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Recuperação judicial: Salve sua empresa antes que seja tarde

A recuperação judicial permite que empresas em crise reorganizem dívidas, evitem a falência e mantenham empregos, credores e a atividade econômica funcionando.

quinta-feira, 9 de outubro de 2025

Atualizado às 09:22

O que é recuperação judicial?

A recuperação judicial é um processo previsto na lei 11.101/05 (lei de falências e recuperação judicial) que possibilita às empresas em crise financeira renegociar suas dívidas com credores sob supervisão judicial. O objetivo principal é viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira, permitindo a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores.

Diferentemente da falência, que liquida os bens da empresa, a recuperação judicial busca sua reestruturação e continuidade das atividades empresariais. Trata-se de um mecanismo de proteção tanto para a empresa quanto para seus credores, que têm maior probabilidade de receber seus créditos do que em um processo falimentar.

Base legal da recuperação judicial

A recuperação judicial está fundamentada principalmente em:

Lei Federal 11.101/05 - Regula a recuperação judicial, extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Esta lei trouxe mudanças significativas ao antigo sistema concordatário, modernizando o tratamento das crises empresariais no Brasil.

CF/88 - Arts. 170 e 174, que estabelecem os princípios da ordem econômica, incluindo a função social da empresa e a livre iniciativa como fundamentos do sistema econômico brasileiro.

CC (lei 10.406/02) - Artigos relacionados ao direito empresarial e obrigações, que complementam o regime jurídico das sociedades empresárias.

CPC - Aplicado subsidiariamente aos procedimentos não regulados especificamente pela lei de recuperação, garantindo a observância dos princípios processuais.

Além disso, há jurisprudência consolidada do STJ que orienta a aplicação da lei em casos específicos, adaptando a norma às diferentes realidades empresariais do país.

Como funciona a recuperação judicial na prática

O processo de recuperação judicial segue etapas bem definidas que garantem a participação de todos os interessados e a transparência do procedimento:

Fase 1: Petição inicial

O devedor protocola o pedido de recuperação judicial na comarca onde mantém seu principal estabelecimento. A petição deve estar acompanhada de documentos que comprovem a situação financeira da empresa, lista completa de credores com valores atualizados, demonstrações contábeis dos últimos três anos, certidões negativas de débitos tributários e outros documentos exigidos pela lei. Esta documentação é essencial para que o juiz possa avaliar a viabilidade da recuperação.

Fase 2: Análise e deferimento

O juiz analisa se o pedido atende aos requisitos legais formais e materiais. Se positivo, defere o processamento da recuperação judicial, nomeando um administrador judicial (profissional independente que fiscalizará o processo) e determinando a suspensão de ações e execuções contra o devedor por 180 dias (stay period). Este período é fundamental para que a empresa possa se reorganizar sem a pressão de execuções judiciais.

Fase 3: Apresentação do plano

A empresa tem até 60 dias após o deferimento para apresentar o plano de recuperação judicial, detalhando como pretende superar a crise e pagar os credores. O plano deve ser realista, demonstrar viabilidade econômica e especificar os meios de recuperação que serão empregados, como reestruturação operacional, venda de ativos, captação de novos recursos ou alteração na gestão.

Fase 4: Assembleia geral de credores

Os credores se reúnem para discutir e votar o plano apresentado pela empresa. A aprovação depende do voto favorável da maioria dos credores presentes em cada classe: trabalhistas, credores com garantia real, quirografários (sem garantia) e microempresas/empresas de pequeno porte. Cada classe tem regras específicas de votação, e o plano só é aprovado se obtiver a maioria necessária em todas elas.

Fase 5: Homologação e cumprimento

Aprovado o plano pelos credores, o juiz homologa a recuperação judicial através de sentença. A empresa passa então a cumprir o plano sob fiscalização do administrador judicial por 2 anos. Durante este período, a empresa deve apresentar relatórios mensais de suas atividades, comprovar o cumprimento das obrigações assumidas e manter-se adimplente com as obrigações posteriores ao pedido de recuperação.

Requisitos subjetivos necessários para recuperação judicial

A recuperação judicial pode ser solicitada quando a empresa enfrenta sérias dificuldades financeiras, mas ainda apresenta viabilidade econômica. Alguns sinais de que pode ser o momento adequado para considerar a recuperação judicial são:

Dificuldade em honrar dívidas: A empresa não consegue cumprir seus compromissos financeiros.

Cobranças judiciais: A empresa está sendo alvo de múltiplas ações de cobrança.

Redução nas vendas e nos lucros: A empresa enfrenta uma queda expressiva em seu faturamento e rentabilidade.

Requisitos objetivos necessários para recuperação judicial

Para requerer recuperação judicial, a empresa deve atender aos seguintes requisitos estabelecidos no art. 48 da lei 11.101/05:

Exercer atividade empresarial regular há mais de 2 anos - Comprovado por documentos contábeis, balanços patrimoniais e registros na Junta Comercial. Este requisito evita que empresas recém-criadas ou sem histórico operacional utilizem o instituto.

