Bancos x empresas: O limite entre renegociação e execução
Bancos devem equilibrar renegociação e execução de dívidas corporativas, visando a estabilidade financeira sem comprometer relações fundamentais.
quarta-feira, 10 de setembro de 2025
Atualizado às 14:56
Introdução
O crédito corporativo é um pilar essencial da economia real, funcionando como um vetor de liquidez para diversas cadeias produtivas. De acordo com dados do Banco Central (2024), as operações concedidas a empresas ultrapassaram R$ 2,3 trilhões, representando mais da metade da carteira total de crédito do país. Nesse contexto, a inadimplência não impacta apenas os balanços dos bancos, mas ameaça a estabilidade do sistema como um todo. Assim, surge a questão: quando é prudente renegociar e quando a execução se torna uma obrigação?
1. O dilema estratégico: preservar ou executar?
A decisão sobre o momento certo para a execução envolve três dimensões cruciais:
- Liquidez: qual a probabilidade real de recuperação extrajudicial?
- Relacionamento: o devedor é um cliente estratégico ou apenas circunstancial?
- Compliance regulatório: as medidas adotadas estão em conformidade com as normas do Banco Central e do Conselho Monetário Nacional?
Erros comuns incluem proteger indefinidamente o relacionamento em prejuízo da efetividade ou executar de forma apressada, comprometendo relações comerciais que poderiam resultar em uma recuperação maior. O ponto de equilíbrio exige uma análise integrada que leve em consideração riscos jurídicos, contábeis e reputacionais.
2. A função econômica da renegociação
A renegociação é muitas vezes vista como uma concessão, mas na prática, é um instrumento de política econômica privada que pode ser analisado sob diversas vertentes:
- Contábil: ao reclassificar operações e adiar provisões (CPC 48/IFRS 9), os bancos conseguem melhorar seus indicadores de inadimplência (NPLs).
- Comercial: a preservação dos relacionamentos com clientes estratégicos evita rupturas em setores-chave.
- Pragmática: oferece um respiro ao devedor, permitindo a recuperação do fluxo de caixa.
No entanto, a renegociação tem seus limites. Quando é utilizada reiteradamente sem base em capacidade de pagamento, transforma-se em procrastinação artificial, podendo gerar "empresas zumbis" que, ao serem mantidas, distorcem o risco sistêmico e consomem crédito sem viabilidade.
3. O limite jurídico da execução
Ao alcançar um ponto crítico, a judicialização deixa de ser uma opção e se torna um dever fiduciário do banco, em conformidade com o princípio da boa administração dos recursos (art. 170 da CF/88; art. 1º, lei 4.595/1964). O CPC/15 oferece instrumentos eficazes para tal:
- Execução de título extrajudicial: como cédulas de crédito bancário, duplicatas e notas promissórias.
- Ação monitória: apropriada para dívidas com prova escrita que não têm eficácia executiva.
- Execução de garantias reais e fidejussórias: incluindo hipoteca e fiança, que permitem constrição célere e proporcional.
A falta de uso desses instrumentos pode resultar em gestão temerária, afetando os índices de Basileia e comprometendo a governança corporativa.
4. O papel do compliance e da governança
A transição de um processo de renegociação para um de execução envolve não apenas aspectos jurídicos, mas também é uma questão de governança. Os bancos que seguem as diretrizes do Acordo de Basileia III e do CMN devem demonstrar gestão ativa do risco de crédito. A falta de reação adequada frente à inadimplência pode indicar falhas em controles internos e acarretar consequências negativas nas auditorias externas. A judicialização planejada reforça a responsabilidade fiduciária dos gestores e protege os interesses de acionistas e depositantes.
Conclusão
O crédito corporativo deve ser encarado como um elemento vital de liquidez e não apenas como um recurso financeiro. Ele demanda disciplina e transparência.


