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Diesel russo ganha espaço e ANP dificulta produção nacional - Necessidade de incentivo ao refino nacional

Brasil, autossuficiente em petróleo, depende do diesel russo por falta de refino e regulações da ANP, risco geopolítico e econômico.

quarta-feira, 8 de outubro de 2025

Atualizado às 14:11

Muito embora seja autossuficiente na produção de petróleo bruto, o Brasil enfrenta limitações em sua capacidade de refino, o que ainda o mantém dependente da importação da commodity para atender à sua própria demanda.

Historicamente, antes da eclosão da guerra entre Rússia e Ucrânia, sabe-se que a maior parte da importação brasileira de óleo diesel era feita pelos Estados Unidos, em virtude da proximidade geográfica, potencial produtivo das refinarias norte-americanas e das vantagens comerciais.

Entretanto, esse cenário mudou nos últimos anos. Com a entrada da Rússia nas negociações, o país acabou se tornando a principal exportadora de óleo diesel para o mercado brasileiro. 

Isso acontece principalmente porque a Rússia tem oferecido descontos significativos no preço do seu combustível com o fito de redirecionar suas exportações a novos mercados fora do Ocidente, como consequência das sanções impostas pelos EUA e países da União Europeia à invasão da Ucrânia. 

Como o Brasil não aderiu às sanções contra o território russo - visto como um parceiro estratégico no fornecimento de fertilizantes ao agronegócio nacional - e diante dos preços russos atrativos em meio à disparada internacional dos valores do petróleo, especialmente de origem norte-americana, a Rússia passou a ocupar a posição de sua principal fornecedora de óleo diesel. 

Segundo a Abicom - Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis, o total de 65,5% (9,5 milhões de m³), dos 14,5 milhões de m³ de óleo diesel importados em 2024, são de origem russa1.

Ainda, de acordo com os dados do Comex Stat - sistema oficial para extração das estatísticas do comércio exterior brasileiro de bens - do MDIC - Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, de janeiro a agosto de 2025, o Brasil importou 54,5% de óleos combustíveis de petróleo ou de minerais betuminosos (exceto óleos brutos) da Rússia e apenas 11,0% dos EUA, que era seu principal fornecedor até então2.

Em resposta, o governo de Donald Trump impôs tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros, já que as importações de combustíveis russos feitas pelos países, inclusive pelo Brasil, financiam a máquina de guerra de Vladimir Putin.

A pergunta é: o Brasil está pronto para ser alvo de sanções norte-americanas mais severas por seu envolvimento com o mercado de combustíveis russo? 

Apesar de fazer parte de um plano da Casa Branca para isolar a Rússia economicamente até que um acordo de paz com a Ucrânia seja realizado, as sanções causam um desequilíbrio no mercado, aumentando os custos dos combustíveis ao consumidor final e pressionando a inflação no país. 

E ao invés de agir para fortalecer a autossuficiência energética nacional nesse contexto geopolítico delicado, no qual o Brasil já está sendo pressionado por potências estrangeiras, devido à manutenção - e até ampliação - das importações de combustíveis russos, a ANP - Agência Nacional do Petróleo tem feito o oposto.

A partir da publicação da resolução 985/25, a ANP suspendeu dispositivos da resolução 852/21 que flexibilizavam a formulação de gasolina e óleo diesel no país, impondo novas barreiras à produção interna, afetando refinadores independentes e elevando a dependência externa.

Através da formulação - processo de mistura mecânica de diferentes frações ou correntes de hidrocarbonetos líquidos para formar o combustível final (gasolina ou diesel) -, torna-se possível outros métodos além do refino. É uma prática que permite a flexibilidade, menor necessidade de infraestrutura de refino pesada e a atuação de agentes menores no setor.

O resultado direto desta escolha regulatória é a manutenção e o aumento desta dependência de importações, especialmente de diesel vindo da Rússia, e a permanência da concentração deste mercado nas mãos dos grandes players.

Ou seja, ignoram-se os interesses do consumidor brasileiro, que pode sofrer com alta nos preços dos combustíveis, caso a oferta externa seja comprometida pela imposição de mais sanções e conflitos diplomáticos.

A postura da ANP sinaliza verdadeira omissão ou, no mínimo, desconexão com a realidade do mercado e do mundo, cujos riscos econômicos, sociais e políticos são iminentes.

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1 ABICOM. A Rota do Diesel Russo para o Brasil. Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis - ABICOM, 15 jan. 2025. Disponível em: https://abicom.com.br/publicacoes/a-rota-do-diesel-russo-para-o-brasil/.

2 COMEX STAT. ComexVis. Governo Federal, [s.d.]. Disponível em: https://comexstat.mdic.gov.br/pt/comex-vis.

Luis Ernesto dos Santos Abib

Luis Ernesto dos Santos Abib

Advogado, sócio do escritório Abib Sociedade de Advogados e diretor jurídico do Sinbracom - Sindicato Brasileiro das Distribuidoras de Combustíveis.

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