Não ser falida - Empresas que já tiveram falência decretada não podem pedir recuperação, exceto se já foram reabilitadas judicialmente após o encerramento do processo falimentar.

Não ter obtido recuperação judicial há menos de 5 anos - Existe um prazo de carência entre recuperações judiciais sucessivas, impedindo o uso abusivo do instituto.

Não ter obtido recuperação especial há menos de 8 anos - Para microempresas e empresas de pequeno porte que utilizaram o procedimento especial simplificado.

Não ter sido condenada por crime falimentar - O devedor ou seus administradores não podem ter condenações criminais transitadas em julgado relacionadas a falências, como fraude contra credores ou contabilidade irregular.

É importante destacar que cooperativas, instituições financeiras públicas ou privadas, operadoras de planos de saúde, sociedades de capitalização, entidades de previdência complementar e empresas administradoras de consórcios não podem utilizar a recuperação judicial, estando sujeitas a regimes especiais de intervenção e liquidação extrajudicial.

Linha do tempo de um RJ

O processo de recuperação judicial envolve diversos prazos que devem ser rigorosamente observados, sob pena de graves consequências:

Até 3 dias após o protocolo - Verificação preliminar dos requisitos formais pelo juiz, analisando se a documentação está completa.

Até 5 dias do deferimento - Publicação de edital no Diário Oficial e em jornal de grande circulação, comunicando o deferimento da recuperação a todos os credores e ao mercado.

30 dias após a publicação do edital - Prazo para credores apresentarem suas habilitações de crédito, informando valores devidos, natureza do crédito e eventuais garantias.

60 dias após o deferimento - Prazo fatal e improrrogável para a empresa apresentar o plano de recuperação judicial. O descumprimento deste prazo resulta na convolação em falência.

45 dias após a apresentação do plano - Prazo para impugnações e objeções ao plano pelos credores, que podem contestar a viabilidade ou propor modificações.

150 dias do deferimento - Prazo máximo para realização da Assembleia Geral de Credores, onde o plano será discutido e votado.

180 dias do deferimento - Término do stay period, quando cessa a suspensão automática das execuções contra o devedor.

2 anos após a homologação - Período de fiscalização intensiva durante o cumprimento do plano, no qual qualquer descumprimento pode resultar em falência.

Durante todo o processo, a empresa deve apresentar relatórios mensais de suas atividades ao administrador judicial, mantendo transparência total sobre sua situação financeira, operacional e o cumprimento das obrigações do plano.

Quanto tempo dura uma recuperação judicial?

O processo completo varia de 6 meses a 2 anos até a homologação do plano, dependendo da complexidade da empresa e da cooperação dos credores. Após a homologação, a empresa permanece em recuperação por mais 2 anos durante o cumprimento das obrigações assumidas no plano.

A empresa pode continuar operando normalmente?

Sim. Uma das principais características e vantagens da recuperação judicial é permitir que a empresa continue suas atividades durante todo o processo, inclusive podendo realizar novos negócios, contratar fornecedores e funcionários. As dívidas novas, contraídas após o pedido de recuperação, são consideradas extraconcursais e têm prioridade de pagamento.

Quais dívidas entram na recuperação judicial?

Entram débitos anteriores ao pedido de recuperação: fornecedores, empréstimos bancários sem garantia real, trabalhistas limitados a 150 salários-mínimos por credor, e outros créditos quirografários. Não entram: créditos tributários (que devem ser negociados diretamente com o Fisco), dívidas posteriores ao pedido, adiantamentos de contrato de câmbio e, opcionalmente, financiamentos com garantia fiduciária se o credor optar pela execução da garantia.

É possível converter recuperação judicial em falência?

Sim. A conversão em falência ocorre obrigatoriamente se a empresa não apresentar o plano no prazo de 60 dias, se houver descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano homologado durante os 2 anos de fiscalização, ou se houver prática de atos fraudulentos durante o processo.

Empresas individuais podem pedir recuperação judicial?

Sim, desde que o empresário individual exerça atividade empresarial regularmente há mais de 2 anos e atenda aos demais requisitos legais. MEI - Microempreendedores individuais, por sua vez, não podem requerer recuperação judicial.

Conclusão

A recuperação judicial é um processo complexo, mas essencial para empresas viáveis que enfrentam dificuldades financeiras temporárias. Compreender cada etapa, requisito e prazo é fundamental para o sucesso da recuperação.

No próximo artigo, abordaremos os aspectos práticos da recuperação judicial: jurisprudência relevante, benefícios para todos os envolvidos, custos do processo e quando buscar ajuda especializada. Continue acompanhando para entender completamente este importante instrumento empresarial.

Guilherme Monteiro de Castro Lopes

VIP Guilherme Monteiro de Castro Lopes

Advogado, especialista em Direito Bancário, CEO e Sócio Fundador da Monteiro e Moura Advogados, escritório referência em todo o Brasil na luta contra os abusos dos Bancos e Financeiras

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