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O que é planejamento previdenciário?

Planejamento previdenciário é essencial para garantir segurança e estabilidade na velhice. Com orientação profissional e escolhas certas, sua aposentadoria será bem melhor.

segunda-feira, 29 de setembro de 2025

Atualizado às 15:12

O planejamento previdenciário é um direito essencial para garantir a tranquilidade financeira na aposentadoria. Assim como organizamos as grandes conquistas da vida - a compra de um imóvel, a formação de uma família ou a realização de um projeto profissional -, é fundamental estruturar o momento da inatividade. A ausência desse cuidado leva muitos segurados a descobrir tardiamente que suas contribuições foram inadequadas, resultando em benefícios com valores muito aquém do esperado e do que seria de direito.

Este planejamento consiste em uma análise minuciosa de toda a vida contributiva do segurado, seja no RGPS - Regime Geral de Previdência Social, em RPPS - Regimes Próprios ou na previdência privada. O objetivo é projetar os ganhos futuros e, principalmente, identificar e executar as ações necessárias para assegurar o melhor benefício possível.

1. O fundamento doutrinário: O direito ao melhor benefício

A doutrina previdenciária consolidou o entendimento de que o planejamento não é um mero exercício de futurologia, mas a aplicação concreta do princípio do melhor benefício. Este princípio, embora não esteja expresso na CF, é uma decorrência direta do direito social à previdência (art. 6º, CF) e da garantia de cálculo do benefício mais vantajoso.

Como ensina o doutrinador Wladimir Novaes Martinez, a proteção social deve ser efetiva, e a concessão da aposentadoria deve corresponder à situação que melhor reflita o histórico contributivo do trabalhador. Trata-se de um direito subjetivo do segurado de ter sua prestação previdenciária calculada da forma mais favorável, desde que preenchidos os requisitos legais.

Essa tese foi consagrada pelo STF e é replicada em diversas decisões, garantindo ao segurado o direito de ver seu benefício concedido ou revisado para corresponder à maior RMI - renda mensal inicial possível.

STJ - REsp 1.213.855 RS - Publicado em 28/10/16

O STJ, alinhando-se ao STF, reconheceu o direito adquirido ao melhor benefício, assegurando a possibilidade de os segurados terem seus benefícios deferidos ou revisados de modo que correspondam à maior renda mensal inicial possível, no cotejo entre aquela obtida e as que estariam percebendo se tivessem requerido o benefício em momento anterior.

2. A análise da vida contributiva e as estratégias jurídicas

O planejamento eficaz depende de uma análise criteriosa do CNIS - Cadastro Nacional de Informações Sociais e de toda a documentação do segurado. A partir desse diagnóstico, diversas estratégias podem ser adotadas:

Correção de vínculos e remunerações: É comum que o CNIS contenha erros, como vínculos não registrados, datas incorretas ou salários de contribuição abaixo do real. O planejamento permite a retificação desses dados, o que impacta diretamente o cálculo do benefício.

Averbação de tempo de serviço: Períodos trabalhados e não registrados, como tempo de serviço rural, especial (insalubre ou perigoso) ou tempo reconhecido em reclamatória trabalhista, podem ser averbados. A jurisprudência é firme ao afastar a decadência para o reconhecimento de tempo de serviço que não foi analisado pelo INSS no ato da concessão.

STJ - REsp 1.478.735 SE - Publicado em 22/6/16

O STJ entende que o prazo decadencial de 10 anos não alcança questões que não foram objeto de apreciação pela Administração, como a averbação de tempo de serviço reconhecido em sentença trabalhista, permitindo a revisão do benefício a qualquer tempo para incluir tais períodos.

Soma de contribuições em atividades concomitantes: O segurado que trabalhou em mais de um local ao mesmo tempo tem o direito de somar os salários de contribuição para o cálculo do benefício, respeitado o teto previdenciário. Essa possibilidade, consolidada pelo STJ no Tema 1.070, afastou a antiga regra de cálculo proporcional que prejudicava o trabalhador.

TRF-3 - apelação cível 50197513520234036183 - Publicado em 9/5/25

Após a lei 9.876/1999, é cabível a soma de todos os salários de contribuição de atividades concomitantes para o cálculo do benefício, afastando-se a sistemática proporcional que antes reduzia o valor da RMI.

Reafirmação da DER - Data de Entrada do Requerimento: Se o segurado não preenchia os requisitos na data do pedido administrativo (DER), mas os completou no curso do processo, é possível "reafirmar a DER" para a data em que o direito foi adquirido. Essa estratégia, confirmada pelo STJ no Tema 995, evita um novo pedido e garante o benefício mais vantajoso.

TRF-4 - AC 50060753220214047001 PR - Publicado em 11/12/24

É possível a reafirmação da DER para o momento em que os requisitos para a concessão do benefício foram implementados, mesmo que no curso da ação judicial, garantindo ao segurado o benefício mais vantajoso.

3. A "revisão da vida toda" e a segurança jurídica

Uma das discussões mais importantes no planejamento previdenciário foi a "Revisão da Vida Toda". A tese buscava permitir que o segurado optasse pela regra definitiva do art. 29 da lei 8.213/91, caso fosse mais favorável, incluindo no cálculo da RMI os salários de contribuição de todo o período contributivo, inclusive os anteriores a julho de 1994.

Inicialmente, o STJ havia se posicionado favoravelmente no Tema 999 (STJ - REsp 1.554.596 SC). Contudo, em uma reviravolta jurisprudencial, o STF, no julgamento do Tema 1.102, decidiu pela constitucionalidade da regra de transição do art. 3º da lei 9.876/99, tornando-a obrigatória e, na prática, inviabilizando a "Revisão da Vida Toda".

4. Atenção ao prazo decadencial

É crucial observar que o direito de revisar o ato de concessão do benefício está sujeito a um prazo decadencial de 10 anos, conforme o art. 103 da lei 8.213/91. Isso significa que, uma vez concedida a aposentadoria, o segurado tem uma década para pleitear uma revisão que altere a RMI.

STJ - REsp 1.631.021 PR - Publicado em 13/3/19

No julgamento do Tema 966, o STJ firmou a tese de que o prazo decadencial de 10 anos incide sobre o reconhecimento do direito adquirido ao benefício previdenciário mais vantajoso, resguardando a segurança jurídica e o equilíbrio do sistema.

Conclusão

Longe de ser um luxo, o planejamento previdenciário é um instrumento de justiça e efetivação de direitos. Ele permite que o segurado não seja um mero espectador do cálculo realizado pelo INSS, mas um agente ativo na construção de sua aposentadoria. Com base em sólidos fundamentos doutrinários e jurisprudenciais, é possível corrigir falhas, otimizar contribuições e escolher o melhor caminho para garantir uma aposentadoria saudável, estável e compatível com o padrão de vida construído ao longo de anos de trabalho.

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https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/863077644

https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/862217228

https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/2106327966?verified=true

https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trf-3/3706987331

https://www.jusbrasil.com.br/busca?q=stj%2C+tema+995

https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trf-4/3595084619

https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/859941693

https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stf/1810404106?verified=true

https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/2106283347

https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/2106283347?verified=true

Ciria Nazare do Socorro Batista dos Santos

Ciria Nazare do Socorro Batista dos Santos

Advogada formada pela UFPA, OAB/PA nº 10.855, com mais de 20 anos de experiência, sendo especialista nas áreas de Previdenciário (IEPREV- UNIS, 2023) e Direito Público (FAP,2006).

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