Motoristas de aplicativo: Até onde vai o poder do algoritmo?
O artigo analisa a vulnerabilidade de motoristas de aplicativo, destacando como bloqueios e decisões automatizadas podem afetar sua renda e comprometer sua dignidade na economia digital.
segunda-feira, 29 de setembro de 2025
Atualizado às 15:16
Introdução
No Brasil, cerca de 1,7 milhão de motoristas de aplicativo estão em atividade, segundo dados de junho de 2025. Para esses trabalhadores, a plataforma não é apenas uma ferramenta de trabalho: ela é chefe, fonte de renda e, muitas vezes, juiz implacável.
Bloqueios repentinos e sem explicações claras vêm alimentando a insatisfação da categoria, levando centenas de motoristas a recorrer à Justiça em busca de respostas. Apenas na esfera trabalhista, já são quase 8 mil processos ativos no país relacionados a motoristas de aplicativo.
Um caso que virou símbolo
Entre tantas ações, um processo chamou a atenção.
Um motorista, mesmo com bom histórico na plataforma, teve sua conta desativada e perdeu na primeira instância. O juiz considerou legítima a decisão da empresa, aceitando como prova os registros internos do aplicativo as chamadas "telas sistêmicas".
A defesa contestou a decisão, questionando a validade das provas apresentadas. Eles sustentaram que se tratava de evidências unilaterais, já que eram produzidas, controladas e apresentadas exclusivamente pela própria empresa.
Esse desequilíbrio expõe uma fragilidade estrutural: como o trabalhador pode se defender de forma justa se todas as evidências estão nas mãos da parte contrária?
Em recurso, a turma recursal do Tribunal de Justiça chegou a uma conclusão oposta. Reconhecendo a fragilidade das provas, determinou a reativação da conta do motorista e fixou indenização por perdas financeiras e danos morais.
Liberdade contratual x função social
Na sua defesa, a empresa alegou ter autonomia para decidir com quem mantém relações comerciais. Contudo, os juízes destacaram que essa liberdade não é absoluta.
Quando um contrato representa a principal fonte de sustento de uma família, ele deve ser regido pelos princípios da boa-fé e da função social do contrato. Isso significa que não pode ser encerrado de forma arbitrária, sob pena de causar danos desproporcionais ao trabalhador.
Reflexão: A estrada ainda é longa
O caso é emblemático e gera uma reflexão urgente: em um mundo cada vez mais guiado por algoritmos, quais garantias mínimas precisamos exigir para proteger a dignidade dos trabalhadores de aplicativo?
Enquanto não houver uma resposta clara e abrangente, cada bloqueio injusto será um lembrete de que a economia digital ainda precisa evoluir para ser mais equilibrada e justa.


