisa conjunta do MIT e da IBM, publicada em 2023, estima que cerca de 40% dos empregos no mundo podem ser impactados pela automação nos próximos 15 anos e os trabalhadores menos qualificados estão entre os mais vulneráveis.
Esse dado evidencia uma possível ampliação do desequilíbrio, caso políticas públicas, estratégias de capacitação e ações de proteção social não sejam implementadas de forma eficaz.
Não é sobre substituição de tarefas repetitivas, mas sobre transformação completa de setores, exigindo novas habilidades, requalificação profissional e acesso equitativo à tecnologia. Se esse processo não for conduzido com responsabilidade, há o risco de criar uma nova exclusão digital, onde apenas uma parcela da população colhe os frutos da inovação enquanto outra é deixada para trás.
A nova condução dos estudos do Direito ou de qualquer outra área, não deve ter foco exclusivo em teorias tradicionais, mas também em como lidar com as ferramentas atuais. Querendo ou não, elas já fazem parte do cotidiano de muitas pessoas, mesmo que de forma imperceptível.
A questão central não é evitar o uso do sistema, mas aprender a utilizá-la de forma consciente, aproveitando seus benefícios sem que isso resulte em consequências negativas, como o aumento das desigualdades.
Uso da tecnologia exige consciência global
Apesar de o Brasil ainda não contar com regulamentações oficiais sobre o uso da IA, a ONU propõe um caminho, estruturado em três pilares, voltado a garantir que a inovação seja uma aliada da equidade social e do desenvolvimento humano. São eles:
Cooperação internacional
A tecnologia não conhece fronteiras, por isso os esforços para normalizá-la também não podem ser isolados. A ONU propõe uma maior colaboração entre países, para compartilhar conhecimento, infraestrutura e boas práticas, principalmente com nações em desenvolvimento, que muitas vezes ficam à margem da revolução digital.
Fortalecimento da capacidade nacional
Cada país precisa desenvolver suas próprias políticas, estruturas e talentos para lidar com a IA de forma autônoma e eficiente. Ou seja, investir em educação, pesquisa e inovação, criando ambientes seguros para o uso consciente da tecnologia e reduzindo a dependência de sistemas desenvolvidos por grandes potências ou empresas estrangeiras.
Governança inclusiva e baseada em direitos
As escolhas feitas com o uso da IA precisam ser transparente, democrática e centrada nos direitos humanos. Assim, é preciso envolver a sociedade civil, especialistas, empresas e governos no processo, certificando que a computação cognitiva sirva ao bem comum e não apenas aos interesses de poucos.
Disparidade digital
O plano da ONU apresenta diretrizes importantes para prevenir os riscos e desequilíbrios que a inteligência artificial pode causar se utilizada sem critério ou responsabilidade. Enquanto países desenvolvidos treinam modelos de IA com dados de ponta, mão de obra especializada e infraestrutura completa, outras nações sequer conseguem garantir conexão de qualidade para suas escolas públicas.
Nesse sentido, não se trata de uma corrida e sim de uma disparidade digital que aumenta a cada atualização de sistema. Essa preocupação se torna ainda mais urgente diante de estatísticas como o do relatório do Banco Mundial de 2022, que revela que países em desenvolvimento têm, em média, 50% menos acesso a tecnologias cognitivas em comparação com nações ricas.
Essa lacuna não é invisível. Ela aparece nas contratações enviesadas, nos diagnósticos automatizados que não reconhecem a diversidade, nos currículos descartados por filtros injustos, nas decisões públicas baseadas em dados que não refletem a realidade local. Quando a inovação é pensada por poucos, ela serve a poucos.
Por isso, o plano da ONU precisa ser compromisso dos escritórios e empresas para buscar uma IA que sirva à humanidade como um todo, e não apenas às potências que a controlam.
IA no mundo jurídico
A inteligência artificial já entrou nos tribunais, nas bancas e nas ferramentas de gestão dos escritórios. Automatiza prazos, organiza processos, cruza informações, sugere argumentos. Parece um sonho para quem vive preso em tarefas repetitivas.
Mas será que todos estão tendo o mesmo alcance a essas tecnologias? Será que alguém está sendo impactado negativamente? Esse tema não pode ser tratado como mera hipótese, é preciso ter certeza de que desigualdades não estejam sendo replicadas ou ampliadas.
Há software jurídico que utiliza IA e se compromete com um sistema seguro, transparente e livre de preconceitos. Mais do que isso, como empresa, se posiciona ativamente sobre a necessidade de uma regulação ética da inteligência artificial, que garanta equidade no acesso à inovação.
Isso porque, quando aplicada com responsabilidade, transparência e inteligência de dados, a tecnologia permite que escritórios pequenos e médios atuem com o mesmo nível de organização e estratégia dos grandes, democratizando oportunidades dentro da própria advocacia.
Tecnologia com propósito
De que adianta termos uma tecnologia capaz de aprender, prever e até simular o raciocínio humano, se ela apenas repete os privilégios de sempre? A IA não é neutra. Ela é espelho, reflete quem a treina, quem a financia, quem decide seus critérios. E se só um grupo pequeno a detém, a computação cognitiva deixa de ser um avanço coletivo e passa a ser apenas mais uma ferramenta de concentração de poder.
Não basta que a ferramenta funcione. É preciso perguntar: para quem ela funciona? A quem ela serve? Quem fica de fora da narrativa otimista da inovação? Para que o avanço seja concreto é necessário que esses sistemas sejam acessíveis, auditáveis e orientados por um propósito social. Só assim a inovação deixa de ser um privilégio e passa a ser, de fato, um instrumento de transformação coletiva.


