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Planejamento sucessório no meio rural: Preservação do legado e governança

Uma governança bem feita protege o patrimônio, reduz conflitos e prepara o futuro com segurança.

segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Atualizado às 14:19

No cerne do agronegócio brasileiro estão as empresas familiares, empreendimentos construídos ao longo de gerações que, com trabalho árduo, transformaram a terra em sustento, riqueza e identidade. Essas famílias fincaram raízes profundas no solo que cultivam, criando histórias marcadas por esforço, adaptação e visão de futuro. Nesse cenário, a sucessão não é apenas uma etapa: é um momento crítico que define se esse legado continuará florescendo ou se corre o risco de se perder com o tempo.

Apesar da relevância econômica dessas organizações, a falta de planejamento sucessório segue como um dos principais fatores de fragilidade no setor. A ausência de estratégias estruturadas pode comprometer não apenas a preservação do patrimônio, mas também a continuidade da gestão e a harmonia familiar - elementos fundamentais para a sobrevivência da empresa rural. Vale destacar que a sucessão no campo não se resume à simples transmissão de bens. Trata-se de um processo complexo que envolve a manutenção da gestão, a preservação da atividade produtiva e o equilíbrio entre os herdeiros.

O planejamento sucessório consiste em um processo sistemático que organiza a transferência do patrimônio e/ou empresarial, podendo ocorrer em vida, de forma antecipada e controlada, ou após o falecimento do titular. No agronegócio, sua importância é ainda mais significativa, pois a continuidade da atividade produtiva está diretamente ligada à estabilidade da gestão e à proteção jurídica do patrimônio familiar.

Dessa forma, o planejamento sucessório apresenta-se como um conjunto de estratégias preventivas que permitem antecipar decisões, preparar sucessores e implementar práticas de governança que garantam a sustentabilidade do negócio no longo prazo.

A ausência de mecanismos sucessórios eficientes expõe a empresa rural a riscos como a divisão excessiva de terras, a perda de escala produtiva e a dissolução da estrutura administrativa.

Pesquisas indicam que apenas uma pequena parcela das empresas familiares conseguem manter-se ao longo de várias gerações, com estudos apontando que cerca de 30% delas conseguem superar esse desafio. Esses números destacam a necessidade urgente de um planejamento sucessório eficaz para garantir a continuidade e o sucesso desses empreendimentos familiares.

Diversos instrumentos podem ser usados de forma combinada ou isolada para estruturar uma sucessão eficiente. Entre os mais comuns estão o testamento, que garante previsibilidade e autonomia na distribuição dos bens; a doação em vida, que antecipa a partilha com segurança e cláusulas restritivas; e a holding rural, que centraliza os bens em uma pessoa jurídica, separando a propriedade da gestão e facilitando a sucessão. Também se destacam os protocolos familiares, que definem regras claras para participação, sucessão e governança, e até o inventário, que, quando bem conduzido, pode ser útil para alocar ativos de maior risco.

A escolha do melhor instrumento depende da estrutura familiar, do tamanho do patrimônio, da realidade econômica da empresa e dos objetivos do titular. Em muitos casos, a combinação dessas ferramentas oferece maior segurança e efetividade. A criação de conselhos estratégicos, consultivos ou de administração, a contratação de assessoria especializada e a preparação adequada dos herdeiros são práticas que fazem toda a diferença no sucesso do processo sucessório.

Quando os filhos não desejam ou não estão aptos a assumir a gestão do negócio, uma solução viável é a profissionalização da administração, com executivos de confiança que mantenham o negócio operando de forma eficiente, preservando a propriedade e a coesão familiar. Um desafio recorrente, porém, é a resistência cultural por parte de muitos produtores, que associam o planejamento à perda de controle sobre o patrimônio. Essa mentalidade centralizadora dificulta a inclusão gradual dos herdeiros na gestão e aumenta o risco de conflitos no futuro. Por isso, o apoio jurídico especializado e o diálogo familiar são fundamentais para o êxito do processo.

Outro ponto de atenção é o favoritismo - prática perigosa é ainda comum. Promover membros da família com base apenas em vínculos afetivos, e não em preparo, pode comprometer seriamente a gestão e colocar em risco a continuidade da empresa rural. A capacitação deve ser pilar do planejamento sucessório.

Ao discutir práticas eficientes e instrumentos adequados, pretende-se contribuir para uma cultura de gestão profissional no agronegócio, fortalecendo a competitividade e a continuidade do setor.

Ao adotar práticas eficientes e instrumentos adequados, o produtor rural não apenas protege seu patrimônio, mas também contribui para a construção de uma cultura de gestão profissional no agronegócio. O planejamento sucessório é uma ferramenta estratégica para assegurar a continuidade das atividades, a preservação do legado e a harmonia entre os herdeiros. É fundamental estruturar soluções que garantam uma transição segura, minimizando riscos jurídicos, operacionais e familiares. Ao lançar mão de mecanismos como a holding rural, os protocolos familiares e acordos societários, o produtor cria um modelo sustentável, capaz de perpetuar o trabalho de gerações e fortalecer a competitividade do setor.

"Sempre observo que cada propriedade carrega memórias de quem a construiu. Ressalto que planejar a sucessão é garantir que esse legado familiar permaneça vivo e fortalecido no futuro, a sucessão é um gesto de continuidade do legado familiar."

Maria Eduarda Magalhães Matos

Maria Eduarda Magalhães Matos

Pós-graduada em Direito do Agronegócio. Pós-graduanda em Direito Empresarial e Civil. Estágios realizados durante a graduação: PC/MG, MPMG, DP/MG. Presidente da Comissão de Direito Agrário OAB/GV

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