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Saúde mental no teleatendimento: Um chamado à dignidade no trabalho remoto

O teleatendimento cresce no Brasil, mas enfrenta sérios riscos psicossociais. O texto defende saúde mental, sindicatos atuantes e empresas responsáveis.

quarta-feira, 27 de agosto de 2025

Atualizado em 26 de agosto de 2025 10:31

Introdução

O setor de teleatendimento não para de crescer, empregando milhares de brasileiros e se consolidando como uma das principais fontes de trabalho no país. No entanto, por trás dessa expansão, esconde-se uma dura realidade: condições precárias que expõem profissionais a riscos psicossociais graves. Estresse crônico, ansiedade e burnout não são a exceção, mas a regra.

OMS - Organização Mundial da Saúde (2023) soa o alarme: um em cada cinco trabalhadores de call centers sofre com transtornos mentais. Essa estatística alarmante reforça a urgência de políticas de proteção à saúde mental. Neste contexto, sindicatos e empresas têm o poder de transformar essa realidade.

Este artigo discute os desafios enfrentados no teleatendimento, a importância da saúde mental no trabalho remoto e como sindicatos fortes e empresas responsáveis podem construir um futuro mais digno e sustentável para esses profissionais.

1. O teleatendimento no Brasil: Crescimento e riscos psicossociais

O teleatendimento emprega milhares de brasileiros, especialmente jovens e mulheres, em funções que exigem alta demanda emocional. Segundo o IBGE (2023), o setor cresceu 47% nos últimos cinco anos. Apesar da expansão, os desafios persistem:

  • Jornadas exaustivas (muitas vezes acima das 8h diárias);
  • Cobranças abusivas por metas inatingíveis;
  • Falta de pausas adequadas, o que aumenta o risco de LER/DORT (Lesões por Esforços Repetitivos / Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho);
  • Exposição constante a situações de estresse, como clientes agressivos e pressão por produtividade.

Estudos da FUNDACENTRO - Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (2022) mostram que 76% dos operadores de teleatendimento relatam sintomas de ansiedade ou depressão, evidenciando a gravidade do problema.

1.1. A saúde mental no centro da discussão

É impossível ignorar o impacto psicológico. Trabalhar em teleatendimento exige alta capacidade de resiliência emocional, pois os profissionais lidam diariamente com:

  • Reclamações e xingamentos;
  • Cobranças por scripts rígidos;
  • Monitoramento constante por meio de ferramentas de gravação e métricas de desempenho.

A NR-1, que estabelece diretrizes gerais de segurança e saúde no trabalho, deve ser aplicada também ao teleatendimento, garantindo:

  • Intervalos adequados entre ligações;
  • Limites de jornada;
  • Acompanhamento psicológico;
  • Ergonomia no home office (para quem trabalha remotamente).

2. O papel dos sindicatos na defesa dos direitos

Diante desses desafios, a ação sindical se torna vital. Sindicatos fortes são essenciais para pressionar empresas e governos a melhorarem as condições de trabalho no setor. Entre as principais ações estão:

  • Negociar cláusulas de saúde mental em convenções coletivas;
  • Exigir treinamentos sobre gestão do estresse;
  • Fiscalizar o cumprimento das NRs (especialmente a NR-17, sobre ergonomia);
  • Oferecer suporte jurídico contra assédio moral e cobranças abusivas.

Um exemplo notável é o SINTTEL - Sindicato dos Teleatendentes de São Paulo, que em 2023 garantiu, via acordo coletivo:

  • Pausas de 10 minutos a cada 2 horas;
  • Sessões de terapia gratuitas;
  • Proibição de metas impossíveis.

3. A função social das empresas de teleatendimento

O lucro é importante, mas o bem-estar dos colaboradores é fundamental. A função social da empresa, prevista no CC (Art. 2.035), deve incluir:

  • Programas de qualidade de vida (como yoga, meditação e apoio psicológico);
  • Políticas de reconhecimento e valorização, evitando a desumanização do trabalho;
  • Estrutura ergonômica adequada, incluindo mesas ajustáveis e headsets de qualidade.

Empresas que investem em saúde mental reduzem afastamentos, aumentam a produtividade e melhoram a retenção de talentos.

4. Os desafios jurídicos e a necessidade de estruturação

Muitas empresas ainda ignoram a legislação trabalhista, expondo-se a riscos sérios:

  • Ações judiciais por assédio moral;
  • Multas por descumprimento das NRs;
  • Processos por doenças ocupacionais.

Para evitar esses riscos, é fundamental:

  • Contar com assessoria jurídica especializada;
  • Implementar compliance trabalhista;
  • Manter diálogo constante com os sindicatos.

Conclusão

O teleatendimento não precisa ser sinônimo de adoecimento mental. É possível conciliar produtividade e dignidade por meio da colaboração entre sindicatos fortes, empresas responsáveis que investem em saúde ocupacional e a fiscalização rigorosa das normas trabalhistas. A luta por trabalho digno no teleatendimento é uma luta por uma sociedade mais justa e saudável. É um direito, não um privilégio.

____________________

OMS. Mental Health at Work, 2023.

IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), 2023.

FUNDACENTRO. Saúde Mental em Call Centers, 2022.

BRASIL. CLT e NR-1, Ministério do Trabalho.

SINTTEL. Acordo Coletivo 2023

Andréa Arruda Vaz

Andréa Arruda Vaz

Advogada, pesquisadora e escritora, Doutora e Mestre em Direito Constitucional.

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