Tentativa de equalização das multas no PLP 108/24
Relatório enviado à Comissão de Constituição Cidadania e Justiça busca harmonizar a legislação, corrigir injustiças e reduzir contencioso relativo a penalidades pecuniárias
sexta-feira, 19 de setembro de 2025
Atualizado às 09:44
A Comissão de Constituição e Justiça recebeu, em 10 de setembro de 2025, o relatório do senador Eduardo Braga sobre o PL 108/24, de iniciativa do Poder Executivo, que trata da segunda etapa da regulamentação da reforma tributária sobre o consumo.
Com o intuito de harmonizar a legislação, corrigir injustiças e reduzir o contencioso, o relatório propôs modificações no Capítulo VII do Título I do Livro I do projeto, que trata de infrações e penalidades relativas ao IBS.
Para facilitar a identificação das principais mudanças sugeridas, vejamos como a matéria havia sido tratada no texto aprovado pela Câmara dos Deputados, enviado ao Senado Federal em 8 de novembro de 2024:
- o inadimplemento do crédito tributário enseja a aplicação de multa moratória de 0,33% ao dia, limitada a 20% sobre o valor do IBS (art. 53);
- o valor do crédito tributário correspondente às multas pertence aos entes federativos que promoverem a fiscalização (art. 54);
- foi instituída a Unidade Padrão Fiscal do UPF/IBS - Imposto sobre Bens e Serviços, no valor de R$ 200,00, a ser atualizada mensalmente pela variação do IPCA - Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (art. 55);
- é possível cumular multas por descumprimento de obrigação principal com multas por descumprimento de obrigação acessória (art. 56);
- é possível cumular penalidades pecuniárias com outras medidas administrativas, como, por exemplo, a cassação de licenças (art. 57);
- o descumprimento de obrigação tributária principal constatado em ação fiscal fica sujeito à multa de ofício de 75% do valor do IBS não declarado e não recolhido ou do crédito indevidamente aproveitado (art. 58);
- há um rol de penalidades por descumprimento de obrigações acessórias relativas ao IBS, algumas delas estipuladas em valor fixo por documento, infração, período de apuração, equipamento ou estabelecimento; outras fixadas em percentual sobre o valor do IBS devido ou, ainda, aquelas que incidem sobre o valor da operação (art. 59);
- as multas serão de 10% do valor da operação quando não houver IBS a pagar, limitadas a 100% do tributo na soma das penalidades cumuladas (art. 59, parágrafo 2º);
- as multas aplicadas em lançamento de ofício podem ser quitadas com redução de 50%, se o pagamento ocorrer no prazo da impugnação administrativa; e com redução de 25%, se o pagamento ocorrer antes da inscrição do débito em dívida ativa; majorando-se os referidos percentuais para 60% e 35%, respectivamente, para contribuintes que participem de programa de conformidade estabelecido pelo Comitê Gestor do IBS (art. 60);
O relatório apresentado pelo senador Eduardo Braga, que será objeto de debate na Comissão Constituição, Justiça e Cidadania, buscou aperfeiçoar o texto aprovado na Câmara dos Deputados, a fim de harmonizar a legislação do IBS e da CBS, corrigir injustiças e reduzir o contencioso.
Numa análise geral, o relatório conclui pela inexistência de óbices de natureza constitucional, jurídica ou regimental à proposição, ressalvando que os potenciais vícios de constitucionalidade identificados se referem a dispositivos específicos, os quais foram objeto de saneamento e ajustes.
Ao tratar especificamente das infrações e penalidades, o relatório destaca, inicialmente, o receio dos contribuintes de que o caráter nacional do IBS, aliado à capacidade ativa para arrecadar o valor das multas decorrentes de sua fiscalização, instaure uma verdadeira "indústria de multas" no país.
Para equacionar o problema, foi sugerido que os entes registrassem em sistema eletrônico o interesse em instaurar uma fiscalização, consignando o sujeito passivo, o tipo de operação, o período abrangido e os motivos determinantes. Com isso, seria evitada a abertura de procedimentos fiscais sem lastro e todos os entes teriam oportunidade de aderir às fiscalizações instauradas, garantindo a efetividade das fiscalizações conjuntas sem sobrecarregar o contribuinte.
Outro ponto destacado foi a necessidade de unificação e simplificação da legislação. Como no texto aprovado pela Câmara as disposições sobre multas diziam respeito apenas ao IBS, os senadores concluíram que seria tecnicamente mais adequada a previsão de uma sistemática conjunta de infrações e penalidades para o IBS e a CBS, propondo o deslocamento das correspondentes disposições para a LC 214/25, mediante inserção dos arts. 341-A a 341-H.
