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Acúmulo de função e o transporte coletivo: Análise do entendimento consolidado do TST sobre o exercício concomitante de motorista e cobrador

O TST firmou entendimento de que motorista-cobrador não configura acúmulo de função, trazendo segurança jurídica, mas exigindo análise caso a caso.

quinta-feira, 31 de julho de 2025

Atualizado às 13:31

O universo das relações de trabalho é dinâmico e complexo, exigindo constante atualização e clareza interpretativa. 

No setor de transporte coletivo, uma questão que frequentemente gera debates e questionamentos jurídicos é a cumulação de funções, especialmente a do motorista que também exerce atividades de cobrança. 

Tal prática levanta a indagação sobre a configuração de "acúmulo de função" e o consequente direito a um acréscimo salarial. 

Diante de tal cenário, o TST, instância máxima da Justiça do Trabalho brasileira, tem desempenhado um papel crucial na pacificação do entendimento sobre este tema, proporcionando maior segurança jurídica para as relações laborais envolvidas.

No Direito do Trabalho, o acúmulo de função ocorre quando um empregado, contratado para desempenhar uma função específica, passa a exercer, de forma habitual, tarefas diversas e incompatíveis com aquelas para as quais foi originalmente contratado, ou que exigem maior qualificação ou responsabilidade, sem a devida contrapartida salarial. 

Tal situação pode gerar o direito a um "plus salarial", com base nos princípios da justa retribuição e da vedação ao enriquecimento sem causa do empregador. 

A análise da configuração do acúmulo de função depende de uma avaliação criteriosa das atribuições inicialmente contratadas e das tarefas adicionais desempenhadas, considerando-se a complexidade, a exigência de qualificação e a compatibilidade com a função principal.

O TST tem se posicionado de forma clara e reiterada sobre a questão da cumulação das funções de motorista e cobrador no transporte coletivo urbano. 

Por meio do Tema 128 da Tabela de Temas de repercussão geral do TST, e ratificado em diversas decisões (a exemplo o processo RR-0100221-76.2021.5.01.0074), a jurisprudência da Corte firmou o entendimento de que o exercício concomitante da função de cobrador pelo motorista de ônibus urbano, por si só, não configura acúmulo de função apto a gerar o direito à percepção de acréscimo salarial.

Este posicionamento reflete a compreensão do TST de que as atividades de cobrança, nesse contexto específico, são consideradas compatíveis e complementares à função principal de condução do veículo, não demandando qualificação técnica ou responsabilidade incompatível com o cargo de motorista. 

A interpretação baseia-se na compatibilidade e complementaridade das tarefas (recebimento de passagens, validação de bilhetes são inerentes à dinâmica operacional), na evolução tecnológica (modernização dos sistemas de bilhetagem simplifica as tarefas de cobrança), e na realidade do setor, onde a prática de motoristas também realizarem a cobrança é consolidada.

Ainda que o entendimento do TST seja consolidado, é fundamental ressaltar que a aplicação dessa diretriz possui limites e nuances que devem ser observados em cada caso concreto. 

A cumulação de funções não pode, em hipótese alguma, comprometer a segurança do motorista, dos passageiros ou de terceiros, devendo a primazia na condução do veículo ser sempre garantida. 

Da mesma forma, se a acumulação das tarefas, aliada à de direção, resultar em uma sobrecarga física ou mental excessiva que prejudique a saúde do trabalhador ou a qualidade do serviço, a questão poderá ser reavaliada. 

É imprescindível, ademais, verificar as CCT - Convenções Coletivas de Trabalho ou ACT - Acordos Coletivos de Trabalho da categoria, pois estes podem conter disposições específicas que regulem a matéria, e a análise individual de cada contrato de trabalho é crucial para identificar se a atribuição das tarefas de cobrança representa uma alteração contratual lesiva.

Apesar da pacificação do entendimento jurisprudencial, a complexidade do Direito do Trabalho e as particularidades de cada relação empregatícia demandam uma análise técnica e especializada.

A interpretação e aplicação das decisões do TST a um caso concreto, bem como a avaliação das condições de trabalho e das normas coletivas aplicáveis, requerem o conhecimento aprofundado de profissionais do Direito.

A assessoria jurídica especializada é fundamental para orientar tanto empregadores quanto empregados, assegurando que as práticas estejam em conformidade com a legislação vigente e que os direitos e deveres sejam devidamente observados.

Em suma, o posicionamento consolidado do TST sobre a não configuração de acúmulo de função para o motorista-cobrador no transporte coletivo urbano traz maior segurança jurídica e previsibilidade para o setor.

Contudo, a correta aplicação desse entendimento exige uma análise cuidadosa dos limites e das nuances de cada situação, ressaltando a relevância do suporte jurídico para a navegação segura no cenário trabalhista.

Alessandra Brasileiro

Alessandra Brasileiro

Advogada trabalhista.

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