O impacto real da IA sobre o desemprego
Será que a IA vai realmente contribuir para o desemprego?
sexta-feira, 27 de junho de 2025
Atualizado às 07:49
Durante anos, carreguei um temor persistente, um receio alimentado por manchetes alarmistas e projeções catastróficas: que a IA - Inteligência Artificial traria consigo um desemprego em massa, implacável, reconfigurando o mercado de trabalho de forma devastadora. Parecia inevitável que milhões de pessoas perderiam seus empregos da noite para o dia, sendo substituídas por algoritmos infalíveis e robôs incansáveis.
A ansiedade era compreensível. Afinal, desde os escritos de Karl Marx sobre o desemprego estrutural causado pela automação até os alertas mais recentes de economistas contemporâneos, como Daron Acemoglu, o avanço tecnológico sempre teve seu preço social. No entanto, o que vemos na prática, especialmente no biênio 2024-2025, é uma realidade muito mais complexa e, curiosamente, menos sombria.
A IA está, de fato, substituindo tarefas, mas não empregos inteiros. A diferença entre uma função e as atividades que a compõem nunca foi tão evidente. O que antes parecia uma ameaça total, agora se revela como uma força de reconfiguração e especialização. Empregos não desaparecem; eles evoluem. E a IA, ao invés de ser o carrasco do trabalho humano, assume o papel de coadjuvante, deixando para os profissionais as partes mais humanas, estratégicas e criativas de suas funções.
Quem lidera a corrida da IA e o que isso revela sobre o futuro do trabalho
Para compreender esse fenômeno com mais precisão, é essencial analisar quem está na dianteira da inovação em inteligência artificial e quais os efeitos disso sobre o mercado de trabalho. A partir de dados do Stanford HAI Global AI Vibrancy Tool, do Tortoise Global AI Index e dos volumes de investimento privado e público em IA, os países mais avançados nessa tecnologia foram ranqueados com base em critérios como:
- Número de startups de IA criadas;
- Financiamentos e investimentos em P&D;
- Publicações acadêmicas e produção científica;
- Infraestrutura digital e disponibilidade de dados.
Os Estados Unidos continuam liderando o cenário, com 1.073 empresas de IA financiadas em 2024, muito à frente da China e de economias europeias. A liderança norte-americana se sustenta em um ecossistema robusto de inovação, academia e capital de risco, o que tem permitido que a IA se difunda por diversos setores econômicos.
Desemprego sob controle: os dados não mentem
Apesar das previsões mais pessimistas, os dados de desemprego dos países líderes em IA mostram uma tendência de estabilidade eou, em muitos casos, de queda.
Segundo a OCDE, a taxa de desemprego média entre seus países-membros manteve-se em 4,9% em 2024. Nos EUA, a taxa ficou em 3,7% em 2024, subindo levemente para 3,8% em 2025, uma variação residual de apenas 0,1 ponto percentual. Isso, considerando o aumento exponencial do uso de IA, é revelador.
Essa constatação indica uma resiliência notável do mercado de trabalho frente à automação. Setores de alta complexidade, como saúde, energia renovável e biotecnologia, não apenas resistiram à substituição por IA, como aumentaram a demanda por mão de obra qualificada, adaptada ao novo contexto digital.
Já setores mais tradicionais, como construção civil, indústria automotiva e manufatura, ainda enfrentam desafios, principalmente onde há menor inserção tecnológica. Nesses campos, a IA exige requalificação profissional e transformação de processos, o que pode gerar fricções temporárias no emprego.
Inteligência artificial e o futuro do trabalho: Substituição de tarefas, não de empregos
Após uma análise desses dados, cheguei a uma conclusão que vai contra a maré de previsões apocalípticas: a IA substitui tarefas, não empregos.
Essa constatação não é apenas teórica, ela está refletida em dados concretos. Quando analisamos a lista dos 30 países mais avançados em IA em 2024-2025, vemos que todos eles mantêm suas taxas de desemprego controladas ou em queda. Em vários casos, os setores mais intensivos em IA são justamente os que mais contrataram.
Vamos aos dados:
A partir dessa leitura, algumas tendências se tornam evidentes.
Primeiramente, os países com maior maturidade em IA não estão sofrendo com desemprego estrutural, pelo contrário, estão prosperando em setores adaptados. Além disso, a tecnologia tem sido aliada na geração de novas funções, especialmente em biotecnologia, energia renovável e serviços especializados de saúde.
Por outro lado, setores tradicionais sofrem mas não colapsam, eles passam por uma reestruturação necessária e exigem requalificação técnica dos trabalhadores. Por fim,a empregabilidade está ligada à capacidade de adaptação, onde governos e empresas investem em educação tecnológica, o impacto da IA é positivo.
A falsa dicotomia entre homem e máquina
A inteligência artificial não é um ser autônomo que toma decisões por conta própria. Ela é treinada, operada e supervisionada por humanos. A IA não age por si; ela age por nós, para nós. Portanto, ela não deve ser vista como um substituto, mas como um multiplicador da capacidade humana.
Do ponto de vista filosófico, a IA redefine o conceito de trabalho. Atividades mecânicas e repetitivas são progressivamente delegadas às máquinas, enquanto o trabalho humano se reposiciona no campo da criatividade, do relacionamento interpessoal, da análise crítica e da resolução de problemas complexos, justamente onde a IA ainda é limitada.
Brasil na era da IA: Oportunidades ou ameaças para o mercado de trabalho?
O Brasil aparece no ranking como o 30º país mais avançado em IA, com uma taxa de desemprego em leve queda, de 7,8% em 2024 para 7,6% em 2025. O setor industrial segue como o mais afetado, mas o setor tecnológico mostra forte expansão. As empresas que adotam soluções de IA, como chatbots jurídicos, automação de processos administrativos e análise preditiva, têm crescido em competitividade e aberto novas oportunidades de trabalho.
Para o mercado jurídico, essa realidade se traduz em novas especializações: legal design, jurimetria, direito digital e LGPD são áreas em franca ascensão. A IA não vai substituir advogados, mas os advogados que usam IA tendem a substituir os que não a usam.
Dessa forma, em vez de nos rendermos a um fatalismo tecnológico, precisamos compreender a IA como parte de um ciclo natural de evolução do trabalho. Assim como a Revolução Industrial não eliminou o emprego, mas o transformou, a revolução digital impulsionada pela IA também está criando novas formas de produzir, colaborar e gerar valor.
O papel dos líderes públicos e privados é claro: investir em educação, fomentar a inovação e garantir que a transição tecnológica seja inclusiva. Os países que lideram a adoção da IA não estão desempregando suas populações. Na verdade, estão requalificando seus trabalhadores e redesenhando suas economias.
Se há algo que a história do trabalho nos ensina, é que com a inteligência artificial, estamos longe de ver o fim do trabalho humano, pode muito bem ser o início de uma nova era de realização profissional.