Também foi aventada no relatório a injustiça na aplicação da mesma penalidade para o contribuinte que omitiu fatos relevantes para a apuração dos tributos e para aquele que declarou todos os fatos, mas havia divergência de entendimento acerca do montante devido - a chamada multa interpretativa.
Com o intuito de reparar a injustiça e evitar o contencioso, optou-se pelo acolhimento parcial das respectivas emendas, reduzindo-se a multa de forma linear nos casos em que o sujeito passivo tenha entregado todos os fatos ao conhecimento da Administração Tributária.
Além disso, foram ampliadas as hipóteses de descontos para contribuintes que se proponham a pagar ou parcelar os débitos espontaneamente:
- 50% para pagamento integral no prazo da impugnação;
- 40% para parcelamento no prazo da impugnação;
- 30% para pagamento integral antes da inscrição em dívida ativa;
- 20% para parcelamento antes da inscrição em dívida ativa.
Os referidos percentuais serão majorados para 60%, 50%, 40% e 30% com relação aos contribuintes que participem do PNCT - Programa Nacional de Conformidade Tributária ou que tenham bons antecedentes fiscais.
Importante destacar ainda que não passou desapercebida no senado a problemática relacionada ao dimensionamento dos patamares das multas. A esse respeito, o relatório ponderou que o foco na punição do contribuinte não tem se mostrado efetivo na prática, levando as administrações tributárias modernas a investir na identificação de outros fatores que estimulem o cumprimento voluntário das obrigações, acrescentando que o Poder Judiciário tem adotado uma política de moderação sancionatória em suas decisões, citando, como exemplo, a tese fixada pelo STF no Tema 863 da repercussão geral.
De acordo com o relatório, na tentativa de adaptar o PLP 108/24 à jurisprudência da Corte Constitucional, a Câmara dos Deputados inseriu no texto o teto de 100% do IBS devido para as multas, como já mencionado no artigo.
No entanto, segundo os senadores, a imposição desse limite juntamente com penalidades que chegam a 30% do valor da operação, quando se estima a alíquota do IBS em 18% e da CBS em 10%, faz com que, na prática, o teto das penalidades seja sempre 100% do tributo devido, tornando os percentuais sobre o valor da operação meramente fictícios.
Ainda com relação à limitação das multas, o relatório consignou que a simples alteração de sua base de cálculo, de modo que as penalidades incidam sobre o valor do tributo devido, favoreceria o infrator que possui regime com redução de alíquota.
Para corrigir essa distorção, foi sugerida a criação do "valor do tributo de referência" como base de cálculo das penalidades, correspondente à multiplicação da alíquota de referência sobre o valor da operação, ainda que beneficiada com imunidade, isenção, alíquota zero, alíquota reduzida, diferimento ou suspensão.
Com isso, contribuintes que pratiquem o mesmo tipo infracional, com grau de reprovação equivalente, sofrerão punição idêntica, ainda que beneficiários de alíquotas reduzidas. Além disso, serão evitadas novas disputas judiciais e administrativas fundamentadas no efeito confiscatório das penalidades.
O relatório ainda propõe o afastamento de multas em caso de falha ou erro material na entrega de declarações, arquivos e documentos, desde que não haja prejuízo ao conhecimento dos elementos essenciais da operação, asseverando que esse tipo de equívoco deve ser corrigido pela via da autorregularização, e não pela imposição de severas penalidades.
Outra inovação trazida foi a instituição de penalidades não tributárias relativas ao split payment, visando punir instituições financeiras e equiparadas em caso de descumprimento do dever de segregar os tributos e de recolher os valores aos cofres públicos, com o intuito de garantir a efetividade da ferramenta.
Em suma, o relatório sugere (1) um mecanismo para evitar a instauração de uma verdadeira "indústria da multa" no país; (2) a criação de um sistema único de infrações e penalidades para o IBS e a CBS; (3) a redução da multa para o contribuinte que, embora declare a menor o tributo, preste informações sobre todos os fatos necessários à sua apuração; (4) a criação do valor do tributo de referência como base de cálculo das multas, para evitar que contribuintes agraciados com alíquotas reduzidas sejam apenados de forma mais branda; (5) a não aplicação de multa por falha ou erro material na escrituração ou nas declarações, desde que não prejudique o conhecimento dos elementos essenciais da operação; (6) a ampliação das hipóteses de descontos para pagamento ou parcelamento voluntários; e (7) o estabelecimento de multas não tributárias para garantir a efetividade do split payment.
Assim, embora nem todos os pleitos dos contribuintes tenham sido acolhidos no relatório do senador Eduardo Braga sobre o PLP 108/24, que será debatido na Comissão de Constituição, Cidadania e Justiça, de forma geral, as alterações propostas sobre infrações e penalidades soam favoráveis e têm potencial para corrigir algumas injustiças previstas no texto aprovado na Câmara.


