Liderança humana em tempos de algoritmos: Qual o diferencial?
Para 84% dos executivos a IA já é inevitável. Mas o diferencial está na liderança com ética, agilidade e sensibilidade humana.
terça-feira, 15 de julho de 2025
Atualizado às 13:22
Você confiaria em uma máquina para tomar decisões para o seu escritório? Para 84% dos líderes empresariais, a resposta é sim ou, ao menos, inevitável. Segundo a Accenture (2023), essa é a parcela de executivos que acreditam que a inteligência artificial transformará a forma como as escolhas são feitas nos negócios.
Depois de tantos avanços recentes, isso não se trata mais de uma aposta futurista, mas de uma mudança concreta na lógica empresarial: menos intuição, mais dados. Menos achismo, mais análise. Nesse sentido, compreender como a IA impacta os processos decisórios passou a ser uma questão de estratégia.
A mudança de paradigma nas competências de liderança
Durante décadas, o modelo de liderança dominante foi construído sobre certezas: o líder sabia mais, decidia mais e, por isso, ocupava naturalmente o topo da hierarquia. Era o centro da estratégia, da execução e do controle. Mas a chegada da inteligência artificial mexeu nessa estrutura. Agora, não é mais o conhecimento acumulado que diferencia um líder, mas a sua capacidade de lidar com o desconhecido.
A IA já responde perguntas, sugere caminhos e até avalia desempenhos com base em dados. O líder que antes precisava "saber tudo" agora precisa "saber lidar com tudo", especialmente com as ambivalências que os algoritmos ainda não alcançam: cultura, motivação e contexto humano.
Como serão os próximos líderes?
Dado que até uma inteligência artificial pode escolher os próximos passos em um escritório, o que exatamente se espera de um líder? A resposta passa menos por controle e mais por coordenação. O responsável que está à frente hoje não precisa mais ser o herói que resolve tudo sozinho. Seu papel agora é o de quem conecta pessoas e tecnologias, ajudando todos a trabalharem juntos de forma mais funcional.
No entanto, ele não tem que competir com o sistema, mas aprender a usar seu potencial para alcançar objetivos maiores, que façam sentido para a equipe e para a organização como um todo.
Essa mudança não é simples. Requer desapego, aprendizado contínuo e uma nova ética da liderança, menos baseada no controle e mais ancorada na confiança. Mais do que domínio técnico, espera-se que esses profissionais sejam facilitadores de ambientes adaptativos.
Segundo o Fórum Econômico Mundial, 44% das habilidades de liderança precisarão ser atualizadas até 2027, sobretudo aquelas ligadas à supervisão de tecnologias e à tomada de decisões éticas. Diante disso, é indispensável desenvolver:
- Escuta ativa e sensibilidade relacional para entender o que a máquina não vê: os sinais sutis de desengajamento, os conflitos silenciosos, os valores em disputa;
- Humildade intelectual para reconhecer quando a IA pode ter razão e quando ela não está enxergando o todo;
- Capacidade de síntese e julgamento crítico porque os dados mostram, mas não escolhem;
- Habilidade para criar sentido em um mundo onde a informação é abundante, mas o significado continua sendo uma construção humana.
O novo papel do líder estratégico na era da IA
O protagonismo da inteligência artificial pode assustar alguns advogados, principalmente aqueles mais acostumados a processos tradicionais. No entanto, a IA seguirá avançando e, inevitavelmente, se tornará parte do cotidiano jurídico, principalmente nos escritórios que desejam crescer com eficiência e escala.
Competências como inteligência emocional, pensamento crítico, escuta ativa e adaptabilidade deixam de ser acessórios e passam a ser elementos centrais da liderança. O profissional deve interpretar contextos, criar segurança psicológica nas equipes e tomar decisões que considerem não apenas o que é eficiente, mas o que é ético e sustentável.
Ele se torna, cada vez mais, um tradutor entre a lógica das máquinas e as necessidades humanas, alguém capaz de interpretar os dados, mas também de enxergar além deles, equilibrando previsibilidade com sensibilidade.
Sim, existem riscos éticos envolvidos em confiar determinadas funções a uma máquina. Questões como viés algorítmico, falta de transparência e perda de sensibilidade humana ainda são desafios reais.
É aqui que a atuação do líder se torna ainda mais relevante. Ele ocupa uma posição estratégica para garantir que o uso da tecnologia esteja a serviço dos valores, do propósito e das pessoas e não o contrário. Para isso, é preciso exercer essa responsabilidade em três dimensões complementares.
Definidor de regras
A IA opera dentro dos limites que os humanos estabelecem: quais dados serão analisados, quais resultados são aceitáveis, o que é ético ou inegociável.
O líder é quem define essas regras e, mais importante, é quem assegura que elas reflitam a cultura, os valores e o propósito da organização. Sem essa definição clara, a automação pode se tornar desgovernada, perdendo o alinhamento com o que realmente importa.
Curador de sistemas inteligentes
O papel do líder também é saber escolher e ajustar quais ferramentas digitais fazem sentido para sua equipe, seu contexto e sua estratégia. Ser um curador nesse cenário significa compreender o mínimo necessário para definir boas escolhas técnicas (mesmo sem ser um especialista), e ter a maturidade de adaptar ou até recusar soluções que não agregam valor real.
Além disso, curadoria envolve uma vigilância constante: os sistemas aprendem, mas também erram. Cabe ao responsável manter o olhar crítico sobre os resultados, ajustando o rumo sempre que necessário.
Garantidor do alinhamento estratégico e humano
Nenhuma IA conhece, de verdade, as histórias individuais que moldam as motivações de um time. Assim, é função do líder garantir que os objetivos estratégicos da empresa estejam em sintonia com os aspectos humanos, sejam emocionais, sociais ou culturais que sustentam a performance a longo prazo.
Decidir continua sendo humano
Segundo a McKinsey (2023), empresas com líderes adaptativos à inteligência artificial são 33% mais propensas a superar seus concorrentes. Mas o que isso significa na prática? Na realidade do dia a dia corporativo, adaptar-se ao sistema não é simplesmente liberar orçamento para novas ferramentas ou aprovar integrações técnicas.
É sobre reconfigurar uma função, assumindo que o futuro exige resoluções mais ágeis, processos mais flexíveis e uma nova mentalidade frente ao erro, à experimentação e ao aprendizado constante.
Inteligência artificial como requisito nos escritórios
A inteligência artificial deixará de ser diferencial e passará a ser infraestrutura básica para o funcionamento de muitos escritórios e empresas. Segundo a Gartner (2024), 75% das organizações pretendem adotar agentes autônomos até 2026, especialmente nas áreas de compliance, jurídico e atendimento ao cliente. Isso não é uma tendência futura, é um reposicionamento em andamento.
Na prática, isso significa que advogados que não integrarem a IA aos seus fluxos de trabalho, seja na análise de dados, na gestão de prazos ou no atendimento ao cliente correm o risco de se tornarem menos eficientes e, com o tempo, irrelevantes diante de concorrentes mais adaptados.
Assim, a liderança deixa de ser um cargo técnico ou simbólico e passa a ser um dever essencial de mediação entre sistemas, pessoas e decisões. O que definirá o sucesso ou o fracasso na adoção do sistema inteligente será, sobretudo, a qualidade com que essa função será exercida por quem está à frente.
Por outro lado, usar IA sem preparo pode gerar mais problemas do que soluções, desde resoluções automatizadas sem supervisão adequada até impactos éticos e reputacionais difíceis de reverter. A tecnologia exige estrutura, mas principalmente intenção e responsabilidade.


