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REsp 2.032.814/RS: Honorários e a renúncia exigida na transação

Análise crítica do REsp 2.032.814/RS, que afastou honorários ao contribuinte que renuncia à ação judicial para aderir à transação tributária conforme a lei 13.988/20.

segunda-feira, 7 de julho de 2025

Atualizado em 4 de julho de 2025 15:46

Honorários em renúncia de ação para adesão à transação tributária: Análise crítica do REsp 2.03.814/RS e os limites da renúncia imposta

Análise crítica do REsp 2.032.814/RS, que afastou honorários ao contribuinte que desiste da ação para aderir à transação tributária. Destaques e impactos práticos da decisão.

A transação tributária, introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pela lei 13.988/20, constitui instrumento relevante no processo de desjudicialização da cobrança de créditos da Fazenda Pública. Contudo, sua implementação vem suscitando debates relevantes, especialmente quanto aos seus efeitos colaterais no contencioso fiscal já em curso. Entre tais discussões, destaca-se a controvérsia acerca da possibilidade de imposição de honorários sucumbenciais ao contribuinte que, por força legal, renuncia a ação judicial em trâmite para aderir à transação tributária.

No julgamento do REsp 2.032.814/RS, a 1ª turma do STJ enfrentou de maneira paradigmática essa questão, afastando a condenação do contribuinte ao pagamento de honorários advocatícios, ao reconhecer que a renúncia à pretensão judicial não configura ato voluntário apto a ensejar a aplicação da regra contida no art. 90 do CPC.

O cerne da controvérsia residia no seguinte ponto: sendo a renúncia à demanda judicial uma condição imposta pela legislação para viabilizar a transação tributária, haveria ou não margem para imputar ao contribuinte os ônus da sucumbência? A Fazenda Nacional, ao recorrer, sustentava a aplicabilidade automática da regra processual civil geral, alegando que a omissão da lei 13.988/20 não poderia afastar o regime jurídico da sucumbência.

Divergindo do relator, o voto condutor do ministro Paulo Sérgio Domingues firmou posicionamento técnico e normativamente coerente, ao asseverar que não se trata de lacuna legislativa, mas de silêncio intencional do legislador, incompatível com a aplicação subsidiária do CPC. A adesão à transação, frisou o voto, demanda a renúncia como condição imposta, não sendo, portanto, possível equipará-la à desistência espontânea, cujos efeitos processuais estão disciplinados no Código.

O voto ainda sublinhou que admitir a incidência de honorários sucumbenciais nesse contexto violaria princípios fundamentais da relação entre Administração Pública e administrados, como a boa-fé objetiva, a segurança jurídica e a confiança legítima. A cobrança de valores não expressamente previstos na legislação específica ou no edital da transação representa, nas palavras do julgado, "surpresa inaceitável" ao contribuinte que já se submeteu aos rigores do instituto e celebrou um novo vínculo obrigacional com base em concessões recíprocas.

Destaca-se, ainda, o reconhecimento da natureza de novação objetiva atribuída à transação, o que reforça seu caráter autônomo e especial dentro do sistema tributário. Não se trata de mera suspensão de exigibilidade, como no parcelamento, mas de extinção do crédito tributário nos moldes do art. 156, III, do CTN. A singularidade do regime jurídico aplicável afasta, por especialidade, o uso subsidiário do CPC no ponto em debate.

A decisão da 1ª turma, portanto, não apenas afasta um ônus indevido, mas consolida um marco interpretativo essencial para o sucesso da política pública de transações tributárias, cuja eficácia depende da previsibilidade, confiança e racionalidade nos efeitos jurídicos decorrentes da adesão.

Para contribuintes com passivos de alta complexidade e processos judiciais em curso, o precedente oferece uma salvaguarda jurídica relevante, ao estabelecer que não cabe imputar custas não previstas àqueles que aderem à transação por meio da renúncia imposta. Da mesma forma, orienta a atuação dos advogados tributaristas na análise prévia de riscos e na construção de estratégias negociais mais robustas.

Conclui-se que a decisão proferida no REsp 2.032.814/RS representa avanço na consolidação do microssistema da transação tributária, reafirmando os valores da legalidade estrita, da boa-fé e da segurança jurídica como pilares de uma nova cultura de solução de litígios fiscais - uma cultura que se pretende mais consensual, eficiente e equilibrada.

Tamisy de Freitas Provensi

VIP Tamisy de Freitas Provensi

Tributarista esp. em gestão estratégia e regularização de passivos tributários de alta complexidade; formação em Leadership: C. Public Value por Harvard Un.; espc. em crescimento e lucratividade.

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