Direitos humanos não são peças de xadrez
A coerência não se mede pelo lado que empunha a bandeira, e sim pela disposição de aplicar os mesmos princípios a todos. Direitos humanos não são peças de xadrez.
quinta-feira, 28 de agosto de 2025
Atualizado às 09:18
Com frequência, a sociedade mundial polarizada e inflamável discute as temáticas de conflitos internacionais, com às controvérsias ideológicas de uma esquerda "universitarizada" e uma extrema direita com uma visão equivocada que costuma não ser nada além do: "nós contra eles", o que contamina qualquer tipo de discussão minimamente séria. Contudo, tais análises generalizam e reduzem um tema bem complexo, a posições simplistas.
De modo exemplificativo mais atual, o governo de Israel anunciou na última segunda-feira (25/8/25) que retirou a indicação do diplomata Gali Dagan para a embaixada Israelense em Brasília e que a decisão foi tomada diante da omissão da resposta do Ministério das Relações Exteriores à indicação feita em janeiro. Ao anunciar a medida, o governo israelense ainda informou ao Itamaraty que as relações diplomáticas com o Brasil serão conduzidas "em um patamar inferior", e que não irá indicar um novo nome para representar o país no Brasil (após o Brasil, excepcionalmente, se abster de responder ao pedido de agrément do embaixador Dagan, Israel retirou o pedido. Para exercer a atividade de embaixador, o país que recebe o diplomata deve conceder uma autorização (agrément), o que não aconteceu com a indicação de Dagan no Brasil. Nas relações internacionais, deixar o pedido em análise, como no caso, é considerado uma recusa.)
Desde o início da guerra entre Israel e Palestina, em outubro de 2023, o presidente Lula critica duramente os ataques de israelenses na Faixa de Gaza. Em 2024, Lula comparou as ofensivas de Israel contra o Hamas ao que Adolf Hitler fez com os judeus no século passado.
Ao debatermos sobre tais temas e incluindo o Irã (um dos financiadores do Hamas), é indispensável criticarmos sem hesitação a repressão às mulheres e à comunidade LGBT+, bem como o uso político da religião. Não há como não compartilhar minimamente e de forma profunda dessas críticas,caso se trate de um indivíduo que minimamente conhece os direitos humanos e que repudia violações aos direitos humanos de grupos minorizados, sobretudo. Todavia, não justifica repetir previsões apocalípticas que nunca se concretizam nem ignorar violações graves cometidas por quem diz agir em nome da "democracia".
Desde os anos 90, Israel anuncia regularmente que o Irã estaria próximo de desenvolver armas nucleares, sem que essa previsão tenha se confirmado. Contraditoriamente, Israel nunca assinou o TNP, possui inúmeras ogivas e rejeita qualquer inspeção internacional em suas instalações nucleares.
Destarte, o grande problema não vem de supostos "ingênuos pró-Irã",por exemplo (como são chamados os que condenaram as açõe de Israel e dos Eua, mas de análises rasas que reduzem conflitos geopolíticos a torcida organizada e transformam direitos humanos em arma retórica seletiva.
Aqueles que condenam o véu obrigatório em Teerã e o chicote contra homossexuais, pela mesma lógica, condenam o bloqueio a Gaza, as bombas de fósforo branco, os assentamentos ilegais na Palestina (um verdadeiro holocausto a céu aberto) e a recusa israelense em se submeter ao Tratado de Não Proliferação.
A coerência não se mede pelo lado que empunha a bandeira, e sim pela disposição de aplicar os mesmos princípios a todos. Direitos humanos não são peças de xadrez.


