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Saúde privada: Estratégias de cobrança com imagem intacta

Hospitais e labs podem reduzir inadimplência com gestão de glosas, monitória, execução e arbitragem, aliando LGPD e proporcionalidade. Menos ruído público, mais recuperação mensurável.

quarta-feira, 17 de setembro de 2025

Atualizado às 13:44

Introdução - quando o caixa ameaça a missão

Imagine um hospital que atende centenas de pacientes diariamente, realiza cirurgias de alta complexidade e investe milhões em equipamentos de ponta. Apesar da qualidade reconhecida, enfrenta um problema silencioso: convênios que atrasam pagamentos, glosas administrativas injustificadas e pacientes particulares inadimplentes.

O resultado é dramático: fornecedores sem receber, folha de pagamento sob risco e projetos de inovação paralisados. Segundo a ANAHP, o setor privado de saúde movimenta mais de R$ 280 bilhões por ano e responde por 9% do PIB nacional, mas convive com um problema estrutural que ameaça sua sustentabilidade: a inadimplência.

A questão central é: como acelerar a recuperação de créditos sem abalar o ativo intangível mais valioso da saúde - a reputação?

1. O cenário da inadimplência hospitalar

De acordo com a CNSaúde (2024)45% dos hospitais privados registram atrasos superiores a 90 dias nos recebimentos de convênios e contratos corporativos. Os impactos são severos:

  • Fluxo de caixa comprometido: a alta dos insumos e medicamentos pressiona margens.
  • Folha de pagamento sob tensão: profissionais de saúde não podem sofrer atrasos salariais.
  • Investimentos travados: tecnologias médicas exigem atualização contínua, inviável sem liquidez.

Muitas vezes, a inadimplência não decorre de má-fé, mas de glosas administrativas das operadoras ou da morosidade estatal nos contratos públicos.

2. O dilema reputacional

Cobrar créditos na saúde é diferente de qualquer outro setor. Uma cobrança agressiva contra pacientes pode ser devastadora para a imagem de um hospital ou laboratório.

Por isso, é necessário equilibrar:

  • Cobrança humanizada (quando voltada a pacientes), preservando dignidade e confiança.
  • Cobrança institucional e estratégica (quando dirigida a convênios e entes públicos), com mecanismos jurídicos robustos, mas sem exposição pública desnecessária.

Aqui, a ética e a reputação caminham lado a lado com o jurídico.

3. Ferramentas jurídicas aplicáveis

CPC/15 e legislação correlata oferecem meios adequados para a saúde, desde que aplicados de forma planejada:

  • Ação monitória (art. 700): cabível com notas fiscais, prontuários e comprovantes de internação.
  • Execução de título extrajudicial (art. 784): quando há contrato escrito ou confissão de dívida.
  • Gestão de glosas: revisão administrativa especializada para contestar recusas indevidas.
  • Execução contra entes públicos: uso do Sisbajud e pedidos de sequestro em caso de descumprimento reiterado.
  • Arbitragem: em contratos privados de grande porte, pode ser mais célere que o Judiciário.

4. Jurisprudência relevante

STJ já consolidou entendimentos que reforçam a segurança jurídica do setor:

  • Notas fiscais e documentos médicos podem embasar ação monitória, ainda que não exista contrato formal assinado pelo paciente.
  • Penhora de faturamento de operadoras é admitida quando respeitada a proporcionalidade, garantindo a continuidade do serviço.

Esses precedentes permitem que hospitais e laboratórios ajam com firmeza, sem perder legitimidade.

5. Conclusão - cobrar bem também salva vidas

A inadimplência na saúde não pode ser tratada como mero problema contábil. Ela ameaça a continuidade dos serviços, a credibilidade institucional e, em última instância, a própria prestação de cuidados essenciais.

Hospitais e laboratórios que adotam estratégias de cobrança estruturada, fundamentada e humanizada não apenas protegem seu fluxo de caixa, mas fortalecem a confiança de pacientes, operadoras e parceiros.

Em resumo: na saúde, cobrar bem é tão estratégico quanto salvar vidas.

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Referências

ANAHP - Associação Nacional de Hospitais Privados

CNSaúde - Confederação Nacional de Saúde

CPC - Lei 13.105/15

Felipe Augusto Vieira Leal Bezerra

VIP Felipe Augusto Vieira Leal Bezerra

Sócio da FVL Advocacia, atua em execução civil, litígios patrimoniais e recuperação de crédito, com especializações em Direito Empresarial, Processual Civil e Dívidas Bancárias.

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